“Com duas caras” e “memórias de um palhaço”: Boris Johnson lança hoje livro que tem sido arrasado pela crítica e ex-colegas

Esta quinta-feira, Boris Johnson, antigo primeiro-ministro britânico, lança o seu muito esperado livro de memórias, ‘Unleashed’ , uma obra que promete causar tanto impacto quanto o próprio político. Descrito como um relato da sua vida política e pessoal, o livro é visto por alguns como uma tentativa de Johnson se redimir e justificar as suas ações, enquanto outros o veem como mais uma manobra para evitar responsabilidades.

Amber Rudd critica duramente Johnson
Entre os primeiros a manifestar-se está Amber Rudd, ex-secretária do Interior e antiga colega de governo de Johnson. Rudd não poupou críticas ao ex-primeiro-ministro, descrevendo-o como “falso” e “desonesto” numa coluna escrita para The Independent. Segundo Rudd, a obra revela a “personalidade dividida” de Johnson e lê-se como se fosse “Billy Bunter à solta em Westminster”, referindo-se ao personagem desajeitado de uma série infantil britânica.

Rudd já havia sido célebre pela sua descrição pouco lisonjeira de Johnson, afirmando que ele é “a alma da festa, mas não o homem que queres a conduzir-te para casa no final da noite”. No entanto, as suas recentes declarações indicam que as feridas do período em que ambos partilharam o gabinete ainda não cicatrizaram, e o lançamento de ‘Unleashed’ parece ter reacendido as tensões.

‘Unleashed’ já era aguardado com bastante expectativa desde que, em janeiro do ano passado, foi revelado que Johnson tinha recebido um adiantamento de 510.000 libras pela obra. Este valor impressionante supera largamente os 7.674 libras que Liz Truss, sua sucessora, recebeu pelo seu próprio livro, 10 Years To Save The West. Este facto reflete o estatuto polarizador de Johnson, uma figura que continua a atrair atenção – positiva ou negativa – como poucos outros políticos.

O livro, no entanto, já está a dividir opiniões. Embora algumas críticas elogiem a sua capacidade de escrita e estilo irreverente, outras não hesitam em apontar falhas, particularmente no que toca à falta de autoavaliação e reflexão, aspetos comuns em memórias de antigos primeiros-ministros.

Críticas da imprensa: de “memórias de um palhaço” a “obra incomparável”
As primeiras críticas dos media também não são unânimes. Enquanto o The Telegraph elogia o estilo único de Johnson, afirmando que ele “escreve melhor do que qualquer outro político”, há quem acuse o livro de ser pouco mais do que uma tentativa de Johnson se glorificar e evitar responsabilidades pelos fracassos do seu governo.

Uma análise publicada no The Guardian descreve ‘Unleashed’ como “as memórias de um palhaço”, criticando a ausência de introspeção e arrependimento. O jornal sublinha que, ao contrário de outros ex-primeiros-ministros como David Cameron ou John Major, que nas suas memórias abordam os seus erros com alguma humildade, Johnson opta por uma abordagem bem mais leve e evasiva, não reconhecendo falhas nas suas decisões políticas.

O The Independent também teceu duras críticas ao livro, destacando que Johnson aproveita todas as oportunidades para “desviar culpas” e responsabilizar terceiros pelos problemas que surgiram durante o seu mandato. O jornal britânico sugere que o livro poderia ter o subtítulo “Não fui eu”, tal é a frequência com que o ex-primeiro-ministro se exime de qualquer responsabilidade.

Capítulos polémicos: da campanha do Brexit às eleições
Entre os temas mais debatidos no livro estão a sua liderança durante a campanha do Brexit e as eleições gerais que se seguiram. Em particular, o capítulo 59 atraiu bastante atenção, onde Johnson analisa as derrotas eleitorais do Partido Conservador. Ele não hesita em destacar que, na sua última eleição, conseguiu uma margem de 10 pontos percentuais a mais do que o líder trabalhista Keir Starmer, algo que vê como prova do seu sucesso como um dos maiores vencedores de votos populistas da política moderna.

Contudo, muitos críticos argumentam que, embora Johnson destaque as suas vitórias, ele falha em abordar como não conseguiu corresponder às suas próprias promessas, sobretudo no que toca à gestão do governo e aos desafios internos do Partido Conservador.

Mesmo os críticos mais duros reconhecem o estilo literário único de Johnson. O The Telegraph compara o seu tom a P. G. Wodehouse, famoso pela escrita leve e humorística, referindo que Johnson consegue cativar o leitor com anedotas peculiares e divertidas, como aventuras em kayaks insufláveis ou planos bizarros para invadir a Holanda. O próprio Johnson parece desfrutar deste tipo de narrativa, que mistura episódios descontraídos com momentos de grande peso político, como a defesa da Ucrânia, que, de acordo com a crítica, é um dos pontos altos do livro.

Johnson, que já se comparou a Winston Churchill, tanto em termos de carreira como de estilo de liderança, parece continuar a ver-se como uma figura histórica à altura do antigo primeiro-ministro britânico. No entanto, a crítica sugere que, ao contrário de Churchill, Johnson não é tão bom a refletir sobre os seus próprios fracassos.

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