Viver sem água na torneira: A dura realidade que 60 famílias enfrentam há décadas em Lordosa

Na freguesia de Lordosa, no concelho de Viseu, a falta de saneamento básico e rede de água pública continua a ser uma dura realidade para pelo menos 60 agregados familiares. Em Vilar de Lordosa, Belarmino Almeida, de 69 anos, exemplifica o desafio diário: para ter água na sua casa, precisa de encher manualmente um tanque de 500 litros com uma mangueira ligada a uma bica pública.

Belarmino, construtor civil aposentado, descreve a exaustiva rotina em entrevista à Renascença: “Abasteço com esta mangueira que tenho aqui, com este funil, ponho naquela bica que tem água suficiente, e encho o depósito. Todos os dias tenho de encher para tomarmos banho e usar na cozinha. Isto é cansativo, uma trabalheira. Sempre foi assim. Não há forma disto mudar”, lamenta. A situação agrava-se quando está sozinho em casa e precisa de esperar pela ajuda dos filhos para completar a tarefa. “Às vezes, chegamos às 10 da noite a encher isto. E esta fonte no verão seca, agora ainda deita mais ou menos, mas em agosto fica seca.”

Na localidade de Pousa Maria, a situação é semelhante. Meiline Almeida, filha de Belarmino, precisa recorrer à ajuda dos vizinhos para lavar roupa, já que a capacidade do tanque não permite o uso de uma máquina de lavar. “Temos um vizinho na estrada principal que tem uma máquina de lavar. Nós temos a chave da garagem deles e, quando precisamos, vamos lá lavar a roupa. Não conseguimos ter máquina de lavar porque a forma que temos água não nos possibilita. O tanque não chega, teríamos de encher o depósito duas ou três vezes por dia, o que é impensável”, explica.

José Manuel Pereira, presidente da Junta de Freguesia de Lordosa, confirma a gravidade da situação, apontando para a necessidade de investimentos urgentes em saneamento básico. “Fazer saneamento é uma obra não visível, fica enterrada. Muitas vezes, os autarcas entusiasmam-se mais com obras que tenham mais brilho e que sejam visíveis no dia-a-dia. É uma questão de saúde, de qualidade de vida e ambiental. Não compreendo como se preferem grandes obras megalómanas, deixando para trás necessidades básicas”, critica.

Pereira estima que a resolução do problema em Pousa Maria custaria entre 40 a 50 mil euros. “O SMAS de Viseu tem o projeto feito e orçamentado. Por 40 ou 50 mil euros não se avançar com uma obra dessas é inaceitável”, argumenta. Além do abastecimento de água, o presidente da Junta alerta para questões ambientais decorrentes do tratamento inadequado de resíduos, que poluem linhas de água.

A falta de saneamento básico e água pública afeta diretamente a qualidade de vida dos cerca de 2.300 habitantes de Lordosa, uma freguesia procurada por sua proximidade ao centro de Viseu. “Estamos a falar de um problema com décadas. Em 2024, queremos ligar a máquina da roupa e não conseguimos porque não temos água. Queremos tomar um banho no final do dia e temos de buscar água a fontes. É uma situação que não se coaduna com os dias de hoje”, defende Pereira.

Os habitantes mais velhos, como Belarmino, estão cansados de promessas não cumpridas. “Foi toda a vida promessas, mas não passou disso. Era eu miúdo e já se falava no saneamento e meter água. Eu dizia que ainda havia de morrer sem água pública e cá estou a ver que morro mesmo sem ela vir”, lamenta.

Ler Mais





Comentários
Loading...