“Nem as portas encerradas nem as portas escancaradas”: Governo apresenta plano para as migrações. Saiba o que muda

O Governo apresentou, esta segunda-feira, no Campus de Carcavelos, o plano para as migrações, num momento em que a procura de autorizações de residência disparou, causando problemas na gestão dos serviços. Luís Montenegro, após o Conselho de Ministros, salienta que “em Portugal sentimos nas últimas duas décadas um definhamento demográfico, que tem repercussões que se vão espelhar nas próximas décadas”.

“Precisamos em Portugal, em quase todas as áreas de atividade, desde a mais simples função até à mais qualificada, de mais capital humano. Há muitas pessoas em outras geografias do mundo que procuram locais de referência para prosseguir a sua atividade. Os portugueses sabem o que isso é. Temos de perceber que quem procura Portugal têm o mesmo espírito que muitos portugueses procuram lá fora as suas oportunidades. É com o mesmo respeito, o especial cuidado na dignidade de cada pessoa, no humanismo que tem de estar presente, que Portugal quer acolher os imigrantes que vêm fortalecer o nosso tecido económico”, aponta o primeiro-ministro.

Pode acompanhar o anúncio das medidas aqui.

“A política de migração que propus ao país era simultaneamente nem de portas fechadas nem de portas escancaradas. Este princípio encerra em si uma política que tem objetivos concretos: entendemos que é preciso regular a migração para dar dignidade às pessoas. Não vamos fechar a porta a quem quer ter essa oportunidade, mas não a fechamos por uma razão de pragmatismo: precisamos de pessoas em Portugal com vontade de ajudar a construir uma sociedade mais próspera.”

“Mas não vamos cair no outro extremo: não vamos largá-los para que fiquem ao abandono, e muitas vezes perante o abuso das organizações criminosas. Para isso precisamos de ter regras. Num tempo limitado, traçámos um conjunto de decisões, que vamos implementar nos próximos meses, que procuram colocar um ponto final no processo: ter mais de 400 mil processos de regularização é sinónimo de falta do pendor humanista. Pior do que não ter uma resposta é viver na incerteza”, refere Luís Montenegro, que indica que vai ser “extinta a manifestação de interesses” e a reformulação da AIMA – “vai ser preciso um reforço de meios por parte da PSP, numa unidade de estrangeiros e fronteiras”, aponta o primeiro-ministro, salientando que “não há qualquer uma relação direta entre a nossa capacidade de acolher imigrantes e índices de criminalidade“.

“Vejo os imigrantes que procuram Portugal como os novos portugueses”, conclui.

Quatro pilares em que assenta o plano para “o novo futuro que aqui estamos a construir”

António Leitão Amaro, ministro da Presidência, salienta “as soluções eficazes, mas humanas, para desafios altamente penalizadores para quem vive hoje em Portugal em condições indignas. É este novo futuro que aqui estamos a construir. O que propomos assenta em quatro pilares: temos de ter imigração regulado, temos e devemos apostar na atração pró-ativa do talento estrangeiro, temos de acolher bem com humanismo quem vem e, por último, colocar o Estado a funcionar muito melhor”.

“Os migrantes reforçam, não prejudicam, a sustentabilidade da Segurança Social. Este é outra das razões pela qual dizemos que Portugal precisa de imigrantes. É preciso acabar com a ideia que há uma relação entre o aumento dos imigrantes e o aumento de crime: não há essa relação”, sublinha o ministro, que indica que o acordo de livre circulação na CPLP “vai manter-se”.

“Este processo de admissão, acolhimento e integração humana também merece uma resposta que hoje é extraordinariamente difícil” finaliza António Leitão Amaro. “Onde falhamos nas regras e quando falhamos na fiscalização, estamos a dar azo ao aproveitamento. Onde não um sistema regular e operacional, grassam oportunidades para seres humanos fazerem mal a outros seres humanos.”

Veja aqui o Plano de Ação para as Migrações.

O que vai mudar?

O Governo pôs fim ao regime excecional que permitia a um estrangeiro entrar em Portugal e só depois pedir autorização de residência e anunciou a criação de uma estrutura de missão para regularizar processos pendentes, estimados em 400 mil.

No Plano de Ação para as Migrações, consta o “fim do regime excecional que passou a permitir uma entrada sem regras, extinguindo o designado procedimento de manifestações de interesse”, considerada uma “porta aberta e fonte de grande parte de pendências”. A partir de agora, já não será possível a um estrangeiro com visto de turista tratar da sua regularização em Portugal, necessitando de um contrato de trabalho ou de outra solução tratada previamente na rede consular portuguesa.

