E agora Portugal? “Temos de melhorar a nossa competitividade fiscal”: Nuno Botelho, Presidente da Associação Comercial do Porto

Na sua opinião, quais deviam ser as prioridades do novo Governo em termos de reformas para que Portugal tenha um crescimento sustentável para o futuro?
Não lhe chamaríamos reformas, até porque o novo Governo enfrentará condições políticas bastante precárias, mas diríamos que são áreas com necessidade de intervenção prioritária.
A primeira é trata-se da falta de mão-de-obra, a dificuldade em atrair e reter talento no País. Todos os sectores estão com défice de quadros, sejam mais ou menos qualificados.
Como foi conhecido no final do ano passado, temos um terço da população jovem emigrada e talvez irremediavelmente perdida em termos de contributo produtivo para o País. Há algo a ser feito nesta matéria, seja com o IRS jovem já anunciado, seja através de outros incentivos, nomeadamente formativos, uma vez que existe um desajuste entre as qualificações que existem e aquelas que o mercado de trabalho e as empresas necessitam. Naturalmente, que isto passa também por integrar melhor a população imigrante, que cumpre um papel fundamental de equilíbrio demográfico no nosso país.
Uma segunda área de prioridade e decorrente da anterior, é a política fiscal. Temos uma carga fiscal sobre o trabalho que é um colete de forças sobre as empresas e sobre os trabalhadores. O nosso esforço tributário é dos mais elevados da Europa, quando somos um dos países com o rendimento médio líquido mais baixo. Por outro lado, esse esforço não se reflecte em melhores serviços públicos e num Estado mais eficiente. Pelo contrário, continuamos a entender que, em Portugal, se pagam impostos de país rico e temos serviços públicos de país pobre.
Por isso mesmo, é necessário que se cumpra o anunciado abrandamento de impostos, não apenas para favorecer o rendimento disponível das famílias, mas também enquanto estímulo ao investimento e à capitalização das empresas. Temos de melhorar a nossa competitividade fiscal, para tornar o país mais atractivo. 

Num terceiro e último nível, consideramos fundamental que haja uma reorganização dos serviços públicos, especialmente de âmbito administrativo, que agilize os processos de licenciamento e autorização. Essa reforma é um dos requisitos do novo reembolso do PRR e, como tal, terá mesmo de ser alcançada. Quanto mais competente for esse trabalho, melhores condições vão dispor as famílias e a as empresas para resolverem os seus problemas.
Existe outros sectores importantes, como a justiça ou a educação. Mas estas serão, no curto prazo, as intervenções que mais vão contribuir para que o país retome uma trajetória de crescimento sólida.

Atendendo ao actual contexto, que expectativas a nível macroeconómico para Portugal?
As expectativas não são muito animadoras. Há muitos factores de incerteza e instabilidade a nível internacional, que podem retrair investimentos e criar bloqueios ao comércio. De resto, a inflação voltou a mostrar sinais de resistência, bem com o crescimento que se registou em Março. O quadro de instabilidade política não ajuda, assim como a manutenção das taxas de juro por parte do BCE.
Resta-nos esperar que alguns determinantes, como o consumo privado, o turismo ou as exportações, continuem a ter um desempenho favorável, para que a economia não se ressinta e cumpra com as previsões mais optimistas, que rondam os 2% de crescimento para este ano.

E quais são as expectativas para o seu sector?
A Associação Comercial do Porto é uma organização multissectorial, mas de âmbito regional, que representa a co-
munidade de negócios do Porto e do Norte de Portugal. Nesse sentido, anima-nos o facto de a economia da região ter tido um comportamento resiliente, registando um crescimento superior à média nacional nos últimos 20 anos e um desempenho consistente nas exportações, na internacionalização da sua economia e na incorporação de valor tecnológico. No entanto, há sinais muito preocupantes, com destaque para o facto de sermos a região mais pobre do país, em termos de PIB per capita e termos as únicas sub-regiões do país – Tâmega e Sousa, Alto Tâmega e Trás-os-Montes – com salários médios inferiores a 1000 euros. A isto, junta-se o facto de termos sido a região do continente mais afectada pela vaga de emigração qualificada dos últimos anos. São sinais que justificam um olhar especial para o Norte, designadamente por parte do Estado central, que não pode descurar investimentos estratégicos, como a melhoria da ferrovia, as ligações às áreas de acolhimento empresarial, o investimento no Porto de Leixões e nas ligações transfronteiriças, mas também encontrar mecanismos de apoio mais específico, como os programas operacionais e o fundo ambiental. O Norte é a região mais populosa do país, é a que mais exporta e a que melhor produz. Merece, por isso, atenção redobrada por parte do poder político.






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