“É um líder que pode provocar o maior impacto na mudança de uma empresa”, afirma especialista Laila Pawlak

Os desafios da liderança colocam-se hoje, mais do que nunca, em constante discussão devido ao ritmo vertiginoso a que o mundo avança. O SingularityU Portugal Summit: Supermassive terminou na sexta-feira na Nova SBE onde foi debatido o futuro dos negócios e das lideranças.

Em entrevista à ‘Executive Digest’, Laila Pawlak, especialista em Impact Leadership e Experiências do Cliente, explicou o conceito de liderança de impacto e apontou aquelas que considera serem as principais características que este tipo de líder deve ter, assim como os seus principais desafios.

 

Tendo em conta que é uma especialista em “Impact Leadership”, o que significa exatamente o conceito?

No início, falava-se muito sobre gestores e gestão e não tanto sobre liderança e acho que aquilo que estamos realmente a ver com a transição de como trabalhamos, por causa da pandemia, por causa de tudo o que se está a passar no mundo, a crise climática e muitos fatores geopolíticos que estão a impactar os nossos negócios e todos os desafios que estão a acontecer no mundo, já não é suficiente ser apenas um gestor e dizer às pessoas onde queremos ir.

Também por causa da ‘Great Resignation’ é difícil conseguir pessoas que querem realmente trabalhar para nós. Temos visto muitas pessoas insatisfeitas com o seu trabalho.

Por isso, a gestão é um pouco ‘old school’ de certa forma e nós acabámos por passar não só para a liderança, mas para uma liderança de impacto.

Recentemente, fizemos um estudo bastante significativo no Rehumanize Institute, a minha organização, em conjunto com a Accenture. O que descobrimos foi que, olhando para o futuro da liderança e dos negócios responsáveis, algumas organizações, cerca de 25%, são aquilo a que chamamos líderes de negócios responsáveis, são os negócios que fazem mais na agenda dos negócios responsáveis, como por exemplo sustentabilidade, diversidade, inclusão.

Depois, concluímos há outros 25% que são os que ficaram para trás, as organizações que não seguem tanto essa agenda.

E o que descobrimos é que, aparentemente, há uma correlação entre as empresas mais responsáveis e os resultados financeiros. Descobrimos que esses dois grupos são a diferença entre um crescimento das receitas 14 vezes superior e um lucro operacional quatro vezes superior. Isto é muito dinheiro. Por isso significa que compensa ser um negócio responsável.

O que também descobrimos, e é aqui que aparece a liderança de impacto, é que descobrimos quatro pilares que estas empresas trabalham muito bem, em comparação com as que ficaram para trás. A primeira é o facto de serem muito boas com o seu ecossistema, com os seus clientes, os seus vendedores, os ecossistemas melhoram a indústria.

A segunda tem a ver com alvos, estas empresas definiram objetivos, como por exemplo mais mulheres na administração, em cargos de liderança, livres de gases de efeito de estufa em x anos.

Depois, também demonstram que percebem o que se vai passar no futuro, quais são as tendências. Investem muito na educação, na descoberta do que vai acontecer e usam esses dados a seu favor.

Mas o último e mais importante fator para uma organização para a transição para um negócio responsável são os líderes. De longe. É um líder que pode provocar o maior impacto na mudança de uma empresa de uma “lagger” para uma um negócio responsável líder. E, consequentemente, ter a oportunidade de ver o negócio crescer significativamente. Tanto em termos financeiros, devido à correlação que mencionei, mas também na criação de novos produtos inovadores que são sustentáveis e são aquilo que os clientes procuram.

Por isso, a liderança de impacto é sobre perceber a importância e o poder que alguém como um líder tem na realidade para mudar a organização. É surpreendente a quantidade de líderes que não podem mudar certas coisas porque têm uma administração, ou outras razões. A forma mais fácil de desistir do poder é achar que não o temos e é o maior diferenciador na forma como as organizações mudam a forma como fazem as coisas.

 

Quais são as principais competências que acha que esse tipo de líder deve ter?

Gostaria de falar sobre as coisas que somos capazes de dominar em vez de serem necessariamente apenas competências, porque acho que vai para além das competências. Para mim, estas estão mais relacionadas com, por exemplo, conhecer o Excel e saber mexer na aplicação.

Para um líder de impacto, uma das coisas mais importantes que devemos ser capazes de dominar é ser capaz de construir relações e isso significa ser capaz de comunicar, ser capaz de passar a mensagem, ser capaz de se relacionar, ser capaz de ser empático, porque assim percebemos qual a situação dos clientes, do ecossistema, porque é que os funcionários não querem fazer o que quero que façam.

Quando dominamos a arte de ser bons a construir relações, dominamos várias competências.

