Durão Barroso diz que Europa tem de ter fronteira externa clara: “há limites para o multiculturalismo”

O ex-presidente da Comissão Europeia José Manuel Durão Barroso disse esta terça-feira que a Europa tem de ter “claramente uma fronteira exterior”, sublinhando que os europeus não querem “muito mais imigração” e que “há limites para o multiculturalismo”.

“Temos um problema muito sério, que é o problema demográfico. E esse problema demográfico traz outros porque se, por um lado, precisamos de mais imigração, a verdade é que os europeus não querem muito mais imigração e há limites ao multiculturalismo”, disse o também antigo primeiro-ministro português em Madrid, na conferência “Inspira Portugal, 50 anos depois”.

Durão Barroso ressalvou que é “a favor da abertura” e que não tem “um discurso xenófobo, ao contrário”.

“Mas temos de reconhecer que hoje, democraticamente, os nossos cidadãos não querem muita imigração, sobretudo quando é imigração de países, de culturas ou de religiões com problemas de integração. É isto que também explica em grande medida a subida dos partidos extremos, xenófobos ou mesmo racistas”, afirmou.

Para o ex-presidente da Comissão Europeia é por isso necessário “encontrar uma solução para o problema da imigração”.

“Se queremos manter uma Europa sem fronteiras interiores temos de ter claramente uma fronteira exterior. Os cidadãos têm de ter consciência de que estão protegidos. Porque se não há fronteira exterior não há identidade política”, afirmou, depois de realçar que o fim das fronteiras entre países da União Europeia (UE) é “uma grande conquista” que tem de ser preservada, dando como exemplo o caso de Portugal e de Espanha.

“Temos de ter uma gestão inteligente, com sabedoria, das nossas fronteiras. Caso contrário, teremos problemas muito sérios”, acrescentou.

Durão Barroso referiu-se à imigração por estar relacionada com aquele que considerou ser um dos maiores problemas estruturais da UE, a demografia, nomeadamente, o envelhecimento populacional dos europeus, que origina “falta de dinamismo, falta de inovação”, a par das questões ligadas à sustentabilidade dos sistemas de segurança social.

Neste contexto, além da gestão da imigração, disse serem necessárias “políticas de promoção” da demografia europeia.

Para Durão Barroso, o outro grande problema estrutural europeu está relacionado com a competitividade e a dependência energética.

O antigo primeiro-ministro português realçou como a Europa investe muito menos em inovação e tecnologia do que os Estados Unidos, a China ou até países árabes, num momento em que o mundo vive “uma revolução científica e tecnológica” comparável à revolução industrial, pelos impactos que está a ter e terá nos processos de produção e de circulação de bens, mas também na forma de relacionamento entre as pessoas.

Durão Barroso afirmou que os desenvolvimentos da Inteligência Artificial e outros “vão transformar tudo” e a Europa está a ir atrás dos Estados Unidos e da China.

Para o antigo presidente do executivo comunitário, a Europa tem de deixar de ser “politicamente ‘teenager’ [adolescente]” e avançar para “uma verdadeira política económica exterior”.

“Temos de aproveitar ao máximo a escala europeia, para poder competir a nível global, para poder defender os nossos interesses e valores”, afirmou.

Para isso, defendeu a necessidade de a UE “juntar as considerações políticas à política económica exterior, incluindo as questões relacionadas com a descarbonização”.

“Não podemos continuar a ser adolescentes geopolíticos (…). Temos de defender os nossos interesses com uma política externa que pense também em termos de segurança, de resiliência, do ponto de vista energético, de um ponto de vista estratégico, a longo prazo, e com empresas fortes que possam defender também os nossos interesses a nível global”, afirmou, alertando que há hoje “um mundo muito mais difícil”, com guerras na Ucrânia e no Médio Oriente e uma “crise do multilateralismo”.

Apesar destes problemas estruturais que apontou à Europa, Durão Barroso disse-se otimista em relação ao futuro da UE e da integração europeia, realçando como as crises sempre foram motores de mobilização para encontrar soluções e avançar na unidade do bloco comunitário, como aconteceu com a crise financeira, com a pandemia da covid-19 ou com a guerra na Ucrânia, que, por exemplo, fez avançar para uma “identidade europeia de defesa”.

A conferência “Inspira Portugal, 50 anos depois”, organizada pela Embaixada de Portugal em Madrid, decorre hoje na capital espanhola e celebra as relações bilaterais entre Portugal e Espanha, sobretudo, após 50 anos de democracia nos dois países.

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