Bajau: O povo de superhumanos que está geneticamente desenvolvido para ‘viver’ dentro de água

No coração do Sudeste Asiático, os Bajau, também conhecidos como ‘nómadas do mar’, habitam as águas cristalinas de Filipinas, Malásia e Indonésia. Estes nómadas marítimos, com uma população estimada em mais de um milhão de pessoas, têm fascinado cientistas e exploradores ao longo dos séculos devido às suas notáveis habilidades de mergulho em apneia.

O que torna os Bajau tão singulares? Como é possível que consigam mergulhar até 70 metros de profundidade e permanecer debaixo de água por até 13 minutos sem respirar, enquanto o comum dos mortais luta para conter a respiração por mais de 90 segundos? Um estudo recente publicado na revista Cell procura responder a estas questões, sugerindo que os Bajau podem possuir adaptações genéticas que lhes conferem uma resistência extraordinária à hipoxia, a falta de oxigénio.

Herawati Sudoyo, geneticista do Instituto Mochtar Riady de Nanotecnologia (MRIN), que está a liderar um estudo genómico desta população, revelou que os Bajau têm uma alta tolerância à hipoxia. Segundo Sudoyo, “estas características genéticas tornam os Bajau quase super-humanos, permitindo-lhes tornar-se um com a água”.

Mas não são apenas as adaptações genéticas que permitem aos Bajau dominar as profundezas. Richard Moon, da Faculdade de Medicina da Universidade de Duke, que estuda a resposta do corpo humano a altitudes e profundidades extremas, observou que os Bajau têm um ritual único antes de mergulhar. “Antes da imersão, começam a respirar muito lentamente, em um exercício de relaxamento que ajuda a reduzir a frequência cardíaca”, explica Moon.

Os registos históricos também são testemunho das habilidades dos Bajau. No século XVI, o explorador veneziano Antonio Pigafetta, em ‘Primo Viaggio Intorno al Globo Terracqueo’, já destacava as suas capacidades de mergulho. Sergio Roldán Muñoz, investigador predoctoral do CSIC, indica que os Bajau são uma etnia do Sudeste Asiático, integrados nos grupos nómadas marítimos que viajam de ilha em ilha, vivendo principalmente em casas flutuantes ou aldeias costeiras.

A relação dos Bajau com o mar é ancestral. Aprendem a mergulhar desde os três anos de idade e durante séculos foram mercadores, dependendo da pesca e da coleta de pérolas para subsistir. O seu conhecimento do oceano é tão profundo que se acredita que foi este saber ancestral que os salvou do devastador tsunami de 2004, um desastre que ceifou a vida de 260.000 pessoas na região.

Melissa Llardo, uma das cientistas envolvidas no estudo sobre os Bajau, destaca que esta população evoluiu ao longo dos séculos, adaptando-se ao ambiente marinho e desenvolvendo características físicas e fisiológicas únicas. “Os Bajau evoluíram de forma a mudar a sua fisiologia, obtendo quase tudo o que necessitam do mar”, afirma Llardo, citada pelo ABC.

O estudo genético de 2023 realizado por Sudoyo e a sua equipa analisou 250 residentes Bajau de Wuring, na Indonésia, para entender melhor a diversidade genómica desta sociedade e aprofundar o conhecimento sobre as populações de nómadas do mar. Os resultados revelaram que os Bajau têm genes específicos, como PDE10A e BDKRB2, relacionados com as suas habilidades de mergulho, embora seja necessário mais pesquisa para compreender totalmente o seu impacto.

A capacidade dos Bajau de mergulhar a grandes profundidades e permanecer debaixo de água durante longos períodos não só desafia os limites humanos como também oferece insights valiosos sobre a adaptação humana a ambientes extremos. O estudo dos Bajau pode ser a chave para desvendar mistérios sobre a evolução humana mais recente e sobre como as populações podem adaptar-se e prosperar em condições adversas.

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