Alexandre Tavares: «O que mais me fascina na indústria farmacêutica é contribuir para que a ciência esteja ao serviço da sociedade»

Alexandre Tavares é Head of Business Development and Strategy, Asia-Pacific Middle East & Africa na Novartis, em Singapura, desde Fevereiro de 2018. Após ingressar os quadros da Novartis Portugal exerceu durante dois anos o cargo de Finance Senior Manager, na mesma empresa, na Suíça (headquarters).

Começou a sua carreira profissional na área financeira na empresa de cosméticos L’Oreal e, mais tarde, passou pela Warner Lambert. Entre 2003 e 2009, trabalhou na multinacional farmacêutica Bristol-Myers Squibb, onde foi Finance Manager e Business Controller. Em 2009, tornou-se Director Financeiro da Amgen biotechnology.

Tem um bacharelato em Contabilidade e Administração e uma licenciatura em Auditoria, ambos pelo Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa (ISCAL). Em 2007 concluiu o MBA em Gestão Internacional na European University.

É membro do Conselho da Diáspora Portuguesa desde 2018.

A ideia de ir gerir a região mais dinâmica e de maior dimensão da Novartis, desde a Nova Zelândia até Marrocos, despertou-lhe uma enorme vontade de abraçar este desafio. É em Singapura que ocupa grande parte do seu tempo, mas viaja com regularidade pelos 40 países que compõem a região.

Como surgiu o desafio de trabalhar para a Novartis em vários mercados internacionais?

O meu percurso iniciou-se na Novartis Portugal em 2014. O desafio de ir trabalhar na Ásia surgiu em conversa com a minha chefia após dois anos nos Headquarters em Basileia. Sempre tive um percurso em finanças e na altura já tinha exercido todas as posições que queria no Departamento Financeiro, em diferentes contextos e níveis de responsabilidade. O próximo passo seria a continuação do que já tinha feito anteriormente e ambos concordámos que seria o momento ideal para abraçar um desafio diferente e com maior responsabilidade na condução de negócios. A decisão envolvia sair da minha área de conforto pois a oportunidade que foi apresentada era em Business Development & Strategy com uma componente muito forte na área comercial.

Aceitou de imediato? Porquê?

Eu sou um eterno curioso, aventureiro e ávido de aprender com as pessoas com quem trabalho. A ideia de ir gerir a região mais dinâmica e de maior dimensão da Novartis, desde a Nova Zelândia até Marrocos, despertou em mim uma enorme vontade de abraçar este desafio, consciente, que iria ser muito difícil pois teria que estudar e aprender muito. Mas a experiência em Basileia deu-me imensa confiança. Depois de discutir com a minha mulher esta oportunidade, concordámos que seria óptimo para mim, mas ainda melhor para os meus filhos. Aceitei de imediato o desafio, vamos a isso!

O Alexandre é Head Business Development and Strategy, Asia-Pacific Middle East & Africa da Novartis. Quais são as suas principais funções?

A minha função passa essencialmente por coordenar todo o crescimento inorgânico da região e, em conjunto com a equipa de liderança, definir a estratégia comercial a médio e longo prazo. Para atingir esse crescimento, eu e a minha equipa, encetamos acordos comerciais com outros laboratórios farmacêuticos. Também procuramos empresas que queiram fazer o fabrico, promoção e venda dos nossos medicamentos. Com estas parcerias fomentamos a economia dos países onde a Novartis está presente. Fácil de descrever, mas muito difícil de implementar dado que cada contracto demora em média seis meses a concluir. Mas o desafio é extraordinário. Com esta experiência estou a adquirir mais competências dado o profundo conhecimento que retiro dos diversos sistemas de saúde e na adaptação cultural diária aos diferentes estilos de gestão e de negociação.

O que mais o fascina na indústria farmacêutica?

O que mais me fascina na indústria farmacêutica é a possibilidade de contribuir para que a ciência esteja ao serviço da sociedade. A inovação científica tem contribuído ao longo dos anos para que possamos viver mais tempo e com melhor qualidade. Doenças que no passado recente eram terminais, são hoje tratamentos crónicos como é o caso da SIDA e alguns tipos de cancro. A evolução da ciência tem sido tão rápida e promissora que não podemos desperdiçar esta oportunidade. A Novartis tem esse compromisso. Uma das nossas unidades dedica-se ao desenvolvimento e comercialização de terapias celulares e genéticas que visam potencialmente curar os doentes. É esta possibilidade de trazer às pessoas a esperança de uma vida melhor que me motiva todos os dias.

É em Singapura que passa grande parte do tempo de trabalho? Como é o seu dia-a-dia?

É em Singapura que ocupo grande parte do meu tempo. Tenho uma equipa fantástica que está no terreno e que procura implementar a estratégia e prioridades definidas pelos escritórios regionais. Contudo, viajo com regularidade pelos 40 países que compõem a região, procurando estar sempre presente com a equipa de negociação local em contractos mais exigentes e importantes. Mas apesar de toda esta agitação e adrenalina também tenho consciência das minhas obrigações como pai e marido e nunca falhei a um momento importante da vida dos meus filhos, como seja a apresentação de um trabalho na escola, a festa de Natal ou um jogo de futebol decisivo no clube do meu filho.

