Trump vs. Harris: Quais os pontos fortes e fracos dos candidatos à presidência dos Estados Unidos?

A poucos dias das eleições nos Estados Unidos, Donald Trump e Kamala Harris, candidatos dos partidos Republicano e Democrata, preparam-se para um embate de estilos políticos opostos, num confronto que poderá moldar o futuro da nação. Agendado para o dia 5 de novembro, o ato eleitoral é aguardado com expectativa global, especialmente devido às margens de incerteza em estados considerados “swing states”, onde os eleitores podem facilmente oscilar de um lado para o outro e definir o resultado final.

Enquanto Trump tenta regressar ao poder com promessas de restaurar a visão nacionalista que marcou o seu mandato, Harris aposta em prolongar e, ao mesmo tempo, redefinir o legado da administração Biden, apresentando-se como uma candidata que traz consigo inovação e inclusão. No entanto, ambos têm pela frente grandes desafios e contam com trunfos e fraquezas que podem ser decisivos para a vitória, segundo uma análise feita por especialistas ao 20 Minutos.

Trump: um apelo emocional e um eleitorado fiel

Donald Trump é, sem dúvida, um rosto familiar na política norte-americana, e a sua imagem polarizadora gera impacto e mobiliza um eleitorado muito fiel. Segundo Alejandro Manso, analista político da consultora LLYC, uma das grandes forças de Trump reside na capacidade de conectar-se com um perfil de eleitor que partilha os receios em relação ao que percebem como uma perda de supremacia global dos Estados Unidos. O discurso de Trump, ao centrar-se nesta nostalgia pela “grandeza perdida”, ressoa com uma América “assustada” que deseja resgatar a posição de poder no cenário mundial.

Isidro Sepúlveda, professor de História Contemporânea e especialista em relações internacionais, destaca que Trump beneficia de um cenário de forte polarização, afirmando que “um ambiente radicalizado sempre favorece o mais radicalizado”. A radicalização tem sido evidenciada durante a campanha, em particular com as ameaças de violência contra o ex-presidente, incluindo uma tentativa de assassinato em julho na Pensilvânia. Sepúlveda sugere que episódios como esse acabam por “beneficiar Trump, reforçando a sua imagem junto dos apoiantes mais radicais”.

Além disso, Trump tem conseguido ampliar a sua base de apoio ao atrair eleitores de minorias étnicas e reforçar a percepção positiva junto de grupos preocupados com temas como imigração e economia. De acordo com uma sondagem do The Economist/YouGov, estas são questões cruciais para o eleitorado norte-americano, e a sua abordagem tem mostrado resultados.

Para Manso, Trump e a sua equipa têm sido cautelosos em evitar confrontos diretos, limitando-se a um único debate eleitoral. Esta estratégia, segundo o analista, tem funcionado a favor do republicano, que evita réplicas diretas que poderiam enfraquecer a sua mensagem. Em vez disso, aposta numa campanha que sublinha a descida de impostos e a revitalização do país, sem confronto face a face.

Kamala Harris: a continuidade de Biden e a promessa de mudança

Do lado Democrata, Kamala Harris surge com uma proposta de continuidade em relação às políticas de Joe Biden, mas trazendo uma agenda própria que visa cativar eleitores de todas as frentes. O facto de Harris ser mulher e negra é visto como uma vantagem na diversidade e representatividade da sua campanha, apesar de Manso sublinhar que este aspecto possa jogar contra ela junto de um eleitorado masculino e branco, onde Trump tem predominado.

Para a especialista Sara Núñez de Prado, da Universidade Rey Juan Carlos, Harris representa o setor progressista, sendo uma escolha que pode atrair mulheres e minorias, embora se depare com uma sociedade americana que está, segundo a docente, “altamente polarizada”. No entanto, como acrescenta Luis García, professor de Sociologia da Universidade Complutense, a candidatura de Harris pode ainda recolher os méritos da administração de Biden em temas como o crescimento do emprego e do Produto Interno Bruto, além das políticas de saúde pública, como a defesa dos direitos ao aborto e a redução dos custos dos medicamentos, que são temas centrais para os democratas.

Um dos maiores trunfos de Harris tem sido a sua capacidade de se afastar de um discurso excessivamente vinculado ao movimento woke, optando por uma abordagem mais pragmática, uma manobra que, segundo Manso, “lhe deu votos junto dos indecisos”. Esta flexibilidade de discurso e a sua experiência enquanto procuradora-geral da Califórnia conferem-lhe uma imagem positiva, embora tenha tido uma vice-presidência considerada pouco visível, algo que tentou colmatar com maior presença mediática ao longo da campanha.

Os pontos fracos: o peso de uma campanha polarizada

No entanto, ambos os candidatos têm os seus pontos fracos. No caso de Trump, o estilo de campanha agressivo pode ser um risco, já que alimenta a polarização. Segundo Manso, apesar de o seu discurso emocional cativar, o candidato republicano tem tentado refrear os seus ataques mais intensos, numa tentativa de moderar o impacto negativo que o seu perfil altamente controverso pode causar.

Outro entrave para Trump tem sido a falta de apoio unânime dentro do seu partido, que se apresenta fragmentado em comparação com o bloco democrata, que se uniu em torno de Harris após a decisão de Biden de se afastar. Sepúlveda destaca que “há muitas mais vozes discrepantes entre os republicanos” e que, para alguns membros do partido, o estilo de Trump não representa a linha clássica do partido.

Do lado de Harris, a sua vice-presidência pouco conhecida e a percepção de que é menos carismática e assertiva em relação a temas económicos e de segurança podem enfraquecer o seu apelo. Como observou Núñez, grande parte do eleitorado considera a sua gestão “pouco popular”, e as suas propostas são vistas por muitos como generalistas e menos vantajosas para as empresas, algo que pode custar-lhe apoio entre os eleitores mais preocupados com o crescimento económico.

Impacto a nível internacional: implicações para a Europa

A nível internacional, a escolha entre Trump e Harris poderá ter repercussões diretas em aliados como a Europa. O posicionamento dos Estados Unidos em relação às tarifas comerciais, presença militar e alianças diplomáticas variará substancialmente entre ambos. García sublinha que a campanha de Harris adota uma postura “muito mais racional” em contraste com a retórica mais emotiva de Trump, mas que os democratas têm apelado a um discurso mais duro nas últimas semanas, chegando a comparar Trump a figuras autoritárias históricas.

Para Sepúlveda, o apelo de Trump a eleitores latinos e jovens, tradicionalmente associados ao Partido Democrata, demonstra uma mudança significativa. “Os eleitores de Harris são mais voláteis”, observa, e essa volatilidade poderá representar um desafio para a candidata democrata, caso as eleições se tornem ainda mais polarizadas nos últimos dias.

À medida que a eleição se aproxima, torna-se claro que tanto Trump quanto Harris representam visões e abordagens opostas para o futuro dos Estados Unidos. Como comenta Núñez, o vencedor terá de enfrentar uma sociedade profundamente dividida, onde o eleitorado parece cada vez mais votar com o coração, “não com a cabeça”. Seja qual for o resultado, este será certamente um mandato marcado por desafios internos e uma divisão que continua a crescer na principal democracia do mundo.

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