“Tem de ser feita uma investigação de grande escala”: Chamadas de oficiais alemães intercetadas pela Rússia levantam receios de escutas à Nato
O caso da divulgação de uma conversa entre oficiais militares alemães, pela Rússia, deixou os aliados da Nato em alvoroço e em esforços para neutralizar a aparente fuga de informações secretas, que a Rússia indica que é prova do “envolvimento direto” do Ocidente na guerra na Ucrânia.
A alegada conversa entre oficiais alemães foi divulgada no canal RT pela editora-chefe, Margarita Simonyan, uma das mais proeminentes propagandistas de Putin, e dá conta de discussões sobre fornecimento de armas à Ucrânia, além de um hipotético ataque de Kiev na ponte do estreito de Kerch, na Crimeia, usando mísseis de cruzeiro alemães Taurus que a Ucrânia solicitou repetidamente.
A chamada terá sido feita utilizando a plataforma de conferência WebEx, da Cisco, em vez de um sistema seguro de comunicações internas.
Ivan Stupak ex-oficial do Serviço de Segurança da Ucrânia (SBU) e agora conselheiro da comissão de segurança nacional, defesa e inteligência do parlamento ucraniano, indica à Newsweek que o incidente pode exigir uma analise e revisão mais ampla, já que pode mesmo envolver outros países da Nato.
“Ninguém sabe durante quanto tempo os russos conseguiram ouvir oficiais alemães, ou alguns outros responsáveis alemães ou mesmo outros membros da Nato. Uma investigação em grande escala tem de ser conduzida entre os membros da Nato”, alerta o especialista.
À mesma revista, duas fontes diplomáticas europeias desvalorizam a fuga de informações e a sua importância no âmbito dos esforços de guerra. “Tenho certeza de que os russos sabem muito bem quem está a fazer o quê na Ucrânia. O constrangimento é apenas de natureza interna, em relação ao público interno durante alguns dias para os países que foram expostos por outros aliados. Mas tudo bem, a aliança nunca esteve isenta de problemas e concorrência. Na verdade, é saudável ter este debate sobre quem está a fazer o quê pela Ucrânia, mas talvez com portas fechadas”, afirma um oficial europeu sob anonimato.
A escalada de violência na guerra na Ucrânia continua a dominar a resposta coletiva europeia, com as nações perto das fronteiras russas a criticarem a aparente hesitação ocidental, ainda que Biden ou Scholz considerem que há um grande perigo, incluindo nuclear, caso Moscovo e a Nato entrem em conflito direto.
“O maior perigo agudo ainda vem das linhas de frente na Ucrânia O défice de munições é enorme e a pressão russa é intensa. E o Ocidente está paralisado pelo medo”, indica fonte diplomática europeia, descrevendo o atual desafio que se coloca.
Berlim desmente que embaixador em Moscovo tenha sido chamado ao MNE russo
O Governo alemão negou que o seu embaixador em Moscovo tenha sido convocado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros russo, na sequência da publicação de trocas de impressões confidenciais entre vários oficiais alemães sobre o fornecimento de armas à Ucrânia.
“O nosso embaixador teve uma reunião há muito planeada, hoje de manhã, no Ministério dos Negócios Estrangeiros russo”, disse à imprensa o porta-voz do mesmo departamento governamental alemão, Christian Wagner, quando questionado sobre se tinha ou não sido convocado.
Hoje, segundo as agências de notícias russas, o embaixador alemão em Moscovo, Alexander Graf Lambsdorff, foi convocado para se apresentar no ministério dos Negócios Estrangeiros russo, após uma conversa entre oficiais militares alemães sobre a entrega de armas à Ucrânia ter sido divulgada na Rússia.
Lambsdorff acabou por ir ao ministério e, no final, após uma hora de encontro, não fez quaisquer declarações aos jornalistas.
Kremlin reiterou a acusação sobre o “envolvimento direto do Ocidente” na Ucrânia, na sequência da divulgação das trocas de mensagens entre oficiais alemães sobre o fornecimento de armas à Ucrânia.
Uma gravação de áudio de uma reunião por videoconferência de oficiais militares alemães de alto escalão foi divulgada sexta-feira nas redes sociais da Rússia.
Nesse mesmo dia, a emissora estatal russa RT (antiga “Russia Today”) acabou por divulgar uma gravação áudio de 30 minutos dos oficias militares alemães.
Nesta conversa, os participantes discutem em particular a hipótese da entrega de mísseis de longo alcance ‘Taurus’ de fabricação alemã a Kiev.
Também hoje, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov afirmou que as informações trocadas nas redes sociais, incluindo uma gravação, mostram “mais uma vez o envolvimento direto do Ocidente no conflito na Ucrânia”.
“A gravação [registo sonoro] mostra que, no seio do Bundeswehr [Forças Armadas da Alemanha] existem discussões pormenorizadas e concretas sobre planos a levar a cabo contra o território russo”, acrescentou.
No sábado, Berlim confirmou que a gravação era autêntica e que havia sido “intercetada”.
Neste mesmo dia, o chanceler alemão, Olaf Scholz, anunciou que a Alemanha está a conduzir uma investigação aprofundada sobre uma fuga de informação de oficiais que discutiram assuntos confidenciais relacionados com a guerra na Ucrânia.
“Trata-se de um assunto muito sério e é por isso que está a ser investigado com muito cuidado, muito minuciosamente e muito rapidamente”, afirmou Scholz durante uma visita a Roma.
O seu conteúdo é muito embaraçoso para a Alemanha porque Berlim recusa oficialmente entregar mísseis ‘Taurus’ a Kiev, argumentando um risco de escalada do conflito.
Em Moscovo, domingo, a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo, Maria Zakharova, pediu publicamente à sua homóloga alemã, Annalena Baerbock, uma explicação para o conteúdo do áudio.
Por sua vez, o ministro da Defesa alemão, Boris Pistorius, acusou no domingo o Presidente russo, Vladimir Putin, de tentar “desestabilizar” o país com esta gravação.
*Com Lusa