Esqueceu-se de pagar as amêijoas no restaurante? Cientistas descobrem alga que causa perda de memória ‘escondida’ em marisco e peixe
Investigadores identificaram duas espécies tóxicas de microalgas marinhas em amostras de mariscos provenientes de explorações agrícolas nas Filipinas, gerando preocupações para as comunidades costeiras que dependem deste sector. Estas descobertas, detalhadas num estudo publicado na revista científica Diatom Research, chamam a atenção para a necessidade de monitorizar as toxinas em produtos do mar e os potenciais riscos para a saúde pública.
As Filipinas, o 11.º maior produtor de mariscos do mundo, contribuem com mais de quatro milhões de toneladas anuais para o mercado global. As águas tropicais que banham o arquipélago são uma fonte rica de biodiversidade e alimento, especialmente para as comunidades locais. Contudo, a descoberta de diatomáceas tóxicas nas áreas de cultivo ameaça este equilíbrio.
As diatomáceas são algas unicelulares que formam estruturas de sílica cristalina, desempenhando um papel essencial na cadeia alimentar marinha e na produção de oxigénio do planeta. Entre milhões de espécies conhecidas, 28 pertencentes ao género Pseudo-nitzschia destacam-se pela capacidade de produzir ácido domóico, um neurotóxico perigoso para o consumo humano.
O ácido domóico pode acumular-se em moluscos, sardinhas e anchovas, todos eles alimentos comuns que consomem estas algas. Embora seja raro que mariscos contaminados cheguem ao consumo humano, o aumento das floras algais causado por atividades humanas torna o risco mais frequente. Os efeitos deste composto variam de vómitos e diarreia a amnésia permanente e morte.
Em 1987, no Canadá, uma tragédia em Prince Edward Island resultou na morte de três pessoas e hospitalização de pelo menos 100, após o consumo de mexilhões contaminados com ácido domóico. Este episódio, conhecido como intoxicação amnésica por mariscos, realçou a necessidade de vigilância rigorosa, prática comum em muitos países desde então.
O estudo liderado por investigadores das universidades Ateneo de Manila e Universiti Malaysia Sarawak sublinha que a vigilância ainda é insuficiente nas Filipinas. A pesquisa analisou amostras de água do mar e mariscos de duas zonas de cultivo na ilha de Luzon, a região mais densamente povoada do país, onde os mariscos são uma base da dieta local.
Os investigadores identificaram 15 estirpes do género Pseudo-nitzschia, incluindo as espécies Pseudo-nitzschia pungens e Pseudo-nitzschia brasiliana, ambas produtoras de ácido domóico. Esta foi a primeira vez que P. brasiliana, amplamente distribuída nos trópicos, foi detetada em Luzon, especificamente na Baía de Pagbilao.
Em estudos anteriores, níveis de ácido domóico quatro vezes superiores ao limite seguro já haviam sido encontrados em tecidos de mariscos na Baía de Masinloc, também em Luzon. Os investigadores apontaram ainda um caso em 2023, quando uma flora algal múltipla foi registada na região de Pangasinan.
A contaminação em mariscos é uma ameaça séria, especialmente para comunidades que dependem destas fontes de alimento. “É importante reconhecer o potencial tóxico destas diatomáceas e monitorizá-las de forma adequada”, afirmaram os autores.
Os resultados desta pesquisa podem ser um primeiro passo para melhorar a monitorização de floras algais nocivas nas Filipinas e prevenir novos surtos de intoxicação amnésica por mariscos.
A implementação de práticas de vigilância mais rigorosas é crucial para mitigar os riscos associados a estas toxinas e proteger a saúde das comunidades costeiras, bem como a sustentabilidade do sector pesqueiro.