Europa prepara-se silenciosamente para a III Guerra Mundial contra a Rússia

“A Rússia está a preparar-se para uma guerra com o Ocidente”, denunciou Bruno Kahl, chefe do serviço de inteligência estrangeira da Alemanha, no final de novembro último. Face aos diversos alertas sobre uma possível guerra com a Rússia a uma distância de poucos anos, os membros europeus da NATO já começaram a preparar terreno para a defesa, caso as tropas russas pisem solo da aliança atlântica. No entanto, alertou o responsável, não é provável um ataque de larga escala ao território da NATO – Moscovo pode optar por uma incursão limitada ou aumentar as suas táticas de guerra híbrida para ‘sondar’ a NATO, apontou Kahl.

Porém, a NATO está a preparar-se para ambos os cenários: uma guerra total e técnicas menos óbvias projetadas para minar a estabilidade nos países membros da aliança. “Há várias opções para a Rússia testar a coesão da aliança”, incluindo apropriações limitadas de terras, sustentou o ex-chefe do Corpo Multinacional Nordeste da NATO, baseado no noroeste da Polónia, o tenente-general Jürgen-Joachim von Sandrart, citado pela revista ‘Newsweek ‘, pouco antes de deixar o seu posto em novembro.

A urgência é agora óbvia para altos oficiais militares e políticos: Andrius Kubilius, comissário de Defesa da União Europeia, indicou em setembro que os ministros da Defesa e os comandantes da NATO “concordaram que o presidente russo Vladimir Putin pode estar pronto para o confronto com a NATO e a UE em seis e oito anos”.

Segundo o serviço de inteligência estrangeira da Estónia, num alerta avançado em fevereiro último, a NATO “poderia enfrentar um exército de massa de estilo soviético na próxima década” se a Rússia reformasse com sucesso as suas Forças Armadas – embora “tecnologicamente inferior” as forças da NATO em várias áreas, exceto na guerra eletrónica e ataques de longo alcance, mas “com um potencial militar significativo”. “Se levarmos essas avaliações a sério, então é hora de nos prepararmos adequadamente, e é uma hora curta”, apontou Kubilius, à agência de notícias ‘Reuters’. “Isso significa que temos de tomar decisões rápidas e ambiciosas.”

Por toda a Europa, a NATO agora batalha para aumentar os gastos com Defesa além dos 2% do PIB solicitados – mas não impostos – pela aliança militar. As nações europeias comprometeram-se a atingir ou exceder a meta, acreditando-se que a nova Administração Trump intensifique a pressão sobre a Europa para aumentar os gastos militares.

Os países do flanco oriental da NATO estão muito à frente neste propósito, embora não se saiba ainda quão rápido a Europa será capaz de aumentar os gastos. Mas já há sinais visíveis de preparativos por toda a Europa, particularmente marcantes nos países mais próximos das fronteiras da Rússia.

O presidente sérvio Aleksandar Vucic referiu, em julho, que a NATO “não estava pronta agora” para uma possível guerra com a Rússia, mas que “estará pronta” no futuro. “Já estão a preparar-se para um conflito com a Federação Russa e estão a preparar-se muito mais rápido do que algumas pessoas gostariam de ver, em todos os sentidos”, salientou. “Sabemos disso pelos preparativos militares. Sabemos como estão a ser conduzidos. E quero dizer-vos, estão a preparar-se para um conflito militar.”

É o caso da Alemanha, que começou a elaborar planos sobre como Berlim protegeria edifícios e instalações importantes no caso de um ataque, e como a Alemanha seria um canal para centenas de milhares de soldados que se dirigem mais para o leste da Europa, informou o jornal diário alemão ‘Frankfurter Allgemeine Zeitung’ em novembro.

Linha de Defesa do Báltico

Os três estados bálticos, Letónia, Lituânia e Estónia, assinaram um acordo em janeiro deste ano para reforçar a proteção ao longo das suas fronteiras terrestres com a Rússia e a Bielorrússia. “Estamos a realizar esse esforço para que o povo da Estónia se possa sentir seguro, mas se o menor risco surgir, estaremos prontos para vários desenvolvimentos mais prontamente”, disse o ministro da Defesa local, Hanno Pevkur. Tallinn disse que haveria uma “rede de bunkers, pontos de apoio e linhas de distribuição” ao longo da fronteira.

