Eleições: “Nem todos os partidos políticos apresentam propostas específicas para as micro e pequenas empresas”, diz Paulo Lima

Estamos a menos de duas semanas das eleições legislativas. No próximo dia 10 de março, os portugueses dirigem-se às urnas para eleger o novo governo, e há muitos temas que são cruciais conhecer por parte dos partidos políticos.

A Executive Digest falou com Paulo Lima, cofundador e co-CEO da Matoaka, marketplace para compra e venda de micro e pequenas empresas, para perceber as propostas dos diferentes partidos em relação ao apoio a estas empresas, e o que falta ser feito.

 

Quais os principais desafios enfrentados pelas micro e pequenas empresas atualmente e o que acha que os partidos políticos devem fazer para as ajudar a enfrentá-los?

As micro e pequenas empresas são fundamentais para a economia portuguesa, representando 99,1% do tecido empresarial nacional, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), e contribuindo com 65,5% do emprego, de acordo com a Informa D&B. Apesar da sua relevância no dinamismo económico e na sociedade portuguesa, estas organizações enfrentam diversos obstáculos que limitam o seu crescimento e desenvolvimento.

Alguns desses desafios incluem dificuldades na gestão de tesouraria, que resultam, por um lado, dos atrasos nos recebimentos dos clientes – em Portugal cerca de 66,6% das empresas atrasam os seus pagamentos mais de 30 dias – e, por outro, da falta de apoio financeiro, ao qual acresce a elevada carga fiscal.

Paralelamente, assistimos neste momento a um elevado número de empresas familiares a passar para a segunda ou terceira geração, muitas vezes sem a literacia financeira ou vontade de dar continuidade aos negócios.

Estes desafios resultam no receio de arriscar e fazer crescer o negócio. Se por um lado, os pagamentos dos impostos aumentam a receita do Estado, por outro, estrangulam a tesouraria das micro e pequenas empresas que, por sua vez, perdem a sua capacidade de investir em novos recursos, nos seus trabalhadores ou mesmo no reforço das suas equipas.

Para fazer face a estes desafios muito específicos, é fundamental, primeiramente, o reconhecimento da importância das micro e pequenas empresas para a economia nacional, e a adoção de políticas e medidas focadas neste segmento que tenham em consideração as dificuldades financeiras, a gestão das pessoas e acima de tudo que garantam a sua continuidade, promovendo um crescimento e desenvolvimento sustentável deste segmento empresarial.

 

Como avalia as propostas dos diferentes partidos em relação ao apoio às micro e pequenas empresas? Há alguma que considere particularmente eficaz?

Nem todos os partidos políticos apresentam propostas específicas para as micro e pequenas empresas, apesar da sua significativa contribuição para o país. A maioria dos programas centra-se nas médias e grandes empresas, ignorando os desafios e necessidades específicas deste segmento. Na sua maioria, tanto à esquerda como à direita, as propostas são muito focadas no IRC, com descidas da taxa ou o aumento para as grandes empresas.

Entre as medidas propostas são benéficas as que facilitam a diminuição de burocracia e a facilitação de acesso a investimento, as que criam regimes de grupos de IVA que permitem a consolidação do imposto em contexto de grupo, ou as medidas que promovem a transição geracional das empresas familiares e criam incentivos para a reestruturação, aquisição ou fusão de empresas.

Ao tomar estas medidas, o novo governo estará a contribuir para a criação de um ambiente mais propício ao crescimento e à sustentabilidade das micro e pequenas empresas, o que trará benefícios para toda a sociedade portuguesa.

 

Que tipo de políticas ou iniciativas os partidos deveriam adotar para apoiar o crescimento e desenvolvimento das micro e pequenas empresas?

De acordo com os principais desafios das micro e pequenas empresas, é fundamental a criação de medidas que revitalizem a tesouraria, através, por exemplo, de programas de subsídios, empréstimos e incentivos fiscais direcionados e à medida deste segmento.

Simultaneamente, o atual sistema fiscal é bastante rígido e penalizador, o que asfixia a capacidade de investimento e crescimento das empresas. A implementação de políticas que modulem os impostos com base nos ciclos anuais de rendimento das empresas poderia ser uma solução viável, permitindo que o ajuste de contas seja feito no final do ano, de modo a que os impostos sejam pagos apenas sobre os lucros efetivamente obtidos. Face aos atrasos nos recebimentos registados na maioria das empresas, deveria ser também valorizado o pagamento do IVA após boa cobrança.

Com vista a uma maior promoção de emprego e também ao desenvolvimento sustentável destas empresas, a redefinição dos contratos de trabalho para condições mais flexíveis é essencial, pois permite ajustar a força de trabalho às flutuações das suas faturações e das suas ambições de crescimento. Esta flexibilidade laboral deve ser equilibrada com a proteção dos direitos dos trabalhadores, requerendo uma abordagem legislativa cuidadosa que facilite a adaptação das empresas sem comprometer a segurança do emprego.

 

Existe modelo internacional que considere que os partidos políticos poderiam considerar ao elaborar as suas políticas de apoio a estas empresas?

Analisar políticas de apoio a micro e pequenas empresas noutros países pode ser importante para os partidos políticos em Portugal, sobretudo nas iniciativas que já têm resultados que nos permitem avaliar a sua viabilidade.

Por exemplo, em Itália, há uma amortização acelerada para investimentos em ativos fixos de pequenas empresas, o que permite uma recuperação mais rápida do investimento, melhorando a liquidez e facilitando o reinvestimento.

Na Suécia, um regime simplificado de IVA facilita a gestão financeira das empresas. O pagamento anual do IVA, em vez de mensal ou trimestral, reduz a carga administrativa e burocrática.

Já na Finlândia, leis de trabalho mais flexíveis permitem que as pequenas empresas gerenciem melhor as suas necessidades de mão de obra e se adaptem rapidamente às mudanças do mercado.

Na Alemanha, o KfW (Banco de Desenvolvimento) oferece empréstimos com juros baixos e garantias governamentais para startups e PMEs que precisam de capital para expandir as suas operações ou inovar.

Ao adaptar essas medidas à realidade local e às necessidades específicas das micro e pequenas empresas portuguesas, os partidos políticos podem criar políticas de apoio mais eficazes que potenciem o desenvolvimento sustentado das micro e pequenas empresas.

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