Imigrantes em Portugal ganham em média 600 euros por mês, abaixo do salário mínimo nacional

De acordo com dados recentes divulgados pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS), a contribuição média anual dos trabalhadores estrangeiros para a Segurança Social em 2023 foi de 2926 euros, refletindo uma remuneração-base mensal média de 601 euros brutos (considerando 14 meses). Este valor é substancialmente inferior ao salário mínimo nacional de 2023, que era de 760 euros, e ainda mais baixo do que o atual salário mínimo de 820 euros. No total, os 914.963 trabalhadores estrangeiros registados no sistema social português contribuíram com mais de 2,67 mil milhões de euros.

Este montante, que inclui trabalhadores de diversos regimes contributivos (trabalho dependente, independente e contribuições voluntárias), indica que a maioria dos imigrantes está empregada em trabalhos que oferecem salários baixos e, frequentemente, em condições precárias. Segundo adianta Catarina Reis de Oliveira, diretora do Observatório das Migrações, ao Diário de Notícias (DN), os imigrantes em Portugal enfrentam, em geral, condições laborais desfavoráveis, incluindo horários difíceis, pouca estabilidade contratual, e desempenham funções que, muitas vezes, não exigem qualificações formais.

A remuneração média dos trabalhadores estrangeiros reflete uma grande diversidade de situações e o predomínio de setores com salários abaixo da média nacional. Entre as atividades em que os imigrantes estão mais presentes encontram-se a agricultura, restauração, alojamento e serviços associados ao turismo, setores onde predominam contratos a termo e trabalho sazonal e temporário. De acordo com Catarina Reis de Oliveira, o valor médio de 601 euros considera apenas a base contributiva para a Segurança Social, excluindo complementos salariais como alojamento e alimentação.

Analisando os dados por nacionalidade, verifica-se que os brasileiros lideram o grupo, com 379.138 trabalhadores a contribuir para a Segurança Social, somando um total de 1,03 mil milhões de euros em contribuições. No entanto, a sua média de contribuição anual de 2724 euros, ou cerca de 560 euros mensais, situa-se abaixo do valor correspondente ao salário mínimo nacional. Outros grupos, como os trabalhadores indianos, nepaleses e cabo-verdianos, também registaram valores baixos de contribuições e remunerações. Em contrapartida, os trabalhadores espanhóis destacam-se, com uma contribuição média anual de 7085 euros, o que equivale a uma remuneração bruta de cerca de 1456 euros mensais, evidenciando diferenças significativas entre nacionalidades.

Catarina Reis de Oliveira afirma que a disparidade salarial entre imigrantes e trabalhadores nacionais é notória e que existe uma maior concentração de asiáticos, africanos e brasileiros em setores com baixos salários. Esta situação contrasta com a dos cidadãos da União Europeia e norte-americanos, cujas remunerações tendem a ser superiores. Em 2022, os cidadãos da União Europeia contribuíram, em média, com 5405 euros, enquanto os asiáticos registaram uma média de 2043 euros e os trabalhadores dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) contribuíram com 2338 euros.

Para Miguel Teixeira Coelho, especialista em segurança social, a remuneração-base média calculada com base nas contribuições pode não refletir completamente o salário efetivo. Coelho explica que vários trabalhadores independentes podem ter uma base de contribuição abaixo do salário mínimo e que há isenções e condições de trabalho que reduzem as contribuições. Contudo, reconhece que é provável que muitos imigrantes enfrentem salários próximos do mínimo nacional, especialmente em setores como a restauração e a construção civil.

Fernando Ribeiro Mendes, economista especializado em temas do estado social, também defende que a maioria dos trabalhadores estrangeiros ganha o salário mínimo, sendo frequente o recurso ao trabalho sazonal e independente, muitas vezes com rendimentos irregulares. Além disso, Mendes refere que as qualificações de muitos imigrantes não são reconhecidas pelo mercado de trabalho português, limitando as suas oportunidades de progredir em setores mais qualificados.

Uma das principais características do trabalho imigrante em Portugal é a ausência de vínculos laborais permanentes. Em 2020 e 2021, mais de dois terços dos trabalhadores portugueses tinham contratos sem termo, enquanto entre os estrangeiros essa percentagem era apenas de cerca de um terço, segundo Catarina Reis de Oliveira. Esta diferença reflete uma desvantagem para os imigrantes em termos de estabilidade e proteção no mercado de trabalho.

Dados de um estudo do Banco de Portugal indicam que cerca de 495 mil imigrantes em Portugal tinham contrato de trabalho em 2023. A mediana salarial destes trabalhadores foi ligeiramente superior ao salário mínimo de 2023, fixando-se nos 769 euros para os mais jovens e 781 euros para os trabalhadores com mais de 35 anos, valores ainda assim inferiores aos salários medianos dos portugueses.

Em setores como a agricultura e pesca, a presença de imigrantes é notória, com 40% dos trabalhadores a terem nacionalidades estrangeiras, sendo que grande parte provém da Índia, Nepal e Bangladesh. O peso dos imigrantes é também significativo em áreas como a restauração, alojamento turístico, atividades administrativas e construção.

Luís Mira, secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), destaca a importância da mão de obra imigrante na agricultura, setor que enfrenta uma escassez crónica de trabalhadores. Segundo dados da CAP, aproximadamente 20 mil estrangeiros trabalham na agricultura em Portugal, representando cerca de 40% do total de trabalhadores desta área.

O setor do turismo, incluindo a restauração e alojamento, também depende fortemente dos imigrantes. A Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) reforça que estes trabalhadores são “determinantes para o funcionamento dos negócios”, afirmando que são tratados em igualdade de condições com os nacionais e protegidos pela lei e contratação coletiva. A Confederação do Turismo de Portugal acrescenta que o trabalho imigrante é essencial para o crescimento do setor, especialmente com a regularização pendente de 400 mil imigrantes, o que ajudará a estabilizar a oferta de mão de obra.

Em 2022, os estrangeiros representaram 13,5% dos contribuintes para a Segurança Social, com um total de 1861 milhões de euros em contribuições. Em 2023, essa percentagem aumentou para 16,7%, totalizando 2677 milhões de euros, um crescimento de mais de três pontos percentuais. Catarina Reis de Oliveira salienta que o saldo positivo de 2194 milhões de euros resultante das contribuições imigrantes é essencial para o equilíbrio do sistema de Segurança Social, ajudando a compensar os gastos com prestações sociais.

A expectativa de regularização de imigrantes através da manifestação de interesse, que exige uma relação contributiva com a Segurança Social, incentivou o aumento das inscrições e pagamentos até ao primeiro semestre de 2024. Contudo, os especialistas ouvidos admitem que o fim deste processo pode levar a uma diminuição dos imigrantes inscritos no sistema de Segurança Social até ao final de 2024, cenário que será necessário monitorizar.

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