Morte de Odair Moniz: Petição que apoia queixa-crime contra Ventura e o Chega ultrapassa 120 mil assinaturas. Vai agora ser entregue na PGR
A petição pública lançada na sexta-feira para apoiar uma queixa-crime contra André Ventura, líder do Chega, o líder parlamentar Pedro Pinto, e o assessor Ricardo Reis, ultrapassou, em poucos dias, a marca das 120 mil assinaturas e contava esta segunda-feira, pelas 11h00, com mais de 123 mil, numa resposta crescente à polémica gerada por declarações polémicas dos membros do partido sobre a morte de Odair Moniz, baleado por um agente da PSP. António Garcia Pereira, advogado e um dos autores da queixa, anunciou este domingo que a queixa do grupo será entregue na Procuradoria-Geral da República (PGR) a partir desta segunda-feira, segundo os responsáveis.
No decorrer do fim de semana, André Ventura afirmou, na rede social X (antigo Twitter), que a petição era uma “fraude” promovida pela esquerda e pelo sistema, acompanhando a acusação com uma imagem manipulada que simulava uma notícia da imprensa, onde se lia que a petição estava a ser manipulada com perfis falsos. Garcia Pereira, em entrevista à SIC Notícias, negou esta acusação, assegurando que, até ao momento, foram identificadas apenas “duas assinaturas falsas entre as 116 mil” recolhidas, ambas provenientes de apoiantes do Chega. Segundo o advogado, estes casos poderiam ser uma tentativa de descredibilizar a petição e “virem dizer que parte daquelas assinaturas são falsas”.
A acusação de Ventura foi desmentida, e Garcia Pereira afirmou que a atitude do Chega de “vitimização” seria uma forma de desviar a atenção dos objetivos da petição e da queixa-crime, bem como dos conteúdos polémicos das declarações dos visados. A petição, ao contrário do que Ventura sugeriu, não exige um número de Cartão de Cidadão, pois não será levada ao Parlamento, mas sim submetida à PGR como suporte adicional da queixa-crime, explicou o advogado.
A iniciativa de queixa-crime é promovida por um grupo diversificado de cidadãos e apoiada por várias figuras públicas, incluindo juristas, ex-governantes e personalidades do meio cultural. Entre os signatários estão Teresa Beleza, ex-coordenadora do Observatório do Racismo e Xenofobia, o ex-ministro da Educação João Costa, as ex-secretárias de Estado Catarina Marcelino e Rosa Monteiro, e figuras mediáticas como o humorista Nuno Markl e a atriz Cláudia Semedo. Beleza, em declarações ao Diário de Notícias, manifestou indignação, considerando que as declarações dos líderes do Chega “incitam ao ódio” e têm contornos de racismo e xenofobia. Por seu turno, João Costa sublinhou que a sociedade não pode ser cúmplice perante o discurso de ódio, defendendo que a mobilização é necessária para preservar o Estado de Direito.
A queixa-crime visa, especificamente, as declarações de André Ventura, Pedro Pinto e Ricardo Reis na sequência do incidente com Odair Moniz. Ventura declarou publicamente que o agente envolvido no disparo devia ser “condecorado” e insinuou que Moniz era “criminoso”, mesmo sem qualquer conclusão oficial da investigação em curso. Pedro Pinto, por seu turno, afirmou que o país “estaria mais na ordem” se os polícias “disparassem mais a matar”. Já Ricardo Reis, então assessor parlamentar do Chega, publicou no X uma mensagem de apoio ao agente, na qual se referia a Moniz como “menos um criminoso… menos um eleitor do Bloco”, tendo mais tarde apagado a conta naquela rede social.
Estas afirmações, na ótica dos queixosos, constituem crimes de “incitação à prática de crime”, “apologia da prática de crime” e “ofensa à memória de pessoa falecida”. Os autores da queixa consideram que a descrição de Moniz por parte dos membros do Chega sem base na investigação oficial agrava tensões sociais e incita à violência.
A PGR confirmou na sexta-feira a abertura de um inquérito sobre as declarações de Ventura, Pinto e Reis, investigação esta que, no entanto, não está diretamente ligada à queixa-crime formal, que só será apresentada esta segunda-feira. Miguel Prata Roque, um dos promotores da queixa e antigo secretário de Estado do governo de António Costa, reafirmou o compromisso do grupo em responsabilizar judicialmente os autores das declarações e salvaguardar a dignidade de Odair Moniz.
Enquanto a Polícia Judiciária mantém a investigação sobre o incidente que levou à morte de Moniz, a adesão à petição pública reforça o movimento cívico contra discursos que, segundo os signatários, “promovem preconceitos perigosos e incitam ao ódio”. Para Garcia Pereira, a caracterização de Moniz como “bandido” antes da conclusão oficial da investigação configura uma “violação grave do direito à dignidade” e ofende a memória do falecido.