Investigação a “tortura e violação” em instituição ligada ao príncipe Harry está ser “branqueada”, denuncia ONG

A Survival International, organização não-governamental que defende os direitos de povos indígenas, denunciou esta terça-feira uma alegada campanha de intimidação destinada a “branquear” a investigação a abusos cometidos no Parque Nacional Odzala-Kokoua, na República do Congo. Este parque é gerido pela African Parks, instituição sem fins lucrativos ligada ao príncipe Harry, que integra o conselho de administração da organização e foi seu presidente durante seis anos.

Os alegados abusos incluem espancamentos, torturas e violações contra o povo indígena Baka, cujas terras ancestrais foram ocupadas pelo parque. Estes atos, cometidos por guardas-florestais contratados pela African Parks, resultaram num clamor mediático global após serem revelados pelo Daily Mail no início deste ano.

Segundo a Survival International, os relatos de abusos começaram há mais de uma década, mas continuam a surgir novos episódios de violência. “Recebemos relatos de intimidação de membros do povo Baka por guardas da African Parks pouco antes do início da investigação no terreno”, afirmou a organização.

Entre os casos denunciados estão as ameaças feitas a pelo menos duas pessoas da etnia Baka, que forneceram informações sobre os abusos e foram confrontadas pelos guardas, que questionaram os motivos das denúncias.

Além disso, os investigadores da firma Omnia Strategy, liderada por Cherie Blair KC, chegaram para entrevistar as vítimas num veículo da African Parks, acompanhados por um funcionário do Governo congolês. “Isto pode ter um efeito inibidor sobre a disposição dos Baka para falarem abertamente”, destacou a ONG.

Durante a investigação, houve ainda relatos de novos espancamentos de mulheres e crianças Baka pelos guardas do parque, incluindo um incidente que levou à perda de um bebé por nascer. “Este caso mostra que os guardas acreditam que podem agir com total impunidade”, acusou a Survival.

A organização também expressou preocupações sobre a transparência da investigação conduzida pela Omnia Strategy, apontando que a African Parks não se comprometeu a divulgar os resultados nem a implementar eventuais recomendações.

Outro ponto crítico levantado foi o potencial lucro da African Parks com a gestão do parque e outras áreas protegidas, através da venda de créditos de biodiversidade e carbono, referidos como “Unidades Naturais Verificáveis” (VNUs). A organização planeia iniciar a emissão destes créditos entre 2024 e 2025.

Caroline Pearce, diretora da Survival International, afirmou que o modelo de conservação colonial subjacente à gestão do parque pela African Parks permanece intocado. “Enquanto toda a base que permitiu à African Parks controlar vastas áreas de terras indígenas não for contestada, qualquer resultado desta investigação será insuficiente. Os Baka precisam de recuperar as suas terras para garantir a sua subsistência, bem-estar e própria existência como povo”, sublinhou Pearce.

A Survival Internacional destacou ainda que investigações anteriores financiadas por grandes organizações de conservação, como o WWF, resultaram em relatórios que frequentemente ignoram ou minimizam os abusos. “Sem regras claras ou compromissos com mudanças fundamentais, os resultados destas investigações correm o risco de serem ignorados ou manipulados”, afirmou a ONG.

Enquanto a investigação prossegue, a Survival reiterou o compromisso de lutar pelos direitos dos Baka e de pressionar a indústria de conservação a adotar práticas justas e respeitadoras dos povos indígenas.

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