Greve às rendas para combater a crise na habitação. É esta a resposta do Sindicato dos Inquilinos de Madrid em protesto
O Sindicato dos Inquilinos de Madrid lançou um apelo aos arrendatários para se juntarem numa ação de desobediência civil inédita: a proposta é simples, mas ousada – parar de pagar as rendas aos senhorios como forma de protesto contra o que consideram ser uma crise habitacional insustentável.
“O problema da habitação é demasiado importante para ficar nas mãos dos que estão há anos sem pôr um travão neste sistema que cada dia impede mais gente de ter uma habitação digna”, afirma o Sindicato no comunicado que convoca a manifestação marcada para o próximo domingo, 13 de Outubro. O protesto, que terá lugar em Madrid, entre Atocha e Callao, no coração da cidade, está a ser organizado em colaboração com o Sindicat de Llogateres da Catalunha e visa mobilizar os inquilinos para uma resistência organizada contra os preços exorbitantes que atingem as rendas.
O protesto deste domingo pretende ser “o princípio do movimento que vai baixar as rendas”, segundo os organizadores. A iniciativa central é a #HuelgaDeAlquileres (Greve de Alugueres), uma proposta que vai além de simples manifestações. A ideia é que os inquilinos deixem de pagar as rendas exigidas pelos senhorios até que sejam tomadas medidas concretas para reduzir os preços. “Se uma inquilina se rebela e deixa de pagar, o problema é dela. Mas, se dez mil inquilinos se organizarem para não pagar, o problema é dos senhorios e dos governos que os sustentam”, enfatizam os representantes do Sindicato dos Inquilinos.
Para Javier Gil, investigador e membro ativo do Sindicato dos Inquilinos, a situação actual exige medidas drásticas. Numa publicação no jornal El Salto, Gil apresentou uma proposta alternativa à greve completa de rendas: que os inquilinos passem a pagar aos senhorios um valor que considerem justo, em vez do montante pedido. “O que aconteceria se os inquilinos começassem a desobedecer aos preços dos alugueres, pagando menos aos senhorios como forma de resistência perante a precariedade imposta pelo mercado?”, questiona o investigador, sublinhando que esta forma de desobediência civil tem precedentes históricos e já provou ser eficaz noutras situações.
O especialista recorda greves de arrendatários em vários pontos do mundo, como a de Manhattan em 1907, que envolveu dez mil famílias e resultou na redução da renda para cerca de duas mil dessas famílias. O investigador também menciona casos semelhantes na Argentina, onde, no mesmo ano, um movimento popular conseguiu paralisar o pagamento de rendas por quase três meses. Em Espanha, um movimento semelhante ocorreu em Barcelona, em 1931, demonstrando que a resistência coletiva pode forçar mudanças no mercado de habitação.
Greves de rendas continuam a acontecer em várias partes do mundo, normalmente associadas a condições de habitação deficientes ou à incapacidade de suportar os preços crescentes dos alugueres. Há dois anos, o jornal The Guardian noticiou um caso em Nova Iorque, onde inquilinos organizaram uma greve de rendas para protestar contra as más condições das habitações. A situação foi semelhante em Kansas City, onde dois sindicatos de inquilinos recorreram à mesma estratégia, bloqueando 60 mil dólares em pagamentos de renda até que os senhorios aceitassem negociar, segundo a NPR. “A ideia é criar uma crise financeira ao senhorio, que o force a sentar-se à mesa das negociações”, explicou Tara Raghuveer, diretora de um dos sindicatos.
Medidas para controlar o mercado de arrendamento
Em resposta à pressão crescente sobre o mercado de arrendamento, a Catalunha introduziu, no início de 2024, um limite máximo para o valor das rendas em 140 municípios. De acordo com o jornal Público, Sílvia Paneque, porta-voz do governo regional e conselheira de habitação, afirmou que a medida resultou numa redução de até 5% nos preços médios das rendas. No entanto, o El País reportou que a entrada em vigor desta lei também levou a uma queda no número de novos contratos de arrendamento, um efeito colateral que está a ser analisado pelas autoridades.
A crise habitacional é um problema crescente em várias partes de Espanha. Segundo dados do Idealista, em Setembro, o preço médio do metro quadrado para arrendar em Espanha situava-se nos 13 euros, um aumento de 10,2% em relação ao ano anterior. Portugal, por outro lado, enfrenta uma pressão ainda maior. O mesmo site indicou que o preço médio do arrendamento no país atingiu os 16,3 euros por metro quadrado, acentuando a crise de acessibilidade à habitação.