Por isso, o plano contempla o “reforço da capacidade de resposta e processamento dos postos consulares identificados como prioritários”, com o reforço de 45 elementos em 15 países, uma lista que inclui todos os países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

A revogação dos artigos 88 e 89 da Lei de Estrangeiros, que permitiam a legalização em Portugal de turistas estrangeiros, será seguida de uma “revisão da lei [geral] em sede parlamentar” nos próximos meses.

No entanto, todos os pedidos já apresentados serão processados, desde que “tenham sido instruídos corretamente” ou tenham “mais de um ano de descontos para a segurança social”.

O plano contempla também a “agilização e priorização dos canais de entrada de imigrantes” para reagrupamento familiar, jovens estudantes, profissionais qualificados e nacionais dos países da CPLP.

O Governo compromete-se a renovar os documentos a expirar, cujos prazos começam a terminar este mês, e a “agilizar os procedimentos de concessão de vistos e autorizações de residentes” aos restantes cidadãos lusófonos.

O plano inclui a criação de uma “estrutura de missão, com recursos humanos, materiais e financeiros adicionais, viabilizados por medidas extraordinárias de contratação, que integre funcionários da AIMA, inspetores do ex-SEF [Serviço de Estrangeiros e Fronteiras] e outros profissionais a recrutar”.

A essa estrutura de missão caberá a responsabilidade pela “apreciação expedita dos pedidos” e um reforço do atendimento presencial para resolver as pendências existentes.

Em paralelo, o plano prevê a “intervenção urgente nas infraestruturas, sistemas informáticos e bases de dados do controlo de fronteiras existentes”, a recuperação do atraso na implementação dos novos sistemas de controlo de fronteiras (‘smart borders’) e um “sistema de atração de capital humano”, que inclui a colaboração com “confederações e associações empresariais” para trazer trabalhadores necessários para o tecido económico português, embora sem nunca referir qualquer política de quotas.

Há 350 mil processos por regularizar em Portugal

Em outubro do ano passado, o anterior Governo criou a Agência para a Integração, Migração e Asilo (AIMA), extinguindo o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e o Alto Comissariado para as Imigrações, uma decisão que foi criticada pelo PSD, então na oposição.

Nas últimas semanas, têm-se acumulado filas junto aos serviços da AIMA e estima-se que existam 350 mil processos por regularizar. Por outro lado, verifica-se uma grande falta de recursos humanos na AIMA, que vai agravar-se com os pedidos de saída de uma centena de funcionários.

Segundo um relatório da agência, divulgado pelo ‘Expresso’, sobre a recuperação das pendências do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), elaborado este mês, o novo organismo iniciou funções em outubro de 2023 com apenas 714 funcionários — 41% do contingente dos organismos extintos que estaria à disposição. O documento refere que houve “uma redução líquida do total de efetivos, devido à saída de vários trabalhadores, não compensada com as entradas entretanto ocorridas”.

De acordo com o semanário, a AIMA aponta para a existência de, pelo menos, 459.384 processos em curso a 29 de outubro de 2023, a maioria (344.619) de legalização através de manifestações de interesse (para imigrantes que já se encontram em Portugal, sem necessidade de entrada legal no território).

Face ao problema, o Governo anunciou que pretendia rever o modelo institucional de fiscalização dos imigrantes, considerando uma “asneira” o modo como a AIMA substituiu o extinto SEF. “Portugal tinha uma instituição, a instituição foi eliminada, os seus recursos humanos foram distribuídos por várias instituições”, uma decisão criticada por vários partidos e organizações, diz o ministro da Presidência, António Leitão Amaro.

O Governo acusou ainda o Executivo de António Costa de ter cometido “um erro sério” na política de migrações em Portugal. “É absolutamente crítico corrigir a forma como agiu o Governo anterior. O que está em causa é dar resposta a problemas do Governo anterior, quando criou instituições que não funcionam, assim como a fiscalização e integração”, refere António Leitão Amaro, sublinhando que é necessário “tomar medidas para acelerar os processos pendentes, com medidas para rever as regras que estão a gerar situações preocupantes, incluindo o aumento da atividade das redes de tráfico, que levam a que haja cada vez mais pessoas migrantes a viver em situações indignas”.

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