Pode a extrema-direita formar um supergrupo no Parlamento Europeu? Nem a Europa nem os próprios estão preparados, indica analista

A extrema-direita pode sonhar com um supergrupo após as eleições para o Parlamento Europeu, marcadas para 9 de junho. No entanto, de acordo com o jornal espanhol ‘El Confidencial’, são mais as diferenças que os separam do que a política que os une.

Pedro Sánchez, primeiro-ministro espanhol, alertou em março último “que a extrema-direita está a crescer em toda a Europa” – no entanto, sob esse rótulo genérico, há tantas famílias que por vezes parece um milagre que consigam chegar a acordo sobre algo no Parlamento Europeu. Dos eurocéticos aos pós-fascistas. Dos ultra-conservadores aos nacionalistas identitários. Dos atlantistas aos pró-russos.

No evento ‘Europa Viva 24’ que Santiago Abascal, presidente do Vox espanhol, e que contou com André Ventura, em Madrid no passado fim de semana, conseguiram reunir representantes de vários grupos, de Marine Le Pen a Giorgia Meloni, e com o húngaro Viktor Orbán a desempenhar um papel fundamental nestes mecanismos. Abascal é outro dos que integrou o caminho para esta coligação europeia, uma aspiração cujo passo definitivo seria na integração numa espécie de supergrupo político de extrema-direita.

De acordo com algumas sondagens, este hipotético bloco seria como o terceiro ou mesmo o segundo maior no Parlamento Europeu depois das eleições de 9 de junho.

Mateusz Morawiecki, primeiro-ministro da Polónia entre 2017 e 2023, é outro dos grandes apoiantes deste supergrupo. “Resta saber quais serão os resultados finais das eleições europeias e veremos”, salientou, em declarações ao ‘POLITICO’. Antes dele, houve outros nomes que tentaram, mas acaba sempre desviado. Agora, porém, o crescimento – previsto pelas sondagens – dos principais partidos de extrema-direita podem acabar por fazer pender a balança.

Em 2019, o espectro de um grande bloco de extrema-direita no Parlamento Europeu que pudesse bloquear o bom funcionamento da instituição tornou-se quase uma obsessão em Bruxelas, embora sem nunca se concretizar. Agora, o espectro da extrema-direita marca mais uma vez a campanha. Desta vez já não se levanta a possibilidade de um grupo unido que reúna todas as forças reacionárias, mas as sondagens mostram o número de assentos para os dois grupos existentes: os Conservadores e Reformistas (ECR), onde Vox, Fratelli d’Italia, o partido do primeiro-ministro italiano Meloni, e Lei e Justiça (PiS), que governou a Polónia entre 2015 e 2023, e a Identidade e Democracia (ID), onde se destacam o Rassemblement National de Le Pen, o Lega de Salvini ou, ainda esta semana, o Alternativa para a Alemanha ( AfD), que contribuiu com nove parlamentares para o grupo.

“A distinção entre estes dois grupos reside mais no lugar onde têm assento no Parlamento Europeu do que nas suas ideias”, explica Marta Lorimer, investigadora em Política Europeia na London School of Economics, especializada em movimentos populistas e de extrema-direita. “A maioria dos partidos destes dois grupos partilham posições, apenas discordam em algumas questões estratégicas, como a Ucrânia: mas essencialmente são o mesmo tipo de partido.”

A principal lacuna entre os dois grupos, e mesmo entre os seus membros, é a Rússia. Embora para os interesses da coligação de partidos conservadores e de extrema-direita liderada pelo ECR o apoio dos 12 deputados de Orbán sejam uma bênção, também é um problema. Os acenos dos húngaros ao regime russo colocaram-nos em oposição aos Pólos da Lei e da Justiça (PiS), embora agora Morawiecki se tenha mostrado muito mais a favor de aproximar-se do partido húngaro.

O ECR, bloco político criado na altura por influência da ala eurocética do Partido Conservador Britânico, é uma família ultra-conservadora mas decididamente atlantista, ou seja, favorável à NATO, e, em princípio, aberta ao livre comércio.

Por seu lado, o ID reúne partidos que têm sido tradicionalmente pró-Rússia ou que não esconderam os seus laços com o Kremlin, e que economicamente tendem a ser mais protecionistas. A outra diferença fundamental é que o ECR faz parte da governabilidade da Europa: os seus partidos controlam os Governos ou fazem parte de executivos nacionais e regionais, enquanto a presença de partidos do ID nas instituições é residual. “A menos que ambos cresçam o suficiente para conseguirem articular uma maioria, o ECR teria mais interesse em trabalhar com o PPE do que com o ID, que contém muitos partidos com os quais não está interessado em ser visto”, realça Lorimer.

Ter ministros ou mesmo líderes, como é o caso de Itália e da República Checa, dá acesso a outra camada de poder em Bruxelas. Todos olham para o Parlamento Europeu, mas a capacidade de influência mede-se pela sua presença em todas as engrenagens da capital comunitária, onde o Parlamento Europeu é apenas um, e não o mais relevante. Ter secretários de Estado ou ministros significa que estes assistem às reuniões do Conselho da UE, que tem formações diferentes para cada uma das áreas, como Economia e Finanças (ECOFIN) ou Relações Exteriores (CAE). Os ministros encontram-se continuamente, discutem posições comuns, negociam com o Parlamento Europeu e legislam. Entrar no Conselho da UE é um ‘mergulho’ no dia a dia da União Europeia.

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