OE2021: Sem surpresas. Faltam ‘medidas robustas’ para a recuperação e alívio fiscal
Marta Gaudêncio, advogada na Sociedade Pares Advogados, avalia a proposta orçamental que vai ser submetida a votação final já amanhã, dia 26.
A Proposta de Orçamento do Estado para 2021, que se encontra a ser discutida na especialidade, vai ser aprovada num contexto de grande incerteza quanto à situação económica que vamos viver no próximo ano, fruto da pandemia da doença covid-19.
Não obstante as perspetivas serem sombrias, em Portugal e no resto do mundo, a proposta de Orçamento do Estado não contém, como seria de esperar, medidas robustas no sentido da recuperação económica ou do alívio da carga fiscal que incide sobre as pessoas e as empresas.
Desde logo, quanto às empresas, a única medida de relevo é a criação de uma disposição transitória aplicável às cooperativas e às micro, pequenas e média empresas, segundo a qual a taxa agravada de tributação autónoma (+10%) não será aplicável em algumas situações.
Num momento em que o objetivo deveria ser tentar manter o tecido empresarial existente e atrair investimento, designadamente reduzindo a taxa de IRC ou criando alguns benefícios fiscais à criação de emprego ou ao investimento, não é isso que se verifica – eventualmente porque não existe margem orçamental para o efeito, mas assim torna-se mais difícil iniciar a tão desejada retoma da economia.
Por outro lado, prevê-se que passe a estar sujeita a IMT a aquisição de participações representativas de, pelo menos, 75% do capital social de uma sociedade anónima cujo ativo seja composto em mais de 50% por bens imóveis situados em Portugal, exceto se os imóveis estiverem afetos a uma atividade comercial, industrial ou agrícola, que não seja a compra e venda de imóveis.
Prevendo-se que o sector do imobiliário sofra uma quebra, e sabendo que grande parte do investimento imobiliário é realizado sob a forma societária, não se compreende a implementação desta medida neste momento.
No que concerne às pessoas singulares, são tomadas algumas (poucas) medidas, que ficam muito aquém do desejado.
A título exemplificativo, deixam de ser apuradas mais-valias aquando da afetação de imóveis do património particular a uma atividade empresarial (nomeadamente alojamento local) e, também, aquando do regresso do imóvel à esfera pessoal – a mais-valia tributável passa a ser apurada apenas aquando da alienação do imóvel a terceiros (embora com algumas especialidades).
A possibilidade de dedução à coleta de 15% do IVA em atividades desportivas e ginásios, por exigência de fatura, terá um impacto insignificante, sobretudo tendo em conta que o limite global desta dedução não sofre alterações.
Também o “IVAucher” é uma medida que será insuficiente para estimular o consumo nas atividades de hotelaria e restauração, mesmo se combinado com o ligeiro aumento do rendimento disponível das famílias, por efeito da anunciada redução das taxas de retenção na fonte. Haverá, muito provavelmente, outras prioridades para as famílias.
Em resumo, esta proposta de Orçamento do Estado contém um conjunto de medidas avulsas, claramente insuficientes para lidar com os tempos difíceis que atravessamos.