Prigozhin usou bancos ocidentais para pagamentos relacionados com as operações do grupo Wagner, revela investigação

Novas revelações indicam que o grupo mercenário russo Wagner, liderado pelo falecido Yevgeny Prigozhin, utilizou bancos ocidentais, como o HSBC e a JP Morgan, para movimentar fundos em África. Segundo documentos divulgados, estas instituições financeiras processaram involuntariamente pagamentos ligados às atividades do Wagner no continente africano.

De acordo com um relatório publicado pelo Centre for Advanced Defense Studies (C4ADS), o grupo de Prigozhin conseguiu expandir as suas operações secretamente através de um complexo esquema financeiro, que incluía transações processadas por bancos ocidentais. O relatório afirma que as empresas associadas ao Wagner utilizaram o HSBC e a JP Morgan para movimentar fundos de empresas de mineração controladas pelo grupo, nomeadamente a Meroe Gold, uma empresa do Sudão.

O grupo Wagner, conhecido pelo seu envolvimento em conflitos em vários países, especialmente na Ucrânia, manteve uma presença significativa em África, onde oferecia apoio e proteção a governos locais em troca de direitos exclusivos sobre recursos minerais, como ouro e diamantes. As suas operações em países como o Sudão e a República Centro-Africana foram financiadas principalmente através das receitas geradas por estas atividades de mineração.

O relatório do C4ADS expõe como as operações de Wagner em África foram suportadas por uma rede global de instituições financeiras e empresas. Segundo o estudo, as empresas de mineração associadas ao grupo utilizaram bancos globais para realizar pagamentos a fornecedores locais e empresas chinesas.

Um exemplo documentado foi um pagamento feito em 2017 pela Meroe Gold a uma empresa chinesa para a compra de geradores a diesel e peças de reposição, através do Hang Seng Bank, parte do HSBC. No mesmo ano, a Meroe Gold teria utilizado uma sucursal da JP Morgan em Nova Iorque para intermediar uma transação com outro fornecedor chinês. Não há, contudo, indícios de que qualquer um dos bancos estivesse consciente de que os fundos estavam relacionados com as operações de Wagner.

Os bancos envolvidos negam qualquer conhecimento ou cumplicidade na facilitação destas transações. O HSBC, em comunicado, reafirmou o seu compromisso com o combate ao crime financeiro e com a manutenção da integridade do sistema financeiro global. “Investimos significativamente na construção e manutenção de um quadro de controlo eficaz para detetar e mitigar este tipo de risco”, declarou um porta-voz do banco.

A JP Morgan, por sua vez, optou por não comentar as alegações.

O C4ADS, que se dedica à análise de conflitos e de redes financeiras ilícitas, alertou para a necessidade de um reforço nos mecanismos de controlo e diligência das instituições financeiras. O relatório enfatiza que, ao interromper o acesso do grupo Wagner a canais legítimos para a movimentação de dinheiro e bens, será possível aumentar os custos operacionais da organização, dificultando a sua capacidade de manter atividades financeiras a nível global.

“É crucial que as empresas identifiquem e abordem os riscos associados a todas as etapas da cadeia de fornecimento, incluindo transportadoras, agentes de frete e bancos intermediários”, afirmou o C4ADS. A organização defende que, ao melhorar a supervisão e os sistemas de monitorização financeira, será possível dificultar as operações do grupo e reduzir a sua capacidade de financiar operações militares e mercenárias.

Prigozhin e o grupo Wagner: ascensão e queda

Yevgeny Prigozhin, anteriormente vendedor de cachorros-quentes e cozinheiro, transformou-se num dos homens mais poderosos da Rússia, controlando o grupo Wagner, uma força mercenária que desempenhou um papel crucial na invasão russa da Ucrânia. Ao mesmo tempo, o grupo Wagner expandiu as suas operações militares para África, fornecendo serviços de segurança em troca de direitos sobre recursos valiosos.

Contudo, a ascensão de Prigozhin terminou tragicamente em 2023, quando morreu num acidente de avião, semanas após uma tentativa falhada de golpe contra o presidente Vladimir Putin. Desde então, o grupo Wagner foi integrado formalmente nas forças armadas russas, mas as suas atividades internacionais, especialmente em África, continuam a ser alvo de escrutínio.

O relatório do C4ADS lança luz sobre o papel das redes financeiras globais na sustentação das operações de Wagner, destacando a importância de medidas mais rigorosas para garantir que instituições respeitáveis não sejam involuntariamente usadas para facilitar atividades ilícitas.

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