Capital humano: activo intangível?
A valorização do capital humano começou a ganhar relevância com o aparecimento dos serviços. No final da década de quarenta, a economia começa a alicerçar-se nos serviços, alavancados pela forte industrialização existente até então. Os recursos humanos passaram a ser valorizados em função das suas competências e da sua experiência, pois delas dependiam a qualidade dos serviços prestados.
Hoje, o grande desafio que as empresas de serviços enfrentam é precisamente o de possuírem recursos, nos seus quadros, com elevados níveis de conhecimento e experiência adquirida. Os recursos não valem todos o mesmo, e essa distinção normalmente é feita através do factor remuneratório.
Diversos estudos desenvolvidos concluem sobre a elevada importância dos recursos humanos nas organizações, elencando um conjunto de vantagens. Contudo, do ponto de vista contabilístico, o capital humano não cumpre com os critérios de reconhecimento de activos, impossibilitando assim o seu tratamento contabilístico.
O tratamento dos activos intangíveis tem enquadramento contabilístico na International Accounting Standard 38 (normativo internacional) e na Norma Contabilística de Relato Financeiro 6 (normativo nacional), que referem que um activo cumpre o critério de identificabilidade na definição de um activo intangível quando:
A – for separável, capaz de ser separado ou dividido da entidade e vendido, licenciado, alugado ou trocado, seja individualmente ou em conjunto, como um contrato, activo ou passivo relacionado; ou
B – resultar de direitos contratuais ou de outros direitos legais, quer esses direitos sejam transferíveis, quer sejam separáveis da entidade ou de outros direitos e obrigações.
Uma entidade pode ter uma equipa de pessoal especializado e pode ser capaz de identificar capacidades incrementais do pessoal, que conduzam a benefícios económicos futuros derivados da formação. A entidade pode também esperar que o pessoal continue a colocar as suas capacidades ao seu dispor.
Porém, geralmente, uma entidade não tem controlo suficiente sobre os benefícios económicos futuros provenientes de uma equipa de pessoal habilitado e da formação, para que estes itens satisfaçam a definição de um activo intangível. Por uma razão semelhante, é improvável que uma gestão específica ou um talento técnico satisfaça a definição de activo intangível, a menos que esteja protegido por direitos legais para usá-lo e obter dele os benefícios económicos futuros esperados e que também satisfaça as outras partes da definição.
Quanto ao reconhecimento, as normas referem que um activo intangível deve ser reconhecido se, e apenas se:
A – for provável que benefícios económicos futuros esperados, que sejam atribuíveis ao activo, fluam para a entidade; e
B – o custo do activo possa ser fiavelmente mensurado.
O Financial Accounting Standards Board tem estudado este tema e elaborou um relatório identificando as vantagens e desvantagens da divulgação da informação sobre o capital humano por parte das organizações. Têm sido promovidas diversas discussões ao nível da OCDE e da UE, revelando-se, no entanto, insuficientes.
O capital humano tem vindo a conquistar importância nos últimos tempos. A divulgação da informação sobre o capital humano, ainda que, voluntária, tem sido cada vez mais relevante. Em Portugal, cerca de metade das organizações divulga informação não obrigatória sobre o capital humano nas suas demonstrações financeiras, relevando assim a sua crescente preocupação sobre este tema.
Existem hoje vários modelos de mensuração do capital humano, assentes essencialmente em conceitos relacionados sobre as competências das pessoas e na forma como as mesmas contribuem para a criação de valor para as empresas.
A maioria dos modelos existentes tem uma característica comum, que é o facto de se proceder à mensuração do capital humano com base no seu valor de mercado. Continua a ser questionada a sua eficácia, porquanto existem incertezas se este valor é realmente o capital humano, pelo facto de não existir uma relação interactiva e sinergética entre os factores financeiros e não financeiros que acrescentam valor à organização.
O conhecimento é o elemento diferenciador que distingue o capital humano dos restantes factores de produção. E medir o conhecimento é ainda um processo subjectivo e incerto. Aliás, os modelos de mensuração de recursos humanos contêm uma elevada subjectividade e incerteza, havendo assim um grande afastamento das normas contabilísticas.
Conclui-se que nenhum dos métodos pode ser considerado como uma solução para o problema da mensuração do capital humano nas organizações, podendo apenas servir de base para novos modelos que procurem resolver o problema da mensuração no futuro.
por Álvaro Gomes – Business Unit Director Conceito
Notícia publicada originalmente na Revista Risco