“Doença dos veados zombies” está em clara expansão: cientistas estão preocupados que possa atingir humanos

Nas florestas e pastagens dos Estados Unidos, há um fenómeno silencioso que está a tornar-se preocupante: a doença debilitante crónica (CWD), mais conhecida como “doença dos veados zombies”, está a espalhar-se, o que fez despertar as preocupações entre cientistas e público.

Esta doença neurológica, caracterizada por uma miríade de sintomas – como salivação, letargia, tropeços e olhar vago -, já foi detetada em mais de 800 amostras de veados e alces, somente no estado americano do Wyoming, o que destacou a urgência e escala do problema, indicou o portal ‘The Conversation’.

Segundo Samuel J. Branco, professor sénior em Imunologia Genética da Notthingham Trent University, e Philippe B. Wilson, professor de ‘One Health’ da mesma universidade, no centro do problema está um culpado peculiar: os príons.

Os príons são proteínas mal dobradas que também podem causar o mau dobramento de proteínas normais do cérebro, o que causa a degeneração neurológica: esta característica torna as doenças por príons particularmente preocupantes, uma vez que são notoriamente resilientes e podem persistir no ambiente durante anos, resistindo aos métodos tradicionais de desinfeção, incluindo mesmo a incineração a temperaturas extremas.

A propagação de CWD representa riscos ecológicos e potenciais para a saúde humana: embora não haja evidências conclusivas de que a CWD possa infetar diretamente seres humanos, a possibilidade continua a ser um ponto de preocupação.

As doenças causadas por príons, como a doença de Creutzfeldt-Jakob nos seres humanas ou a ‘doença das vacas loucas’, demonstraram que podem atravessar a barreira das espécies – com consequências devastadoras. Por exemplo, o surto da ‘doença das vacas loucas’ na Grã-Bretanha resultou no abate de milhões de bovinos e conduziu à morte de 178 pessoas.

Apesar da falta de casos confirmados de CWD em humanos, persistem preocupações devido a vários fatores: em primeiro lugar, estudos demonstraram que os prións responsáveis pela CWD podem infetar e propagar-se dentro de células humanas em condições laboratoriais, aumentando o espectro de uma potencial transmissão.

Em segundo lugar, os seres humanos já estão inadvertidamente expostos a animais potencialmente infetados através da caça: entre 7 e 15 mil animais infetados com CWD foram consumidos anualmente por seres humanos em 2017, com projeções a indicarem um aumento anual de 20%. Ou seja, em regiões onde a prevalência é elevada, como o Wisconsin, milhares de pessoas podem ter consumido involuntariamente carne de veados infetados.

Mas, também as dificuldades inerentes à deteção e diagnóstico de doenças de príons em humanos complicam mais o problema: ao contrário dos agentes infeciosos convencionais, os príons não desencadeiam uma resposta imunológica, tornando-os difíceis de detetar através de meios convencionais, o que representa um obstáculo significativo à intervenção precoce e aos esforços de contenção.

O potencial da CWD para afetar a saúde humana não se limita à transmissão direta. A persistência ambiental significa que os seres humanos também podem ser expostos por vias indiretas, como solo contaminado, água e outras fontes ambientais. Dada a sua resiliência e a capacidade de persistir no ambiente durante longos períodos, as consequências a longo prazo para a saúde humana permanecem incertas, mas merecem uma consideração séria.

Há outro problema que se levanta: a propagação da CWD apresenta riscos económicos e ecológicos significativa: a caça ao veado é uma atividade recreativa popular em certas zonas dos Estados Unidos, mas também uma fonte vital de sustento e subsistência em muitas comunidades.

É um problema dos Estados Unidos? Não, a Europa também sofre

Em 2016, foram diagnosticados os primeiros casos na Europa, mais concretamente em veados selvagens na Noruega – o que reforçou o potencial reconhecido de se espalhar para além da sua variante atual e vincou a necessidade de cooperação internacional na monitorização e controlo da doença.

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