Putin mobiliza inimigos do Ocidente com teoria da conspiração bizarra: saiba o que é o “bilião de ouro”

Vladimir Putin, na recente entrevista com Tucker Carlson, abordou um ângulo que terá escapado a muita gente: o presidente russo referiu que o mundo é governado por um punhado de pessoas poderosas e que ele apenas quer garantir que mil milhões de ocidentais vivam na maior abundância às custas do resto dos habitantes do planeta Terra. É uma tese da conspiração conhecida como “teoria do bilião de ouro” e está na mente de Putin.

Ninguém ignora que existem algumas ideias estranhas na mente de Putin. Por exemplo, existe a sua ideia de que a Ucrânia, o país que tenta invadir há dois anos numa guerra diferente de tudo o que se viu no Velho continente desde a II Guerra Mundial, precisa de ser “desnazificada”. Mas, mais além, acredita que um dos grandes problemas – talvez o maior dos problemas globais – não é a ameaça representada pelo seu regime ou pela China – para Putin, o que é realmente ameaçador é o domínio ocidental. Ou seja, “o mundo deveria ser um todo unido, a segurança deveria ser partilhada, em vez de ser apenas destinada ao ‘bilião de ouro’”.

Noutro ponto da entrevista, abordando as diferenças entre o mundo russo e o ocidental, Putin avançou que o Ocidente, pelo seu caráter pragmático, parecia predestinado a organizar-se em função dessa estranha conspiração do “bilião de ouro”. “A sociedade ocidental é mais pragmática. Os russos pensam mais no eterno, nos valores morais. Não estou a dizer que isso seja mau, torna possível que o ‘bilhão de ouro’ de hoje alcance bons sucessos na produção, até mesmo na ciência, etc.”, explicou Putin.

E o que é a teoria do ‘bilião de ouro’?

Tem origem na Rússia pós-soviética. O desaparecimento do regime totalitário é algo que o presidente russo chamou de “tragédia”, além do “colapso da Rússia histórica”. Foi o autor Anatoly Tsikunov, com textos como ‘O Plano de Governo Mundial: a Rússia e o Bilião de Ouro’ ou ‘Os Planos de Liderança Global para a Escravidão da Rússia’ e, mais tarde, o historiador Sergei Kara-Murza foram creditados por terem lançado as bases dessa teoria.

Basicamente, a teoria do bilião de ouro sustenta, como muitas outras conspirações, que um punhado de pessoas ricas quer explorar o resto da humanidade. Assim, alguns viveriam em condições luxuosas – douradas – em detrimento dos restantes. É mais uma teoria sobre “uma nova ordem mundial, que proliferou nas últimas décadas, juntamente com a expansão do capitalismo”, explicou a antropóloga Xenia Cherkaev na revista académica americana ‘Anthropology and Humanism’.

Estas ideias conspiratórias já se infiltraram nas autoridades da Rússia, indicou o autor Ilya Yablokov, em declarações ao jornal ‘El Español’. “No espaço público russo há um grande número de teorias da conspiração. Todos foram afetados por elas. A teoria do ‘bilhão de ouro’ não é uma teoria da qual Putin fosse um seguidor específico, não, acho que ele só conhecia a expressão”, sustentou Yablokov, autor de um livro dedicado às teorias da conspiração russas.

“’Biliões de ouro’ é uma expressão que serve ao seu propósito de se referir e desacreditar o Ocidente”, diz Yablokov, que leciona desinformação e jornalismo digital na Universidade de Sheffield, no Reino Unido. Na sua opinião, o que Putin quer ao referir-se a esta teoria é “polarizar, por conta da suposta ordem mundial” onde apenas o mundo ocidental, com os Estados Unidos à frente, seria o dono dos desígnios de humanidade.

Uma história como a desta “teoria” serve para pôr de lado o que alguns chamam de “norte global” – o Ocidente – e de “sul global” – o resto dos países. Segundo Stefan Meister, chefe do programa de Ordem Internacional do Conselho Alemão de Relações Exteriores (DGAP) em Berlim, as mensagens da Rússia devem sempre levar em conta que o país de Putin também procura dividir o Ocidente, especificamente os Estados Unidos da América.

De acordo com Meister, a teoria do “’bilião de ouro’ faz parte dessa lógica e tenta explorar o sentimento de injustiça que existe no mundo”. A Rússia de Putin “também tenta destacar-se face ao Sul Global, tenta usar temas como o colonialismo ou as desigualdades, questões que a propaganda russa também utiliza no Ocidente”, acrescentou Meister.

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