OE2021. A (in)evitabilidade do Orçamento de fiscalidade oculta

Joana Cunha d’Almeida, advogada fiscalista e sócia da Antas da Cunha Ecija, avalia a proposta orçamental que vai ser submetida a votação final no próximo dia 26.

 

O estado da Nação e a situação de precaridade e urgência económica e social em que milhares de portugueses se veem ou verão mergulhados de um dia para o outro, justificam um Orçamento do Estado dotado de uma fiscalidade que se veja.

Num momento excecional, compreende-se a opção por medidas provisórias e conjunturais por ser óbvia e necessária a resposta política às graves e urgentes questões sociais. Compreendem-se as dificuldades inerentes à elaboração de um orçamento em contexto de incerteza e imprevisibilidade.

Já é, no entanto, do campo da boa vontade compreender o manifesto esquecimento a que este orçamento relega o maior motor da economia portuguesa – as empresas. O Orçamento do Estado não prepara o país para as graves deficiências estruturais que se antecipam já como inevitáveis. O orçamento tapa buracos sem cuidar de travar a cratera que se abre na economia.

Portugal apresenta uma carga fiscal empresarial superior à média da Europa e não aproveita este momento para aliviar a pressão que obriga as empresas a um esforço constante pela sobrevivência.

Para melhor enquadrar a urgente necessidade de apoio às empresas através de alívio fiscal, utilizamos o exemplo das atividades diretamente relacionadas com o Turismo, tão gravemente afetado pelos efeitos da pandemia.

A nossa economia é fortemente dependente das exportações, em que se incluem as despesas que os turistas estrangeiros fazem no país em hotéis, restaurantes ou atividades de lazer.

As atividades de alojamento e restauração empregavam, no final de 2019, mais de 350 mil pessoas, correspondendo a uma percentagem de aproximadamente 7,5% do total do emprego no país (valor superior ao de setores como a educação, as atividades na área da saúde ou o setor da construção).

O ano de 2019 encerra com um notável superavit na nossa balança comercial de viagens e turismo, com exportações de € 18,5 mil milhões contra € 5,3 mil milhões de importações.

Apesar da importância destes valores macro, as empresas do setor empregam em média apenas 3,4 pessoas, e só metade declara lucros tributados em IRC. Trata-se de um dos piores índices de rentabilidade do país, aproximadamente 10 pontos percentuais abaixo da média.

Estes dados são reveladores: apesar de responsável por uma importante fatia das exportações e de assim contribuir para a saúde financeira do país, o setor do Turismo apresenta fragilidades que o tornam permeável aos danos causados pela pandemia, com impacto direto nas famílias que do mesmo dependem.

É caso para dizer que, especialmente em 2021, para proteger as famílias o Orçamento do Estado não pode esquecer-se das empresas.

De entre as possíveis, vemos especial bondade em medidas como a redução da taxa de IRC para os setores mais fortemente atingidos, a possibilidade de utilização da totalidade dos prejuízos fiscais disponíveis ou mesmo a isenção de IRC em caso de afetação de lucros a reforço de capitais próprios. O momento é, infelizmente, de uma fiscalidade inevitável.

 

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