O Ministério da Defesa da Lituânia indicou, no início de setembro, que “montou um bloqueio” na ponte de Panemunè e nas proximidades, o assentamento fronteiriço lituana que liga o país da NATO a Kaliningrado – Vilnius disse que havia instalado minas e outras defesas, como dentes de dragão, contra tanques e veículos blindados. “Esta é uma medida de precaução para garantir uma defesa mais eficaz”, disse o Governo da Lituânia.

O vizinho da Lituânia ao norte, a Letónia, colocou defesas semelhantes em prática. O Governo letão disponibilizou 303 milhões de euros para a construção de defesas na sua fronteira oriental com a Rússia ao longo de cinco anos: haverá postos avançados para pessoal de apoio, estruturas reforçadas, trincheiras antitanque e depósitos de armazenamento para munição e minas, apontou Riga. “Seremos capazes de desacelerar e bloquear o movimento de potenciais agressores de forma mais eficiente”, disse o ministro da Defesa letão, Andris Spruds.

Mais a sul, olhando para Kaliningrado e a Bielorrússia, a Polónia iniciou a construção do que chamou de “Escudo Oriental”, que custou mais 2,5 mil milhões de dólares, que foi descrito por Varsóvia como “a maior operação para fortalecer a fronteira oriental da Polónia, o flanco oriental da NATO, desde 1945”.

“Os investimentos da Polónia têm sido uma mistura de construção de capacidades defensivas e ofensivas, projetadas para dissuadir a Rússia, convencendo-a de que qualquer ataque não atingiria os seus objetivos e teria um custo muito alto”, sustentou William Freer, investigador em segurança nacional no think tank ‘Council on Geostrategy’, sediado no Reino Unido. “As fortificações da Polónia baseiam-se nas lições da luta na Ucrânia, que mostraram o quão difícil é passar por defensores fortemente entrincheirados”, referiu Freer. “Combinado com fortificações tradicionais, como dentes de dragão, ‘East Shield’ fará uso de um conjunto de sistemas de guerra eletrónica e vigilância.”

Planos de evacuação em massa

Os preparativos não são apenas militares, são igualmente civis. Em meados de novembro, o mais novo membro da NATO, a Suécia, publicou um folheto para os cidadãos do país a “aprender como se preparar e agir em caso de crise ou guerra”. O folheto descreve o que significaria um estado de alerta elevado, como cada habitante se empenharia no esforço de guerra. “Os níveis de ameaça militar estão a aumentar”, referem os responsáveis suecos. “Devemos estar preparados para o pior cenário possível — um ataque armado à Suécia.”

A Noruega também publicou um folheto sobre como lidar com “condições climáticas extremas, pandemias, acidentes, sabotagem e, no pior dos casos, atos de guerra”. A Finlândia tem guias disponíveis ao público sobre como se preparar para “a pior ameaça possível: a guerra”.

Defesas Aéreas

Em janeiro, os estados bálticos também enfatizaram a necessidade que sentiam de construir defesas aéreas da NATO no flanco oriental, de acordo com um comunicado do Governo letão.

O ministro da Defesa da Hungria, Kristof Szalay-Bobrovniczky, disse em novembro que Budapeste instalará um sistema de defesa aérea na região nordeste do país. “Ainda confiamos que haverá paz o mais breve possível, por meio da diplomacia em vez de uma solução militar”, disse. “No entanto, para nos prepararmos para todas as possibilidades, ordenei que os sistemas de controlo aéreo e defesa aérea recentemente adquiridos e as capacidades construídas sobre eles fossem instalados no nordeste.”

A Europa tem uma escassez crónica de defesas aéreas, embora autoridades militares e políticas tenham evitado fornecer detalhes.

Leste versus oeste

Enquanto a Polónia, os países bálticos, a Finlândia e a Suécia, assim como a Roménia, que faz fronteira com a Ucrânia ocidental, aumentaram significativamente o investimento em defesa, a Europa Ocidental está ficando para trás.

“Não é coincidência que os maiores aumentos em gastos de defesa na NATO estejam a vir daqueles mais próximos da Rússia”, referiu Freer. “Atrás do flanco oriental da NATO, outros aliados estão a agir com menos urgência e têm-se mostrado muito menos dispostos a aumentar o investimento no mesmo nível.”

Os países da Europa Ocidental estão, no entanto, a tomar “algumas medidas significativas”, acrescentou Freer. Os países da aliança procuram soluções sobre como melhorar as capacidades integradas de defesa aérea e de mísseis da NATO, tirando lições da ‘martelada’ da Rússia na Ucrânia.

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