Médio Oriente: ONU e Israel chocam sobre papel da UNRWA e ligação com Hamas

Israel e a ONU voltaram hoje a divergir sobre o papel e a importância da Agência das Nações Unidas para Refugiados Palestinianos (UNRWA) em Gaza, após um ataque israelita na semana passada ter matado seis funcionários daquela organização.

Numa reunião do Conselho de Segurança da ONU, a coordenadora humanitária e de reconstrução de Gaza, Sigrid Kaag – recém-chegada do enclave palestiniano – elogiou a UNRWA e o seu “papel vital” não só na recente campanha bem-sucedida de vacinação contra a poliomielite em Gaza, como nas operações humanitárias.

“A campanha contra a poliomielite ressaltou o papel vital que a UNRWA desempenha, não apenas de acordo com seu mandato, mas também como um parceiro crítico e confiável no tecido social de Gaza e como a espinha dorsal das operações humanitárias”, afirmou Sigrid Kaag.

Também o diretor executivo do Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos (UNOPS), Jorge Moreira da Silva, enfatizou “o papel crítico e insubstituível que a UNRWA desempenha em Gaza”.

Minutos antes do início da reunião do Conselho de Segurança, o embaixador de Israel junto da ONU, Danny Danon, fez exatamente o oposto e lançou duras críticas à UNRWA, avaliando que a agência “não pode fazer parte da solução, porque faz parte do problema” na Faixa de Gaza.

Na semana passada, pelo menos 18 pessoas morreram num ataque israelita contra uma escola que servia como abrigo, em Nuseirat. Entre as vítimas mortais estavam crianças, mulheres e seis funcionários da UNRWA.

As Forças de Defesa de Israel justificaram que o ataque tinha como alvo um centro de comando e controlo do Hamas que estava localizado naquele complexo em Gaza.

Israel alegou ainda que pelo menos três dos funcionários da UNWRA mortos no ataque eram também combatentes do Hamas.

Danny Danon exibiu hoje um cartaz com nomes e rostos de alegados membros do Hamas que morreram no bombardeamento à escola, indicando que alguns eram funcionários da UNRWA.

“E ainda assim, infelizmente alguns aqui neste edifício [da ONU] continuam a financiar esta organização como se fosse neutra”, quando “cada um destes terroristas eram agentes militares, tinham um trabalho durante o dia e outro à noite, porque eram funcionários da UNRWA”, criticou o diplomata.

Depois dos ataques do Hamas contra Israel em 07 de outubro, que fizeram cerca de 1.200 mortos e 251 reféns, as autoridades israelitas promoveram uma campanha de denúncia contra a agência das Nações Unidas, que desde a década de 1950 presta assistência aos palestinianos que perderam as suas casas e meios de subsistência como resultado da criação do Estado de Israel em 1948.

À época da sua criação, a agência atendia cerca de 750 mil pessoas. Hoje, o universo de assistência da UNRWA é de cerca de 5,9 milhões pessoas, uma vez que os filhos de homens palestinianos que viveram no território do Mandato Britânico da Palestina entre 1946 e 1948 também têm o estatuto de refugiado.

Entre os seus serviços, a UNRWA gere mais de 200 escolas na Faixa de Gaza, que desde o início da guerra, há mais de onze meses, serviram de refúgio a centenas de milhares de palestinianos.

O Exército israelita ataca recorrentemente estes centros e acusa frequentemente o Hamas de utilizar as suas instalações para esconder armas, túneis ou centros de comando.

Em janeiro, as acusações israelitas foram mais longe, com Telavive a acusar 12 trabalhadores da UNRWA (em abril esse número subiu para 19) de terem participado nos ataques de 07 de outubro, situação que levou muitos países a suspenderem o seu financiamento à agência.

Todos, exceto o principal aliado de Israel, os Estados Unidos, recuaram.

Após uma investigação que durou meses, o Departamento de Assuntos Internos da ONU (OIOS) afirmou em agosto que, dos 19 acusados, nove podem ter estado envolvidos nos ataques, embora tenha deixado claro que não tinha conseguido verificar de forma independente a informação fornecida pelas autoridades israelitas.

A ONU resistiu à pressão e todos os dirigentes da organização internacional defenderam repetidas vezes o papel necessário e vital da UNRWA em tempos de paz e especialmente de guerra, embora um relatório independente encomendado pelo secretário-geral, António Guterres, tenha reconhecido que a agência deve melhorar os seus mecanismos de neutralidade.

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