«Quando regressamos à normalidade, somos muito medíocres». Costa e Silva defende mais Estado na economia
O presidente da Comissão Executiva da petrolífera Partex, António Costa e Silva, avisou esta terça-feira, em entrevista à “TSF”, que «não podemos repetir os erros do passado» e mostrou-se convicto na ideia de que Portugal precisa de mais Estado na economia para não entrar «em estado de coma».
Costa e Silva, que foi desafiado pelo primeiro-ministro para desenvolver um plano para relançar a economia no pós-pandemia, que começou a desenhar a 25 de Abril, começou por lembrar que atravessamos «uma situação extremamente difícil, com milhares de pessoas desempregadas e muitas empresas em grandes dificuldades».
O também professor no Instituto Superior Técnico e agora paraministro esclareceu que o plano que está a desenvolver não visa uma «revolução na economia», mas sim uma transição. Este plano, adiantou, é concebido no curto-prazo «para salvar a economia e proteger o emprego», a médio e longo-prazo com o objectivo de «transformar a economia e torná-la mais sustentável a nível social, económico e ambiental, mais inclusiva, eficiente na gestão dos recursos e interconectada, mais digitalizada e, simultaneamente preparar a massa crítica para poder intervir no mercado global e competir».
Costa e Silva defendeu que é preciso lutar contra «as ideias mais fundamentalistas que movem o mundo», porque «a Covid-19 mostrou que vivemos em sociedades extremamente complexas». O gestor da Partex disse que «fomos incapazes de prever a dimensão desta crise», tal como já havia acontecido em 2001, com o ataque às torres gémeas, em 2007/2018 com a crise financeira e depois com as revoltas árabes que eclodiram em 2011.
Nos últimos meses, o Produto Interno Bruto Mundial perdeu nove biliões de dólares. «É como se perdêssemos uma Alemanha e um Japão juntos», atirou. Para a União Europeia, lembrou que as previsões apontam para uma retracção de 7.4%, ou seja, «a maior da sua história». Todavia, Costa e Silva está convicto de que Portugal tem tudo o que preciso para «se superar».
Costa e Silva levantou um pouco mais o véu sobre os objectivos-chave para o plano de recuperação: aposta e modernização nas infraestruturas físicas de Portugal, acelerar a transição digital, apostar no Serviço Nacional de Saúde e reforçar os recursos humanos.
«O povo português é absolutamente extraordinário a responder às situações de anormalidade. Reinventa-se, improvisa e é criativo. Depois, quando regressamos à normalidade, somos muito medíocres e é isso que faz perder», lamentou.
O vice-presidente da bancada socialista disse que «temos de olhar para todo esse período [da crise] e não podemos repetir os erros do passado». E adiantou: «Na parte final do documento [plano], irei fazer um apontamento sobre a questão dos fundos: quem vai dar os fundos, como é que as empresas vão ser capitalizadas, como os projectos vão ser desenvolvidos, como é que o escrutínio público se deve fazer e penso que deve haver um portal da Administração Pública que indique claramente aos cidadãos para onde vai o dinheiro e como está a ser aplicado». «Temos de fazer o trabalho de casa para que quando o dinheiro chegar seja bem direccionado», resumiu o paraministro
António Costa e Silva, que está a trabalhar com o apoio de uma equipa do ministério do Ambiente e da Transição Energética, destacou a importância de o país apostar nas energias renováveis, designadamente na eólica e solar. Realçou também o papel do cluster do hidrógenio, assim como nos sectores da mobilidade e transportes.
Mais Estado na economia
«O Estado tem de ser regulador e, nesta fase, interventor no sentido de capitalizar as empresas», alertou. Costa e Silva defende a criação de um fundo público e de um banco promocional, assim como uma revolução capaz de criar um mercado de capitais significativo em Portugal, porque «as empresas estão sempre estranguladas». Para o gestor da Partex, se existir um mercado de capitais, as empresas serão cotadas e existirá um sistema financeiro e económico «mais saudável».
O escolhido por António Costa salientou ainda que «a geografia determinou o nosso destino ao longo de séculos de História», considerando que Portugal «tem uma falha em termos de autonomia estratégica». Assim, entende que o país deve explorar a dimensão continental e marítima. «Sempre que o país se virou para o mar, prosperou», disse, avisando que o mar deve deixar de ser «a casa de banho do planeta».
Relativamente à transição digital, defendeu o alargamento da fibra óptica a todo o país.
«A Europa tem uma oportunidade única e espero que consiga convocar as maiores democracias, inclusive a indiana, canadiana, e trabalhar para os Estados Unidos regressarem a esta órbita, sem esquecer Ásias e China», rematou.
Partidos só negociarão com Governo
Marcelo Rebelo de Sousa confirmou, ontem, que foi informado sobre a escolha de António Costa e Silva, vice-presidente da bancada socialista e gestor da petrolífera Partex, para coordenar a preparação do Programa de Recuperação Económica e «respeita as escolhas feitas pelo primeiro-ministro».
Já na segunda-feira, Rui Rio considerou que Costa e Silva «não é interlocutor» para os partidos da oposição, nem para a Assembleia da República. «Se o Governo quer fazer um plano a longo prazo de desenvolvimento estratégico da económica portuguesa, acho bem. (…) Quem chama a colaborar, não é da minha conta, desde que o relacionamento não seja com essa pessoa», acrescentou. Isso, vincou, «não iríamos aceitar».
O antigo líder do PSD Luís Marques Mendes avançou este domingo, no seu habitual espaço de comentário na “SIC”, que Costa e Silva não vai negociar directamente com os partidos, nem coordenar o trabalho entre governantes.
A Assembleia da República debate na generalidade, a 19 de Junho, a primeira alteração ao Orçamento do Estado para 2020, relacionado com a pandemia do novo coronavírus.
*Notícia actualizada às 10:21