Como a DKW mudou a história do automóvel
Jörgen Skafte Rasmussen, o fundador da DKW, era um homem que pensava rápido e agia ainda mais depressa. Depois de meia dúzia de anos a produzir motores de dois tempos e de se ter estreado em motocicletas, cedo percebeu que o futuro estava na produção dos seus próprios automóveis.
Por isso, quando em 1928 adquiriu a maioria do capital da Audi, tinha planos ambiciosos: lançar grandes carros de luxo com enormes motores de oito cilindros. O problema era a concorrência norte-americana. E a grande recessão económica.
Os problemas financeiros da Audi, que já tinham levado à entrada de Rasmussen no capital da marca fundada por August Horch, agravavam-se dia após dia. A decisão foi drástica: havia que produzir rapidamente um carro ajustado ao mercado e à conjuntura económica da altura. Em 1930, menos de dois anos depois da chegada do novo patrão, era lançado o caderno de encargos: um carro pequeno, baseado no motor a dois tempos arrefecido a água que equipava as motos DKW, com tração dianteira e uma estrutura de aço de baixo peso. O tempo de execução do projeto? Rasmussen deu aos seus engenheiros umas “generosas” seis semanas para o apresentar…
Denominado “F1”, nascia assim um dos carros mais marcantes da indústria automóvel. O pequeno DKW de tração dianteira teve o seu primeiro ensaio dinâmico no final de Novembro de 1931 e a apresentação ao público aconteceria no Salão Automóvel de Berlim, em Fevereiro do ano seguinte.
O seu caráter prático conquistou o público e as vendas foram um sucesso imediato. Mas o F1 ia muito além da popularidade: a sua filosofia de engenharia tornou-se um marco para toda a indústria. Afinal estávamos perante o primeiro carro de produção em grande série a adotar a tração dianteira, três anos antes de André Citroën apresentar o seu 7CV, o célebre “Traction Avant”.
O F1 estaria talhado para assumir também um papel importante na história da companhia que deu origem à Audi dos nossos dias. Logo em 1932, um ano após o lançamento, verifica-se a fusão de quatro fabricantes alemães: Audi, Horch (que August Horch havia fundado antes da cisão que o levou a criar a Audi), DKW e a divisão automóvel da Wanderer. Estas quatro marcas, que deram origem ao símbolo dos quatro anéis que perdura até hoje, passariam a estar unidas sob o grupo Auto Union.
A Auto Union AG tornava-se assim o segundo maior construtor alemão, uma dimensão que, apesar de tudo, manteve a identidade das quatro marcas. À Horch coube a divisão de carros de alto luxo; a Audi detinha os modelos de classe média-alta e alta; a Wanderer dava a sua marca a automóveis médios, enquanto a DKW se especializava nas motos e nos carros de segmentos mais baixos.
Neste contexto, a DKW passou a ocupar um lugar único na história e na forma como levou a mobilidade a um mundo que descobria a democratização do automóvel. Pouco depois do seu lançamento, o F1 tornou-se o modelo mais vendido da Auto Union e, na altura do termo da sua produção, em 1942, cerca de 270 mil unidades já havia saído das linhas de montagem.
Os modelos da DKW com tração dianteira foram, de resto, a base da reconstrução da Auto Union na Alemanha ocidental após a segunda guerra mundial. Entre 1949 e 1966, as fábricas de Ingolstadt e Dusseldorf (esta até 1962) produziram nada menos do que 887 mil modelos de passageiros da marca DKW.
Mas a evolução ditava grandes mudanças. Em 1965, a Auto Union produz o seu primeiro modelo do pós-guerra com um motor a quatro tempos, um universo totalmente distinto do paradigma ultrapassado dos blocos a dois tempos dos DKW. É o começo da era moderna para o fabricante e, por isso, surge a necessidade de um novo nome para os modelos com motor de quatro tempos. A escolha recaiu na marca “Audi”, beneficiando do prestígio e da imagem mais aspiracional.
O ano de 1965 foi ainda marcante num outro sentido, já que foi nesta data que a marca de Ingolstadt passou a fazer parte do grupo Volkswagen. A DKW é hoje uma memória da imensa história da Audi, mas, passados todos estes anos, não podemos deixar de olhar para o seu espírito pioneiro, para a sua coragem tecnológica, e imaginar até que ponto terá inspirado o lema que seria lançado em 1971 e perdura até hoje: “Vorsprung durch Technik” (“Na vanguarda da técnica”).
Fonte: newsroomsiva