Espanha recebe centenas de portuguesas grávidas com mais de 10 semanas para abortar

Em 2023, 530 mulheres grávidas atravessaram a fronteira entre Portugal e Espanha para abortar, beneficiando do facto de a lei espanhola ter prazos mais alargados para a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG).

‘Maria Andrade’ (nome fictício) foi um desses casos: soube que estava grávida quando já passavam mais de quatro semanas. Aos 37 anos, esta mãe de um filho de 9 anos decidiu, às 18 semanas, fazer o aborto. “Portugal está fora de questão”, disse-lhe a médica de família. A opção por Espanha surgiu após um pedido de ajuda à Associação de Planeamento Familiar de Lisboa. O contacto com a clínica Guadiana Los Arcos, em Badajoz, abriu uma solução. “Eles começaram automaticamente a falar português com uma simpatia e disponibilidade que acaba por ser importante em momentos como este”, indicou.

Lá foi informada que poderia fazer a IVG até às 20 semanas, apesar de em Espanha o procedimento sem justificação médica só ser possível até às 14. Seria uma IVG cirúrgica, pelo que precisaria de se deslocar duas vezes. Não precisava de levar ecografias. Na primeira ida, datou a gravidez e teve uma consulta com um psiquiatra. A cirurgia ficou marcada para dois dias depois, às 8 horas. Levou amigas que conduzissem por ela. Só se lembra de ter acordado e ter sentido um alívio a invadi-la. “250 quilómetros fazem-me mais dona do meu corpo.” Depois, “foi pagar e vir embora” – 1.900 euros.

‘Maria Andrade’ faz parte das 439 mulheres que no ano passado foram de Portugal à clínica Guadiana para uma IVG e que correspondem a 27% do total de intervenções ali realizadas. A maioria das portuguesas (64%) tinha um tempo gestacional entre as 10 e as 14 semanas. Mas nesta clínica de Badajoz, a apenas seis quilómetros da fronteira, também há quem faça IVG com mais tempo de gestação, já que a lei espanhola permite a interrupção até às 22 semanas por causas médicas, quando está em causa a saúde física ou psíquica da grávida. Os preços começam nos 1.200 euros e vão subindo. Por cada semana a mais de gestação, mais uma centena de euros. E nos últimos cinco anos o número de portuguesas por ano nunca foi menos de 300.

De acordo com dados do Ministério da Saúde espanhol, 1.171 mulheres de outros países da União Europeia e não residentes em Espanha realizaram IVG no país – não se sabe o universo de portuguesas. No entanto, dos países que fazem fronteira com Espanha, Portugal permite IVG até às 10 semanas, e em França estende-se até às 16.




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