Germinam sementes de discórdia em Moscovo: Generais de Putin estão a virar-se uns contra os outros
As forças de segurança da Rússia intensificaram recentemente um conjunto de investigações sobre corrupção envolvendo oficiais de alta patente das Forças Armadas. O caso mais recente envolve a prisão do major-general Alexander Ogloblin, antigo responsável pelo departamento de comunicações militares, acusado de corrupção. A detenção de Ogloblin é apenas mais um capítulo numa série de ações contra figuras proeminentes no seio militar, numa aparente tentativa de reafirmar o controlo sobre as forças armadas.
Ogloblin encontra-se atualmente em prisão preventiva, acusado de ter aceitado subornos no valor de 10 milhões de rublos (cerca de 103 mil dólares) de uma empresa de telecomunicações para garantir contratos com o Ministério da Defesa. Segundo informações divulgadas pelo Comité de Investigação da Rússia e citadas pelo jornal Kommersant, este suborno representaria uma parte de um esquema mais vasto de corrupção.
Este é, no entanto, o segundo envolvimento de Ogloblin em processos judiciais. Em fevereiro de 2022, ele foi condenado a quatro anos e meio de prisão por desvio de fundos, mas acabou por ser libertado mais cedo após testemunhar contra Vadim Shamarin, o seu antigo superior e ex-subchefe do Estado-Maior russo. Contudo, a sua nova prisão foi, ironicamente, motivada por declarações de Shamarin, que o denunciou como parte de um acordo de delação. De acordo com o Kommersant, Shamarin admitiu ter dividido um suborno com Ogloblin, recebido da fabricante Perm Telephone Plant Telta, o que despertou especulações de uma possível retaliação contra o antigo subordinado.
O New Voice of Ukraine, numa análise sobre o caso, aventou a hipótese de que Shamarin poderia estar a agir por vingança contra Ogloblin, revelando o esquema de subornos.
A sombra de Shoigu e a pressão sobre o Ministério da Defesa
Embora o antigo ministro da Defesa, Sergei Shoigu, ainda não tenha sido formalmente acusado de corrupção, fontes sugerem que o envolvimento de outros altos oficiais poderá eventualmente implicá-lo. Recentemente nomeado secretário do Conselho de Segurança da Rússia, Shoigu parece estar sob uma crescente vigilância. O Ministério da Defesa britânico afirmou esta semana que as prisões de figuras ligadas a Shoigu sinalizam uma possível “limpeza” interna nas fileiras da defesa. John Foreman, ex-embaixador de defesa britânico em Moscovo, relatou ao Newsweek que a investigação conduzida pelo FSB, a agência de inteligência russa, “progride lentamente, mas de forma constante” no Ministério da Defesa, sugerindo uma pressão crescente sobre Shoigu. “Sempre acreditei que o alvo final era Shoigu, e o mapa de detenções indica que o laço está a apertar-se”, referiu Foreman.
De acordo com Foreman, Shoigu, que completará 70 anos no próximo ano, tem visto a sua influência reduzir-se e encontra-se “bastante isolado” no Conselho de Segurança Nacional, sem a liberdade para trazer a sua própria equipa. Esta posição solitária levanta dúvidas sobre o papel efetivo que Shoigu desempenha atualmente, com Foreman a observar que “será uma boa oportunidade para Putin agradecê-lo pelos serviços prestados”.
Apesar desta onda de detenções, não há sinais de uma purga nas chefias militares diretamente envolvidas no conflito na Ucrânia. Valery Gerasimov, comandante das forças russas na Ucrânia e outro veterano de longa data, também completará 70 anos em breve, mas, segundo Foreman, Putin ainda não demonstrou qualquer intenção de o substituir.
Asfixia de corrupção no topo, mas sem afetar o comando de combate
Andrei Soldatov, investigador do Centro para a Análise de Políticas Europeias, compartilhou com o Newsweek que, até agora, as detenções têm incidido sobre pessoal administrativo do Ministério da Defesa, poupando os generais e oficiais diretamente envolvidos nos combates na Ucrânia. Soldatov acrescenta que as prisões parecem visar a melhoria da cadeia de fornecimento e logística, principalmente para garantir munições e recursos, em vez de responsabilizar os generais por erros no campo de batalha.
Entre os oficiais detidos está Timur Ivanov, vice-ministro da Defesa responsável por grandes projetos de construção, incluindo a reconstrução da cidade ucraniana de Mariupol. Ivanov, de 48 anos, foi preso sob suspeita de aceitar subornos de grande montante, crime que pode levar a uma pena de até 15 anos. Além dele, foram presos o major-general Ivan Popov e o tenente-general Yury Kuznetsov, ambos acusados de aceitar subornos para facilitar contratos de defesa. Em maio, Vladimir Verteletsky, outro funcionário do departamento de aquisições do Ministério da Defesa, foi também acusado de abuso de poder, resultando em prejuízos estimados em mais de 70 milhões de rublos (aproximadamente 776 mil dólares).
Um sinal de reestruturação ou rivalidade interna?
Este aumento nas investigações de corrupção ocorre numa altura em que Vladimir Putin inicia o seu quinto mandato, tendo substituído Shoigu do cargo de ministro da Defesa. A repressão em curso é vista por muitos analistas como uma tentativa de Putin para reafirmar a sua autoridade sobre o Ministério da Defesa e os seus quadros superiores. Outros especulam que pode tratar-se de uma disputa de poder entre o exército e os serviços de segurança, numa altura em que o FSB parece assumir um papel de supervisão sobre o ministério.
De acordo com uma atualização do Ministério da Defesa britânico, as autoridades russas provavelmente não pretendem eliminar a corrupção por completo, mas sim reduzi-la a níveis mais “geríveis”, de modo a minimizar o impacto negativo sobre o funcionamento da defesa.