Tendo em conta que o mundo está a mudar tão depressa, a tecnologia está a acelerar tão rápido, e a aceleração da aceleração também está a acelerar, o que parece de loucos, as coisas com os clientes também estão a mudar tão rápido, que os empregadores não estão a conseguir mudar e adaptar os seus sistemas e infraestruturas rápido o suficiente para acompanhar a procura e a agilidade que é precisa.

Portanto aquilo que precisamos realmente é de ser capazes de captar sinais e percebê-los. Não chega ler uma análise de tendências porque esta tem como base várias investigações que já fizemos de uma realidade que já existe. Temos de nos preparar e analisar o futuro antes de este chegar. Isso significa que temos de sair da nossa própria indústria e reunir com outras pessoas, especialistas de outras indústrias, porque as tecnologias estão a convergir, mas as indústrias também estão. Isso também significa novos concorrentes, novos tipos de indústrias.

A última coisa que vou mencionar é o facto de ser importante ter uma boa conexão com a própria bússola moral e ter a certeza que isso está alinhado com a da organização, porque as empresas hoje, que são negócios responsáveis, têm vantagem competitiva. No futuro, ser este tipo de empresa vai ser imperativo, o que significa que se não é um negócio responsável, vai ser castigado e não ser recompensado, como hoje, por ser um, porque será imperativo, esperado, que haja total transparência de como são feitos os produtos.

Também é importante tomar decisões éticas, vimos muito isso, por exemplo, com a guerra na Ucrânia, de muitas empresas e muitos líderes. Não eram necessariamente as empresas que acabavam nas notícias por não terminarem os negócios na Rússia, eram os líderes das empresas que eram mencionados por não se retirarem e não seguirem os princípios morais da sua base de clientes.

Mas esta linha ética não é clara e, como líderes, temos de ser capazes de criar os limites éticos, como queremos alavancar estes dados, como queremos fazer todas estas coisas diferentes. Portanto será um aspeto muito importante para os líderes no futuro e muitos vão ser despedidos pela falta disso no futuro, de certeza, alguns já foram.

 

Quais são os desafios atuais da liderança de impacto?

Atualmente há preços da energia incrivelmente elevados, desafios nas cadeias de fornecimento e há uma guerra na Europa, crises climáticas em muitos países.

Há o desafio de as coisas que sabemos que precisamos de fazer, por exemplo a transição climática, trazem lucros de curto prazo ou custos de curto prazo que ofuscam essas necessidades.

Por isso o maior desafio de um líder atualmente, para além do facto de ser difícil contratar funcionários, é o facto de sabermos que existem coisas que precisamos de fazer, mas no curto prazo ser muito difícil seguir em frente com essas necessidades, especialmente se formos uma empresa cotada em bolsa ou que tenha uma administração à qual precise de responder.

É este o dilema que muitos líderes me têm dito estar a enfrentar. É o mesmo dilema das necessidades de curto e longo prazo. Não é um novo dilema, mas continua a ser um.

 

Acha que os líderes de atualmente estão a deixar cada vez mais o seu impacto nas pessoas, nos seus funcionários?

É muito difícil generalizar o conceito de liderança porque há muitos líderes diferentes em todo o mundo, na verdade somos todos diferentes, nenhum de nós é igual.

Mas o que acho é que o poder dos funcionários tem força, e por isso os líderes têm de elevar a fasquia, porque são os funcionários que trabalham e se não tivermos ninguém a trabalhar para nós, temos um problema de liderança. E neste momento a “Great Resignation”, as demissões silenciosas (‘quiet quitting’), onde as pessoas se despedem mentalmente, mas fazem o mínimo para manter o salário, e muitos outros desafios.

As pessoas já não estão para se chatear. E não são só as pessoas bem pagas. Mesmo as que recebem o salário mínimo, dizem que não querem passar o resto da vida a fazer algo que não gostam. A Covid acelerou este pensamento porque nos deu a oportunidade de ver uma vida diferente, de nos ver a passar mais tempo em família, de nos ver com mais tempo livre e fazer as coisas e o trabalho de forma diferente.

Por isso, por causa do poder dos funcionários, que está a aumentar por causa das redes sociais, os líderes têm de elevar a fasquia, porque são a principal razão para alguém sair de uma empresa. Em termos de satisfação de funcionários, a liderança é o parâmetro principal. Não é a razão pela qual entram na empresa, mas pode a principal razão para saírem.

 

Pensando no futuro, quais serão os maiores desafios dos líderes em 2023?

Vamos continuar a ter dificuldades de recrutamento, acho que vamos ter muitos líderes com dificuldades com uma potencial recessão. Acho que ainda vamos ter muitas empresas ainda afetadas pela guerra na Ucrânia e problemas nas cadeias de fornecimento e preços da energia muito elevados. São os fatores principais.

Adoraria que existissem outros desafios, mas em apenas um ano, infelizmente acho que serão estes os principais.

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