Reduzir taxa de ‘stress’ nos créditos à habitação? Só vai beneficiar quem tem rendimentos elevados, alertam especialistas

O Banco de Portugal pode rever a taxa de esforço das famílias, uma das suas recomendações para a concessão de crédito à habitação: em causa, segundo a edição do jornal ‘Público’ esta segunda-feira, está a medida que exige que a capacidade das famílias seja testada para um cenário de taxas de juros bem mais altas do que as praticadas no momento da contratação do crédito: pretende-se desta forma aumentar o universo de particulares que podem aceder a este tipo de financiamento.

Nas regras atuais, é preciso acrescentar três pontos percentuais à taxa contratada nos novos empréstimos para avaliar a taxa de esforço das famílias, sendo que o ‘choque extra’ não pode exceder 50% dos rendimentos líquidos dos particulares. No entanto há exceções que estão sujeitas a justificações por parte dos bancos.

“Agora temos aqui este período de verão e uma melhor capacidade de previsibilidade da evolução futura das taxas de juro”, referiu, em entrevista recente à ‘Antena 1’ e ‘Jornal de Negócios’, Clara Raposo, vice-governadora do Banco de Portugal, que indicou que os bancos têm recorrido mais às exceções.

Mas esta revisão não vai ter efeito junto das famílias com rendimentos médios, que face às atuais condições de mercado, vão manter a dificuldade em aceder o crédito, afetando que tem rendimentos mais elevados. A redução “poderá ter algum impacto, uma vez que estas famílias podem suportar taxas de esforço mais elevadas”, apontou ao jornal diário José Carlos Tomás, da Eupago, instituição de pagamentos que atua como intermediária de crédito.

Já Natália Nunes, diretora do Gabinete de Proteção Financeira da DECO, sustentou que “se diminuírem os atuais 3%, a taxa de esforço será calculada tendo por base uma taxa de juro mais baixa, o que teoricamente aumenta as probabilidades de aceder ao crédito à habitação. Mas não vai resolver o problema do acesso à habitação e esta alteração poderá levar a mais riscos, porque no fundo alarga o quadro de dívida das famílias”.

Atualmente, uma família com um rendimento mensal de 2 mil euros, com uma Euribor a 4%, um spread de 1% num prazo de 37 anos, consegue, no máximo, um empréstimo de 165 mil euros, ficando a pagar 811,41 euros mensais ao banco, uma taxa de esforço real de 35%. Se o Banco de Portugal alterar a medida, poderá subir até aos 184 mil euros de empréstimo, com uma prestação de 910,36 euros, uma taxa de esforço real de 39%, um patamar de risco elevado. Se a redução do “choque extra’ for 1%, a capacidade de endividamento sobe para 208 mil euros, sendo que a prestação passa para 1.029,1 euros, 44% do rendimento familiar.

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