Seguros de proteção ao crédito valem a pena?

Os seguros de proteção ao crédito e no desemprego parecem apelativos à primeira vista, mas basta ler as apólices com atenção para esbarrar numa longa lista de exclusões e exigências, alerta a DECO.

E se ficar desempregado? E se tiver um acidente? E se não me pagam o salário? Os seguros de proteção ao crédito e no desemprego prometem uma almofada financeira em caso de desemprego involuntário, hospitalização ou salários em atraso. Mas o rol de restrições e exigências para ativar as coberturas é de tal modo extenso, que, no fim, poucos poderão beneficiar da segurança apregoada.

Trabalhadores por conta própria, com contratos há menos de 12 meses ou com vínculo laboral precário estão excluídos da maior parte das coberturas. Doenças preexistentes e gravidez também estão de fora. Os períodos de carência (prazo pós-contratação em que o seguro não pode ser ativado) são, por norma, de 60 dias (e até de 90).

E, na maior parte dos casos, só se a situação se prolongar para além de 30 dias é que há lugar ao pagamento previsto. Ou seja, só a partir do 31.º dia é que o segurado adquire o direito à prestação, contada a partir do dia do sinistro. É a chamada franquia relativa (o beneficiário espera 30 dias, mas o seguro paga o que ficou para trás). No caso da cobertura de salários em atraso, presente em algumas apólices, este prazo alarga-se a 90 dias consecutivos.

O que prometem os seguros de proteção ao crédito

O seguro de proteção ao crédito é, habitualmente, comercializado quando se contrata um empréstimo pessoal ou um financiamento automóvel. Já para contratar um seguro de proteção no desemprego, não é necessário haver um crédito associado.

Em caso de desemprego involuntário ou incapacidade temporária absoluta para o trabalho por acidente ou doença, o primeiro tipo de apólice garante o pagamento da prestação mensal do crédito associado, e o seguro de proteção no desemprego paga uma indemnização mensal predefinida.

Para a cobertura de desemprego involuntário, ambos os produtos asseguram as respetivas proteções, em regra, durante seis meses, no máximo. Em caso de doença ou acidente, a indemnização será paga até que o segurado volte ao trabalho ou seja atingido o limite de 12 meses por sinistro.

O que as apólices cumprem na prática

A cobertura de desemprego involuntário é exclusiva para trabalhadores por conta de outrem e inclui despedimento coletivo, extinção do posto de trabalho e despedimento promovido unilateralmente pela entidade empregadora. Mas deixa de fora a cessação do contrato de trabalho por acordo entre o trabalhador e a empresa, desemprego resultante de atividade sazonal ou caducidade de contratos a termo.

Para acionar o seguro, o beneficiário tem de estar inscrito no centro de emprego. O documento a comprová-lo é apenas um dos vários que terá de enviar à seguradora. Também lhe será exigida cópia da declaração de situação de desemprego preenchida pela entidade patronal, cópia da carta de despedimento e cópia do contrato de trabalho.

Em geral, depois de ativada, a cobertura de desemprego involuntário só pode ser acionada de novo pelo segurado após seis meses de trabalho ativo.

Em caso de incapacidade temporária absoluta para o trabalho por acidente ou doença, tanto o seguro de proteção ao crédito, como o de desemprego, só pagam se o beneficiário não puder trabalhar por um período superior a 30 dias consecutivos.

Trabalhadores por conta própria pagam por pouca proteção

A cobertura de hospitalização é das poucas destinadas a trabalhadores por conta própria. Assegura o pagamento de uma prestação do crédito ou do capital mensal estipulado em caso de internamento hospitalar superior, em regra, a sete dias consecutivos.

Se o período de hospitalização ultrapassar os 30 dias, o seguro paga até ao limite de 12 meses por sinistro. Mas o internamento não se pode dever, entre muitas exclusões, a doença preexistente ou gravidez, por exemplo.

Algumas apólices deixam de fora também as lombalgias e as patologias psiquiátricas, como a depressão nervosa.

Preços podem utrapassar os 1000 euros

Os preços praticados variam muito. Um seguro de proteção ao crédito que cubra desemprego involuntário, incapacidade temporária absoluta para o trabalho por doença e/ou acidente e hospitalização para garantir um crédito pessoal de 10 mil euros, a pagar em cinco anos, tanto pode custar pouco mais de 500 euros, como ultrapassar os mil (valor total do seguro).

