
Lua de mel de Costa no Conselho Europeu será “curta”: ex-primeiro-ministro português enfrenta a difícil tarefa de resolver os desentendimentos de uma UE dividida
António Costa vai liderar a sua primeira cimeira dos 27 líderes da União Europeia esta quinta-feira sabendo que o seu valor nunca mais estará tão alto, apontou o jornal ‘POLITICO’, que salientou o “rude despertar” do ex-primeiro-ministro português: terá de navegar na resposta da Europa ao regresso de Donald Trump à Casa Branca e divisões de anos sobre a Rússia e a Ucrânia — tudo isso enquanto França e Alemanha, tradicionalmente os motores impulsionadores na tomada de decisões europeia, estão distraídas e paralisadas.
“Os líderes estão a começar a perceber que teremos de tomar decisões que são inevitáveis, mas também muito desconfortáveis”, explicou um funcionário da UE à publicação, sob anonimato. “As informações sobre os planos de Trump estão a ‘pingar’ em várias capitais.”
António Costa, de 63 anos, chegou a presidente do Conselho Europeu após a eleição europeia deste verão, graças à sua reputação de forjar compromissos longe dos holofotes. Essa competência implícita contrasta fortemente com o fracasso do antecessor de Costa, Charles Michel, em ganhar o respeito de líderes. No entanto, enquanto António Costa preside a cimeiras e procura intermediar acordos entre líderes que podem ter prioridades incompatíveis, só poderá fazer avançar a agenda da UE até certo ponto sem o apoio dos poderosos defensores nacionais.
Mas o ‘dínamo’ franco-alemão é um problema: Paris está em crise política, com Emmanuel Macron fragilizado nas suas visitas a Bruxelas; já Berlim está distraída com uma eleição antecipada, sendo que o bloco europeu não pode decidir nada relacionado a dinheiro até que esteja no comando um novo Governo. Ao mesmo tempo, o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, continua a ser um obstáculo para a maioria das decisões em apoio a Kiev.
Nesta quinta-feira, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky vai discutir o estado da guerra da Rússia com os líderes europeus e provavelmente pedirá mais uma vez mais apoio militar e financeiro. “A situação na Ucrânia estará no centro das nossas discussões”, apontou António Costa na sua carta aos líderes europeus antes da cimeira desta quinta-feira.
No entanto, a marca de António Costa já se faz sentir: encurtou as cimeiras de dois para um dia, o que fez as delícias dos líderes europeus, mas também mostrou maior clareza na agenda e nas conclusões esperadas, o que permite aos líderes europeus conduzir discussões estratégicas em vez de se concentrarem em longas sessões de elaboração.
Mas a lua de mel de Costa pode acabar rapidamente, apontou um diplomata da UE.
Conforme se aproxima a segunda presidência de Trump, os líderes europeus estão cientes de que precisam aumentar o seu apoio militar e financeiro a Kiev — mas não chegam a acordo sobre como lá chegar. Apesar da boa vontade em torno de Costa e da iminente possível redução do apoio dos EUA à Ucrânia, Bruxelas não parece preparada para fazer promessas concretas a Kiev esta semana.
“O que a Europa pode fazer mais se necessário, autonomamente, para apoiar a Ucrânia?” será uma das perguntas em foco, segundo a fonte do ‘POLITICO’. “Espero que esta seja uma das perguntas respondidas com a reunião dos 27, certamente o começo de uma resposta para essa pergunta.”
Dada a situação, alguns diplomatas brincam que o período de lua de mel de Costa pode terminar esta quinta-feira, quando os líderes discutem o relacionamento transatlântico durante o almoço. “Já podemos ver a mudança com Costa, ele tem toda uma série de métodos que o tornam um guardião da unidade em vez de uma força política”, salientou outro diplomata da UE, que alertaram contra expectativas imoderadas, citando o exemplo do ex-presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, agora primeiro-ministro da Polónia. Mesmo Tusk — “uma grande personalidade” amplamente respeitada pelo trabalho que fez entre 2014 e 2019 — “não deixou um legado duradouro”, concluiu o diplomata.