Conheça o clã Le Pen, a família política mais influente da Europa

“Vencemos!”, gritou Jean-Marie Le Pen, de 95 anos, na noite do passado dia 9, quando tomou conhecimento dos resultados das eleições europeias – o Rassemblement National (AN) triunfou com 31,7% dos votos e motivou a convocatória de eleições antecipadas pelo presidente francês, Emmanuel Macron.

A família Le Pen – com duas filhas, duas netas e o namorado de uma dessas netas – tornou-se o clã mais influente na política europeia: a vitória confirmou de forma espetacular o crescimento do partido político que nasceu na casa da família, matriz de um arco-íris de sensibilidades que vão da direita radical à extrema-direita ‘mais enérgica’, passando pelo populismo conservador.

Jordan Bardella (de 29 anos) é a grande e mais jovem esperança do clã Le Pen, formando uma união estável com Nolwenn Olivier (de 27), filha de Marie-Caroline le Pen (64) e Philippe Olivier (63 anos), que iniciou o serviço militar na Rassemblement National quando este era liderado pelo patriarca Jean-Marie, condenado em diversas ocasiões, naqueles anos, por crimes de incitação ao ódio racial e negação do genocídio nazi.

Bardella não tem estudos, não tem diploma, nunca trabalhou. É político profissional desde os 20 anos, à sombra de Marine le Pen (55). Porém, boa parte do crescimento do partido se deve à sua personalidade e carisma: faz muito sucesso entre as mulheres, cujo voto tem sido decisivo no crescimento eleitoral do partido de Le Pen. Se AN conseguir a maioria absoluta ou relativa nas eleições legislativas de 30 de junho e 7 de julho, como preveem as sondagens, Bardella poderá tornar-se chefe de Governo numa fase de coabitação institucional forçada com a presidência de Emmanuel Macron.

Num assomo de sinceridade, Bardella reconheceu que o avô da sua parceira, Jean-Marie, se envolveu em comportamentos racistas e antissemita há anos atrás, um reconhecimento que lhe valeu uma reprimenda familiar – ao longo desta campanha eleitoral, Bardella já deu outros sinais de independência.

Marine le Pen é a herdeira, refundadora e presidente do grupo parlamentar do seu partido na Assembleia Nacional Francesa: tem mais deputados do que todos os esquerdistas juntos. Ela encarna os grandes triunfos eleitorais da família e está listada como candidata vitoriosa nas próximas eleições presidenciais de 2027, estatuto confirmado pelo próprio Emmanuel Macron.

Em 2015, Marine expulsou o pai – na época a Frente Nacional – para moderar o partido, sem sucesso total. Na história política da França, o sobrenome Le Pen está intimamente associado aos grupos neonazis com os quais trabalhou o patriarca Jean-Marie. Segundo vários historiados, a sua filha Marine encarna em França o populismo conservador do Brexit e de Donald Trump.

As suas simpatias pelo antigo presidente dos EUA e candidato presidencial à Casa Branca são bem conhecidas. Embora, além disso, ela tenha um sério ‘handicap’: os banqueiros de Vladimir Putin financiaram várias das suas campanhas e o líder russo recebeu-a com honras no Kremlin em 2017.

O papel da ‘sogra’

Depois de várias idas e vindas, Marie-Caroline le Pen, mãe da companheira de Jordan Bardella, voltou ao partido da família e aspira a ser eleita deputada nas eleições antecipadas. Casada duas vezes e com uma vida amorosa intensa, ela é marcada por quem foi o seu padrinho político: Jean-Louis Tixier-Vignancour, um dos patriarcas do neonazismo francês nas décadas de 50 e 60 do século XX.

Marie-Caroline não é conhecida pelo seu génio político, embora a sua influência no clã Le Pen seja grande: é muito próxima do seu pai Jean-Marie e como irmã mais velha permite-se intimidar Marine. Além disso, como mãe da companheira de Bardella, pode afirmar critérios políticos e familiares que estão muito distantes das alegadas tentações modernas que o possível primeiro-ministro de Macron possa ter.

No clã familiar, Marion Maréchal-Le Pen (34 anos) destaca-se pelo seu imprevisível radicalismo. Durante alguns anos, foi a neta favorita de Jean-Marie e ele tentou torná-la a sua herdeira política direta. Essas pretensões do avô e da neta irritaram Marine, que abriu uma guerra interna. Finalmente, Marion rompeu com a tia Marine e tornou-se chefe da lista da Reconquista, o partido ultraconservador de Éric Zemmour, nas eleições europeias.

Agora, eleita eurodeputada, Marion rompeu com Zemmour depois de alguns anos de militância na Reconquista e volta a apelar à “união da direita”, para irritação da tia.

O ponto fraco

Assim, talvez não exista sobrenome, clã e família política com tanta influência como os Le Pens, certamente em França, mas também na Europa. A influência é evidente, assim como o seu ponto fraco: as tensões familiares. Jean-Marie, o patriarca, ainda realiza reuniões familiares e tenta em vão liderar o caminho.

Entretanto, Jordan Bardella está a construir a sua própria carreira política, nos seus próprios termos. Um bom exemplo disto é esta licença para recordar antigas convicções de incitação ao ódio. Essa independência tem boa divulgação fora da família, mas cai muito mal entre as pessoas próximas.

Marine Le Pen continua a aspirar à presidência da República, mas essa aspiração está hipotecada ao sucesso ou fracasso da coabitação de Bardella com Macron, que corre o risco de ser substituído pelo seu protegido quando chegar a hora. Enquanto isso, Marie-Caroline tem duas ambições: a felicidade da filha e o respeito pelas tradições dos sogros, que sempre foram de extrema-direita. Não tem peso político, mas pode complicar e envenenar muitas coisas. Marion Maréchal-Le Pen está dentro e fora do clã ao mesmo tempo.

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