Gastos públicos, “trabalho escravo” e abusos sexuais da Igreja: Martim Moniz recebe manifestação de protesto contra a realização da JMJ no próximo dia 4
O Martim Moniz vai ser palco, na próxima sexta-feira, a partir das 19 horas, de um manifestação “Sem Papas na Língua” de protesto com os elevados gastos públicos com a Jornada Mundial da Juventude (JMJ). Também os abusos sexuais na Igreja Católica, as posições conservadoras sobre a sexualidade e o facto de terem sido contratados reclusos para a construção dos confessionários em Belém também constam na lista de críticas.
Em declarações à ‘CNN Portugal’, a organização explicou que é composta por um “um grupo de pessoas e coletivos autónomos, onde as decisões são tomadas em coletivo”. “Apesar do esforço de todos os espaços – políticos e mediáticos – para criar um discurso único sobre a receção da JMJ – como se fosse meramente uma celebração religiosa. Não esquecemos que o objetivo deste evento é político, e que é através da ocupação do espaço público que a igreja continua a reafirmar o seu domínio”, sustentam os organizadores.
“A Igreja Católica continua vinculada à construção de poder e, através da intrusão de valores e normas, continua a exercer um controlo social e cultural na nossa sociedade. Os dogmas da religião interferem na construção do poder popular e no poder de decisão das comunidades marginalizadas – ao quererem privar-nos da liberdade e autonomia dos nossos corpos. Com a imposição das suas hierarquias exigem-nos submissão. Mas nós não esquecemos – nós somos a insubmissão”, pôde ler-se no manifesto.
“Nas últimas sete décadas, mais de 4.800 crianças foram abusadas sexualmente no seio da Igreja Católica em Portugal. Essas práticas, que a doutrina cristã aparentemente condena e que seriam punidas dentro e fora da igreja, e que são comprovadamente factuais, envolvem todo um secretismo quase impossível de penetrar”, acusaram.
As redes sociais têm sido o ‘palco’ dos maiores protestos da sociedade civil – no Twitter surgiu uma recolha de fundos para um outdoor que lembrasse os abusos sexuais na Igreja Católica, que deverá agora ser colocado na Segunda Circular, em Lisboa.
O dinheiro investido no evento tem merecido diversas críticas – é expectável que seja um valor acima dos 90 milhões. Dinheiro que, apontam os críticos, faz falta em áreas como educação, saúde, habitação, transportes e urbanismo em benefício dos cidadãos. O artista Bordalo II colocou uma passadeira feita de gigantes notas de 500 euros no altar-palco do Parque Tejo: chamou-lhe “Walk of Shame” e na legenda pôde ler-se: “Num estado laico, num momento em que muitas pessoas lutam para manter as suas casas, o seu trabalho e a sua dignidade, decide investir-se milhões do dinheiro público para patrocinar a tour da multinacional italiana.”
Os “Sem Papas na Língua” acusaram a “ocupação do espaço público por parte da igreja, com o apoio da Câmara Municipal de Lisboa com pelo menos 40,2 milhões de euros. Enquanto isto acontece, as pessoas continuam sem habitação digna e os pobres continuam pobres, a dormir nas ruas – mais ou menos escondidos do público”.
Por último, a contratação de reclusos para a construção dos confessionários em Belém – o presidente da Fundação JMJ, Américo Aguiar, considerou “particularmente simbólico que os confessionários que vão ser usados numa cerimónia de reconciliação, que significa libertação, tenham sido produzidos por homens que estão temporariamente longe da sua liberdade”. Visão diferente tem a associação ‘Vozes de Dentro’, de familiares de reclusos, que vai estar presente no Martim Moniz no próximo dia 4, para denunciar um regime de “trabalho escravo” – os reclusos dos estabelecimentos prisionais de Coimbra, Porto e Paços de Ferreira receberam apenas dois ou três euros por dia de trabalho.