Juiz do Tribunal Constitucional considera ilegal a amnistia concedida pela visita do Papa Francisco

A amnistia concedida pela visita do Papa Francisco, no âmbito das Jornadas Mundiais da Juventude, em agosto último, pode estar ferida de legalidade, considerou um vice-presidente do Tribunal Constitucional, que entendeu que viola o princípio da igualdade entre os cidadãos inscritos na lei fundamental, refere esta quinta-feira o jornal ‘Público’.

Gonçalo Almeida Ribeiro, vice-presidente do Palácio Ratton, fez uma declaração de voto num caso de uma serralheiro da Marinha Grande apanhado ao volante embriagado e sem carta de condução, que foi amnistiado por uma juíza. No entanto, para o magistrado, esta e outras amnistias de cariz comemorativo não têm razão de ser, uma vez que suscita “um sério problema constitucional, sobretudo no plano da igualdade”.

“Ao cooptar o ideário das Jornadas Mundiais da Juventude para justificar uma medida amnistiante, o legislador democrático sacrificou um valor partilhado – a igualdade penal – em nome ou por conta de um valor particular – uma mensagem confessional −, o que não pode deixar de se ter por ilegítimo”, escreveu o conselheiro, salientando que “uma amnistia pode ser uma medida de reconciliação nacional após um período revolucionário, uma transição política ou uma guerra civil, em que o interesse público na paz social e na construção de um futuro comum justifica que se esqueçam os despeitos e os ódios”. Por isso, “não são admissíveis as amnistias comemorativas”.

“Não vejo como um fim comemorativo possa justificar a gravidade das consequências de uma amnistia penal”, concluiu o vice-presidente do Tribunal Constitucional.

Os juízes do Tribunal Constitucional debruçaram-se sobre esta amnistia no caso da Marina Grande, com os quatro conselheiros, incluindo o presidente do tribunal, a validarem a limitação etária da amnistia – o serralheiro tinha 32 anos, mais dois do que o limite estabelecido na lei para o perdão – no passado dia 19. Mandaram a juíza de primeira instância a refazer a sentença, o que significará multar o serralheiro alvo do processo. No entanto, um quinto juiz do Constitucional, Rui Guerra da Fonseca, votou porém vencido, por considerar a medida discriminatória, “caprichosa e inaceitável num Estado de direito democrático”.