Hot Clube cria comissão interna para averiguar possíveis situações de abuso e assédio

O Hot Clube de Portugal (HCP) constituiu uma comissão de inquérito interna para “apurar situações que possam ter ocorrido” de abuso ou assédio e que envolvam pessoas com ligação à instituição, anunciou hoje em comunicado.

Desde a semana passada vieram a público, através da partilha de testemunhos nas redes sociais, denúncias de casos de violação, abuso sexual e assédio no meio artístico, nomeadamente na área da música, em particular no jazz.

A primeira denúncia foi feita pela DJ Liliana Cunha, que assina com nome artístico Tágide, identificando o pianista de jazz João Pedro Coelho como o alegado agressor.

João Pedro Coelho, músico e antigo professor da escola do HCP, refutou as acusações e reclamou “total inocência”, numa publicação no Instagram.

Também na semana passada, a direção do HCP esclareceu que o pianista João Pedro Coelho deixou de dar aulas na escola no ano letivo 2022/23 e que o caso denunciado por Liliana Cunha não estava relacionado com a instituição.

Nessa altura, o Hot Clube revelou ainda que já tinha identificado “duas situações de assédio” no ano letivo de 2021/22, que levaram “ao afastamento dos professores em causa”, e que foi criado “um Código de Conduta para a comunidade escolar, assim como um Gabinete de Apoio ao Aluno e um Canal de Denúncia”. A direção da escola disse também não ter conhecimento de nenhuma queixa ou denúncia em curso, “estando disponível para atuar de imediato em conformidade com as informações que chegarem”.

Hoje, a direção do HCP anunciou, em comunicado, que “perante outras notícias que têm sido veiculadas, foi decidido constituir uma Comissão para apurar quaisquer situações que possam ter ocorrido no contexto dos factos denunciados”.

Em declarações à Lusa, o presidente do HCP, Pedro Moreira, disse que a comissão de inquérito interna, composta maioritariamente por mulheres, visa “apurar o máximo de factos possível sobre casos, atuais ou passados, com ligação ao universo do Hot Clube”.

Ou seja, denúncias que envolvam atuais ou antigos professores e alunos da escola de jazz.

A comissão começa a trabalhar “em breve”.

“Todas as consequências que forem necessárias serão tomadas em resultado das conclusões da referida Comissão, reiterando o Hot Clube a sua total disponibilidade para colaborar com as autoridades competentes”, lê-se no comunicado.

Nas denúncias de assédio, abuso, violação e agressão, partilhadas ao longo da última semana, já foram identificadas 27 pessoas do meio artístico, a larga maioria da área da música.

Este dado foi revelado na quinta-feira à Lusa pela artista Maia Balduz que, juntamente com Liliana Cunha, tem estado a reunir, verificar e filtrar as denúncias e testemunhos que ambas têm recebido através das redes sociais e de um ‘email’ (testemunhasdamusica@proton.me) que entretanto criaram.

Este número poderá aumentar, visto que as artistas ainda não recolheram todos os testemunhos que receberam através das redes sociais e continuam a chegar denúncias.

Além disso, nem todos os visados estão identificados, porque “há pessoas que têm medo de dizer o nome do agressor, [e] precisam só de um canal seguro para relatarem a sua situação”.

Os diferentes acusados são alvo de várias denúncias, excetuando um, sobre o qual foi contabilizado apenas um testemunho até agora.

As duas artistas não irão expor nomes de vítimas, que são maioritariamente mulheres – mas também há homens -, nem as situações pelas quais passaram, “a menos que alguma queira chegar-se à frente”.

Os alegados crimes vão do ‘stalking’ (perseguição) ao assédio, violação e agressão.

“Infelizmente, em Portugal, a maior parte dos crimes prescreve. Houve pessoas que foram apresentar queixa e o crime já tinha prescrito. Nesse aspeto a Justiça não está a servir o seu propósito”, lamentou Maia Balduz.

Alguns casos aconteceram em situações de relações de poder, entre vítima e agressor, como por exemplo professor e aluna.

Liliana Cunha acusou João Pedro Coelho de violação e ‘stealthing’ (não-utilização de preservativo sem consentimento do/a parceiro/a), alegadamente cometidos em 2023.

No entanto, o ‘stealthing’ não é considerado crime em Portugal e as queixas por violação têm de ser apresentadas no prazo de um ano após a ocorrência do alegado crime.

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