Antes de trabalhar no continente asiático esteve vários anos ao serviço de empresas na Europa. Quais as principais diferenças ao nível da metodologia de trabalho que encontrou ao mudar-se para a Ásia?

Na Ásia, as decisões são mais morosas, a hierarquia mistura- -se no processo de decisão e aceita-se inequivocamente a opinião do chefe. Na Europa o processo de decisão é mais informal e existe com mais naturalidade o confronto de ideias e speak up. Mas a minha experiência na L’Oréal, Bristol-Myers Squibb, Amgen e agora na Novartis diz que existem mais semelhanças que diferenças, independentemente do local onde se trabalha. A metodologia de trabalho e a relação entre colegas não varia assim tanto. Existe uma cultura própria da empresa que se estende pelos países. Assim, a maior distinção advém do ambiente externo e as implicações que este traz na estratégia e nas soluções a apresentar aos clientes. Não se trata de uma empresa local com um logótipo multinacional, pelo contrário, uma multinacional que se ajusta a cada mercado.

O que Singapura lhe tem ensinado sobre gestão de pessoas?

Esta experiência tem-me ensinado a estar permanentemente em escuta activa ao serviço dos meus colegas e dos doentes. É muito difícil aplicar uma estratégia com sentido único numa região tão distinta e peculiar. Existem mercados pro-inovação, outros sem qualquer apoio do Estado e com volumes de negócios muito dispares, é assim importante saber adaptar e reconhecer o mérito de cada proposta, quer ela venha da Austrália ou do Bangladesh. Esta oportunidade está a possibilitar crescer como líder, tendo uma maior visão global e de gestão da complexidade.

Qual é a sua filosofia de gestão?

A minha filosofia de gestão passa pela autenticidade, aposta incessante na melhoria continua, corajoso na tomada de decisão e com a perfeita noção de que o colectivo proporciona sempre uma melhor versão de cada um de nós. Transfiro para a minha função, hábitos que desde cedo foram incutidos pelos meus pais. Faço parte de uma família numerosa, tenho cinco irmãos, era normal em criança partilharmos tarefas domésticas e dar apoio escolar quando alguém precisava de ajuda. Talvez por ter crescido neste ambiente a competência de colaborar faz parte do meu DNA e ocupa grande espaço no meu modelo de liderança.

Qual o papel da Novartis no continente asiático?

A missão da Novartis é reimaginar a medicina disponibilizando medicamentos e tratamentos inovadores com base na ciência e tecnologia, de forma a melhorar e prolongar a vida das pessoas. E há muito a fazer na região pois o acesso a esta medicina de inovação ainda não é generalizado. E nós acreditamos que nenhum doente deve ser deixado para trás. Assim, procuramos em estreita colaboração com as autoridades locais de saúde, desenvolver estratégias que garantam o acesso a medicamentos inovadores e ao maior número de pessoas, mas de forma sustentável aos orçamentos de saúde. Através da Sandoz, uma divisão do grupo Novartis, também disponibilizamos medicamentos genéricos à sociedade.

Como caracteriza a indústria farmacêutica na Ásia?

O mercado farmacêutico na China é actualmente o segundo maior do mundo. Nos últimos anos o Governo Chinês tem vindo a implementar diversas medidas para encorajar a entrada e reembolso de medicamentos novos. O mercado de genéricos é ainda o mais predominante com 76% de quota de mercado em contraste com 27% nos EUA. Na Índia e na maioria dos países do Sudoeste Asiático os governos procuram garantir a universalização do acesso aos cuidados de saúde à semelhança do que já acontece na Europa, EUA e Japão. Em África a maioria dos mercados carece de infra-estruturas, meios de diagnóstico e profissionais de saúde. Por exemplo na Etiópia existem 10 oncologistas e cinco hematologistas a servir uma população de 100 milhões de habitantes. No entanto, como referi, a Novartis tem um pacto com a sociedade e está presente em países onde a oportunidade comercial é praticamente inexistente. Na África Subsaariana estamos presentes via Novartis Social business e com diversos programas de irradicação de doenças, como o combate à malária e lepra.

Como é que a Novartis respondeu à pandemia COVID-19?

A Novartis tem encetado diversas medidas no combate à COVID-19. Atendendo a que estamos presentes em mais de 140 países disponibilizamos um fundo global de 20 milhões de dólares para dar resposta às situações locais mais emergentes de saúde pública, como seja o auxílio na compra de equipamento de protecção médica. Por outro lado, a Novartis e um consórcio de empresas juntaram-se à Fundação Bill e Melinda Gates para acelerar o desenvolvimento, fabrico e disponibilização de vacinas, métodos de diagnóstico e tratamentos para a COVID-19.

Qual o seu papel enquanto Conselheiro da Diáspora?

Estou muito grato a Portugal por tudo o que me deu ao longo da vida. E temos um talento extraordinário quando temos oportunidades de trabalhar no estrangeiro. O meu objectivo é ser um “embaixador” de Portugal por via da minha função como gestor. É com imenso prazer que dou a conhecer o que de bom se faz por cá ao nível das empresas ou na excelência da investigação e a qualidade dos cientistas portugueses. Outro exemplo pode resumir-se a algo tão prático como, fizemos recentemente, em partilhar com sua Exa. o Presidente da República medidas de intervenção à COVID-19 existentes em cada país onde vive um conselheiro.

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