Lei da UE está a colocar em risco vida de recém-nascidos. Falta de equipamentos médicos afeta sistemas de saúde europeus

Há inúmeros aparelhos médicos em descontinuação, o que tem impossibilitado terapêuticas que poderiam salvar vidas, sobretudo em casos de recém-nascidos. Em causa está uma lei da União Europeia que regula os dispositivos médicos – medicamentos, equipamentos cirúrgicos e implantes – que tem levado alguns fabricantes a descontinuar e retirar muitos aparelhos do mercado. Por exemplo, cateteres usados para tratar problemas cardíacos congénitos em recém-nascidos. Uma situação que também afeta Portugal e que pode colocar em risco a vida de crianças.

“Na prática, isto acarreta para os doentes a necessidade de serem tratados de uma forma mais invasiva, pondo em risco a sua vida ou não serem tratados de todo”, alertou José Diogo Martins, cardiologista pediátrico no Hospital de Santa Marta e nos Lusíadas, à ‘CNN Portugal’. “Isso preocupa-nos? Sim, e já está a acontecer, já há material que não é rentável para as empresas e que por isso está a sair do mercado”, reforçou Maria João Batista, diretora clínica do Hospital de São João e também cardiologista pediátrica.

Cateteres, stents e pequenos balões cirúrgicos destinados a recém-nascidos já começam a escassear. Damien Kenny, especialista em problemas congénitos, avisou, ao jornal ‘POLITICO’, que “alguém vai morrer como consequência” – o médico irlandês alertou que o que antes era resolvido com um procedimento pouco evasivo feito no berço do hospital pode agora ter de ser tratado através de cirurgias de peito aberto porque não existem já certos equipamentos. “Receio que vamos chegar ao ponto em que não haverá uma solução. Por outras palavras, não haverá nenhuma terapia alternativa e alguém vai morrer como consequência”, indicou.

José Diogo Martins tem a mesma opinião. ““Em vez de fazer um cateterismo através de uma picada de uma veia, vamos estar a fazer uma cirurgia cardíaca que tem um tipo de riscos muito superior”, referiu o especialista. “Vamos pôr em risco a vida de algumas das crianças que já nascem com doença de coração, porque deixámos de poder fazer procedimentos devido ao facto de os cateteres necessários terem deixado de existir.”

A atualização da União Europeia de regulamentação de dispositivos médicos pretendia proteger os doentes de produtos defeituosos ou com níveis de segurança questionáveis: no entanto, as novas restrições fizeram muitos fabricantes optar por descontinuar certos aparelhos por falta de rentabilidade.

O caso dos cateteres é um de vários exemplos de dispositivos em risco de desaparecerem, uma situação que tem sido transversal a todo o serviço de saúde da União Europeia. “É um assunto muito grave que nos preocupa muito”, sustentou o clínico. Maria João Batista alertou que é preciso fazer algo. “Se estivermos todos distraídos e nos esquecermos que há um grupo pequenino de crianças que tem problemas que dependem de dispositivos muito específicos e que não são rentáveis economicamente para as grandes empresas. Estamos no timing certo. Se não for feito nada agora, neste momento, o pior cenário pode mesmo acontecer.”

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