“Efeito spoiler”: Como um punhado de votos nos candidatos independentes e partidos pequenos pode influenciar as eleições nos EUA
À medida que se aproxima a eleição presidencial nos Estados Unidos, marcada para 5 de novembro, um fenómeno bem conhecido no sistema eleitoral americano ganha destaque: o “efeito spoiler”. Este termo, utilizado para descrever o impacto de candidatos independentes ou de partidos minoritários que, sem qualquer possibilidade real de vencer, podem alterar drasticamente o resultado final ao desviar votos dos principais partidos, está novamente em evidência.
Apesar da tradicional luta bipartidária entre o Partido Democrata e o Partido Republicano, estes candidatos menores — muitas vezes vistos como sem expressão — têm potencial para influenciar o desfecho de uma eleição, sobretudo em estados decisivos. Exemplos do passado, como o de Ralph Nader em 2000 e Jill Stein em 2016, continuam a ser lembrados como exemplos de spoilers que, ao captarem uma pequena percentagem dos votos, podem ter desfeito as expectativas de grandes partidos.
O efeito spoiler: um jogo de poucos votos
O caso de Ralph Nader, candidato do Partido Verde nas eleições de 2000, continua a ser um dos exemplos mais citados do efeito spoiler. Nader obteve 97.488 votos no estado da Florida, onde a diferença entre o democrata Al Gore e o republicano George W. Bush foi de apenas 537 votos. Este número foi suficiente para que Bush ganhasse a presidência, em meio a um processo eleitoral controverso. Nader, por não ter qualquer hipótese de vencer, foi acusado de ter prejudicado a campanha democrata, ao captar votos que poderiam ter ido para Gore.
Nas eleições de 2024, um novo grupo de candidatos independentes e de partidos menores surge com potencial para influenciar os resultados em estados-chave. Embora estes candidatos não estejam nem perto de ter a popularidade necessária para vencer, podem captar uma pequena fatia do eleitorado que poderia ser decisiva num cenário de disputa renhida entre Kamala Harris, a candidata democrata, e Donald Trump, o candidato republicano.
Entre os candidatos minoritários que podem desempenhar o papel de spoilers em 2024, destacam-se três figuras: Chase Oliver, Cornel West e Jill Stein. Chase Oliver, do Partido Libertário, é um nome a ter em conta, sobretudo no estado da Geórgia. Em 2022, Oliver conseguiu forçar uma segunda volta nas eleições para o Senado ao obter 2,1% dos votos. Apesar de parecer um número pequeno, cerca de 80 mil votos podem fazer uma diferença significativa em estados onde as margens de vitória são muito apertadas. Em 2020, Joe Biden venceu Donald Trump na Geórgia por menos de 12 mil votos, o que realça o potencial impacto de Oliver este ano.
Cornel West, filósofo e ativista dos direitos civis, também se apresenta como um candidato independente com uma plataforma centrada na justiça social. Contudo, o apoio a West é muito limitado, e ele figura nas listas eleitorais de apenas três dos sete estados-chave, o que diminui o seu impacto geral. Por outro lado, Jill Stein, candidata do Partido Verde e veterana no papel de spoiler, pode ser uma ameaça maior, especialmente em estados como Michigan, onde o eleitorado árabe-americano, crítico do apoio da administração Biden a Israel, pode ser influenciado pela posição pró-palestina de Stein.
Em 2016, Stein conseguiu mais votos em Wisconsin do que a diferença entre Donald Trump e Hillary Clinton, o que muitos democratas acreditam ter sido decisivo para a derrota de Clinton. Este ano, o Partido Democrata não quer correr o mesmo risco e já lançou várias campanhas publicitárias contra Stein em estados como Wisconsin, Pensilvânia e Michigan.
Os democratas estão particularmente preocupados com a possibilidade de que os votos em candidatos de partidos menores possam favorecer Donald Trump. Cada voto que não vá para Kamala Harris é visto como uma possível vantagem para o ex-presidente republicano. Rahna Epting, diretora executiva do grupo ativista liberal MoveOn, sublinhou a gravidade da situação: “A corrida presidencial pode muito bem ser decidida por alguns milhares de votos em alguns estados. Estes candidatos de terceiros partidos continuam a ser uma grande ameaça neste ciclo eleitoral.”
Bernard Tamas, professor de ciência política na Universidade Estadual de Valdosta, especializado em partidos minoritários na política dos EUA, explicou que, para que um candidato de terceiro partido seja considerado um spoiler, “ou tem de ter uma quantidade significativa de apoio, ou a eleição tem de ser extraordinariamente renhida”. A eleição de 2024, nas suas palavras, “pode ser extremamente próxima nos estados decisivos”.
Com a corrida presidencial a aproximar-se rapidamente e a possibilidade de um desfecho apertado, os partidos principais estão a redobrar esforços para evitar surpresas de última hora. O receio de que um pequeno número de votos possa mudar o curso da eleição está a levar os democratas, em particular, a intensificar as campanhas contra os candidatos independentes.
Com apenas semanas para as eleições, o impacto dos candidatos independentes continua a ser uma incógnita. Embora nenhum deles esteja perto de conseguir vencer, o seu papel como spoilers nas urnas não pode ser subestimado. Numa eleição tão dividida, bastam alguns milhares de votos nos estados decisivos para alterar completamente o rumo da história.
O “efeito spoiler” pode não decidir a eleição, mas certamente tem o potencial de fazer balançar o equilíbrio do Colégio Eleitoral e, com isso, o futuro político dos Estados Unidos. Afinal, numa disputa tão acirrada, como a que se antevê entre Harris e Trump, nada pode ser dado como garantido até ao último voto ser contado.