Trump é muito duro com a imigração? Europa tem adotado abordagens antes tabu nas suas fronteiras

Embora nenhum líder europeu tenha ameaçado deportar 20 milhões de pessoas ou proibir muçulmanos — exceto, talvez, o europeu favorito do ex-presidente Donald Trump, Viktor Orbán —, a União Europeia e Trump estão mais próximos na questão da migração do que as palavras podem sugerir.

Os países da UE têm-se esforçado individualmente para reprimir a migração após aumentos substanciais no apoio a partidos anti-imigração em várias eleições europeias deste ano. No entanto, embora evitem a retórica racista e xenófoba de Trump para com os imigrantes, à luz política não são tão diferentes assim, apontou o jornal ‘POLITICO’.

Na reunião em Bruxelas, na passada quinta-feira, os líderes da UE passaram horas a discutir centros de processamento de migrantes, deportações mais rápidas e “guerra híbrida” com potências hostis que utilizam migrantes para desestabilizar países da UE. “Um novo vento está a soprar na Europa”, destacou o líder populista holandês anti-islâmico e anti-imigração do Partido da Liberdade, Geert Wilders.

A migração tem sido uma prioridade para os políticos europeus desde 2015, quando mais de um milhão de migrantes, muitos deles sírios a fugir da guerra, chegaram ao bloco europeu. Na década que se seguiu, a UE mudou de uma postura de “nós podemos fazer isso” da ex-chanceler alemã Angela Merkel para tentar afastar completamente os recém-chegados às fronteiras europeias. Em 2023, menos de 300 mil pessoas chegaram ao Velho Continente; para este ano, a agência de fronteiras da UE, a Frontex, estima que cheguem cerca de 160 mil migrantes.

Nos últimos meses, quase uma dúzia de países europeus instituíram alguma forma de restrição de fronteira na tentativa de deter migrantes, refugiados e requerentes de asilo.

A Polónia anunciou uma interrupção temporária no processamento de pedidos de asilo de migrantes que chegam da vizinha Bielorrússia, invocando uma ameaça à segurança. Olaf Scholz, da Alemanha, instituiu controlos de fronteira neste verão para impedir que migrantes sem documentos cruzassem para a Alemanha depois de um sírio ter esfaqueado 11 pessoas, matando três. Outros seis países – incluindo Itália, França e Áustria, introduziram controlos de fronteira.

Caso Donald Trump regresse à Casa Branca, isso poderia dar mais ânimo. “Certamente, muitos Estados-membros que pressionaram por uma abordagem restritiva à migração estarão a observar as eleições americanas muito de perto. Isso dará mais fichas para pressionar pelas suas preferências tanto nos EUA como na UE”, sustentou Alberto-Horst Neidhardt, chefe de migração e diversidade europeias no European Policy Centre.

O “Programa de Proteção ao Migrante” de Donald Trump tinha uma terminologia vaga sobre “centros de retorno” e “centros de processamento”: a iniciativa, conhecia informalmente como “Permaneça no México”, entrou em vigor em 2019, forçando dezenas de milhares de migrantes não mexicanos a cruzar a fronteira americana para aguardar as decisões de migração.

Numa carta aos líderes esta semana, Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, endossou o que chamou de “centros de regresso”, edifícios para deter migrantes em países não pertencentes à UE. Já a primeira-ministra italiana Giorgia Meloni inaugurou “centros de processamento” na Albânia, para onde as pessoas que vão para a Itália serão transportadas.

Ao mesmo tempo, França pressiona para mudar a lei da UE para facilitar deportações para países terceiros. E a UE já tem milhares de quilómetros de cercas físicas nas suas fronteiras externas — uma configuração que excede em muito o alardeado, mas abortado, muro de fronteira de Trump com o México.

Mas a principal diferença está no estilo e tom dos responsáveis políticos, com os europeus a andar na ponta dos pés em questões contenciosas.

Veja-se a palavra deportações. Para Trump, que prometeu deportar entre 15 e 20 milhões de pessoas dos EUA se for reeleito em novembro, usar esta palavra é um símbolo de honra. “Sob a administração Trump, se entrar ilegalmente, era apreendido imediatamente e deportado”, gabou-se o candidato republicano, num comício em julho último. “É por isso que, para manter a nossa família segura, a plataforma republicana promete lançar a maior operação de deportação da história do nosso país.”

Para os líderes e autoridades europeias, no entanto, a palavra deportação – que está ligada, para muitos na Europa, às deportações nazis para campos de concentração durante a II Guerra Mundial – é quase um tabu. As autoridades do bloco falam cautelosamente de “regressos” ou “centros de regresso” para descrever os campos fechados ou centros de detenção que montaram fora da UE.

E quando se trata de descrever como os migrantes chegam às suas fronteiras, os líderes da UE tendem a agir com cautela novamente. Embora Trump não tenha escrúpulos em qualificar alguns migrantes como “ilegais” e condenar a “imigração ilegal”, na UE a migração que não ocorre por meio de aeroportos ou outras rotas oficiais é oficialmente descrita como “irregular”.

O primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán é o único líder da UE a contrariar a tendência, acabando com as subtilezas europeias e abraçando completamente a retórica do estilo Trump, vilanizando diretamente os migrantes com a sua postura nacionalista de direita. Orbán prometeu no início deste mês levar migrantes de autocarro para Bruxelas, copiando uma promessa semelhante do governador da Flórida Ron DeSantis, que enviou migrantes do seu estado para Martha’s Vineyard, um local de férias de luxo em Massachusetts.

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