“Levam tudo. Parece que bebem”: há cada vez mais espanhóis a atravessar a fronteira para comprar azeite. Preços chegam aos 14 euros de diferença

No corredor do azeite do hipermercado Continente de Valença do Minho, a passagem mais movimentada de toda a fronteira entre Espanha e Portugal, praticamente só se ouve falar castelhano. “90% da nossa clientela espanhola procura o azeite”, referiu Fábio Silva, gerente do estabelecimento, em declarações ao jornal espanhol ‘El País’.

O motivo? O aumento recorde do preço – 52% no último ano -, devido a dois anos de colheitas reduzidas a mínimos históricos devido à seca, o que impulsionou os consumidores espanhóis a fazer compras deste lado da fronteira. “Levam muito. No último mês parece que bebem”, referiu Paulo Baiula, gerente do Pingo Doce, em Miranda do Douro, perto da fronteira.

A vida junto às fronteiras tem vantagens: os franceses atravessam à procura de gasolina e tabaco porque são mais baratos. Há portugueses que se deslocam a Espanha para reabastecer o depósito uma vez que os combustíveis têm impostos mais baixos. No entanto, o azeite é um fenómeno relativamente recente, depois de ter subido de preço 72% nos últimos dois anos. Os preços são tão elevados em Espanha – o preço do litro varia entre 7,79 e 13,1 euros – que aumentaram os roubos em lagares de azeite, assim como nos supermercados.

No entanto, a diferença de preços entre Portugal e Espanha é gritante, o que tem provocado a revolta dos consumidores: há posts nas redes sociais de uma garrafa de uma marca espanhola mais barata na Alemanha ou na Irlanda do que em Espanha. De acordo com a OCU – Organización de Consumidores y Usuarios -, o preço médio do azeite virgem extra de marca própria em Espanha é 27% mais caro do que em Portugal: 8,72 contra 6,86 euros. A diferença de IVA (5% em Espanha, 0% em Portugal) não explica a disparidade – o azeite em Espanha é 6% mais caro do que em Itália e 16% mais caro do que em França, com os impostos semelhantes.

O aumento do preço em Espanha poderá dever-se, de acordo com especialistas, a uma componente de especulação, havendo empresas que se aproveitaram para aumentar a margem. No entanto, a queda de volume produzido é a principal razão. O Governo espanhol garantiu, há poucos dias, não ter detetado especulação no domínio da distribuição.

Os diferentes padrões de consumo ajudam a explicar as diferenças: num país com muito consumo de azeite – em Espanha e na Grécia são consumidos em média entre 11 e 12 litros por habitante anualmente. Em Portugal, consome-se 7 litros por habitante, o que é possível que o produto à venda tenha sido importado há meses a um preço inferior ao preço atual. No El Corte Inglés, uma garrafa de cinco litros vendida em Portugal e em Espanha tem uma diferença de 14 euros.

O jornal espanhol deu o exemplo de Mauro Inácio Leal, português que vive em Salamanca há mais de duas décadas, que repete um ‘ritual’ todos os meses: atravessar a fronteira para encher a despensa. “Duas garrafas de três litros de azeite, três garrafas de leito em pó para bebés e dois pacotes de fraldas. Só com estas três coisas poupo 130 euros em Portugal. Vale definitivamente a pena percorrer de carro a distância entre Salamanca e a Guarda”, revelou, salientando que “por 300 euros” em Portugal em compras faz “o mesmo em Espanha, que não passaria dos 500 euros”.

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