É frequente as apólices fixarem a prestação máxima mensal a proteger. Por norma, esse valor é de 1700 euros. A grande maioria dos prémios destes seguros acresce aos valores do empréstimo. Assim, o cliente também paga juros sobre o prémio de seguro.

Para garantir um montante de 200 euros por mês, um seguro de proteção no desemprego pode custar, por exemplo, entre 80 e 130 euros por ano. Há seguros que pagam apenas uma percentagem do vencimento líquido do beneficiário (30%, por exemplo), com um teto associado. E outros estipulam valores fixos mensais a indemnizar.

Ao contrário do seguro de proteção ao crédito, que dura apenas enquanto durar o empréstimo, o seguro de proteção no desemprego pode ser mantido pelo período que o segurado queira.

A quem servem estes seguros?

Trabalhador por conta de outrem despedido unilateralmente pela entidade empregadora

Sem conhecimento prévio de que tal iria acontecer, “José” viu-se despedido. Três meses antes, contratara um seguro de proteção ao crédito automóvel. Decidiu acioná-lo, via cobertura de desemprego involuntário, dado que o período de carência (60 dias) já havia passado. E entretanto inscreveu-se no centro de emprego. Só se ficar desempregado durante 30 dias consecutivos (franquia relativa do seguro) é que tem direito a receber as prestações mensais que lhe permitem pagar o crédito durante seis meses, no máximo. Não há nenhum fator de exclusão (ter sido despedido com justa causa, por exemplo). Por isso, o seguro paga.

Trabalhadora por conta de outrem atropelada ao atravessar a estrada e levada para o hospital

“Sofia” esteve internada durante sete dias. Tivesse tido alta um dia depois e o seguro de proteção ao crédito que subscreveu há um ano pagar-lhe-ia uma prestação do empréstimo pessoal. A cobertura de hospitalização destina-se a trabalhadores por conta própria, mas só pode ser acionada se o internamento for superior a sete dias consecutivos. Assim, “Sofia” não recebe nada. Mas, como vai ter de ficar em casa, a recuperar, durante três meses, pode acionar a cobertura de incapacidade temporária absoluta para o trabalho por doença e/ou acidente. Vai ter de esperar 30 dias para receber o primeiro reembolso. Só assim o seguro paga.

Trabalhador por conta de outrem cuja empresa vai transferir-se de Lisboa para o Porto

A empresa onde “Manuel” trabalha vai fechar portas em Lisboa e mudar-se para o Porto. Propõe-lhe desempenhar as mesmas funções na nova cidade, mas, por razões familiares, “Manuel” não aceita. Negoceia a saída com a entidade patronal e fica desempregado. Decide então acionar o seguro de proteção no desemprego (cobertura de desemprego involuntário), que contratou há cinco anos e garante o pagamento de um valor mensal predefinido durante seis meses. A seguradora recusa pagar, invocando acordo na cessação do contrato de trabalho, exclusão prevista na apólice. “Manuel” reclama, mas, o seguro não paga.

Trabalhadora por conta de outrem com o salário em atraso há dois meses

Sem receber ordenado pelo segundo mês seguido, “Maria” tenta acionar a cobertura de salários em atraso do seguro de proteção no desemprego subscrito há vários anos. Mas vai ter de esperar mais um mês, pois só o poderá fazer depois de 90 dias consecutivos com o salário em falta. Ao terceiro mês após falhar os ordenados, a empresa paga aos trabalhadores. Mas no mês seguinte volta a incumprir. “Maria” tem agora dois meses pela frente até poder acionar o seguro. Se a empresa pagar entretanto e voltar a falhar a seguir, não consegue cumprir o requisito necessário para beneficiar do seguro. Assim, o seguro não paga.

Afinal, valem a pena ou nem por isso?

A DECO desaconselha. Poderiam ser produtos interessantes por darem uma segurança adicional aos consumidores. Mas a proteção apregoada não se verifica na prática. A lista de restrições e exigências da maior parte das apólices limita a sua abrangência.

Olhando às exclusões, aos limites de indemnização, aos períodos de carência e às franquias que estes seguros preveem, a DECO concluiu que muitos dos consumidores que os contratam estão a pagar por algo de que nunca poderão beneficiar.

Na prática, os seguros de proteção ao crédito e no desemprego não estão adequados às necessidades concretas dos consumidores e, por isso, não aconselha a sua subscrição.

*Revista RISCO com DECO

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