Acabar com o Hezbollah (sim…mas não só): O que está realmente em jogo na escalada de violência de Israel no Líbano?

Israel intensificou recentemente as suas operações militares na fronteira com o Líbano, numa altura em que surgem rumores de uma possível invasão terrestre para criar uma “zona tampão” entre as forças israelitas e o Hezbollah. O cenário é grave: apenas na última segunda-feira, Israel bombardeou 1.600 posições do Hezbollah, e o número de mortos já ultrapassa os 550 — um balanço que quase iguala o total de vítimas dos últimos 11 meses. O conflito, até agora de baixa intensidade, atingiu uma nova fase, e as perguntas sobre os verdadeiros objetivos de Israel neste confronto tornam-se mais prementes.

Ataques seletivos e preparação militar

Nas últimas semanas, as forças israelitas têm-se concentrado em ataques direcionados às infraestruturas do Hezbollah e aos seus arsenais de armas. Daniel Hagari, porta-voz do Exército de Israel, alertou a população libanesa para se afastar de qualquer local próximo de mísseis ou armas da milícia xiita, numa clara demonstração de que as operações militares se intensificariam. “Acelerar as operações ofensivas” foi a promessa do chefe do Exército israelita, Herzi Halrvi, afirmando que “não devemos dar tréguas ao Hezbollah”. A prioridade de Israel parece ser clara: garantir que os residentes israelitas deslocados na fronteira norte possam regressar às suas casas.

Yoav Gallant, ministro da Defesa, reforçou essa mensagem, sublinhando que o foco das forças militares de Israel está a deslocar-se para o norte do país, desviando recursos e tropas. A elite da 98ª Divisão das Forças de Defesa de Israel (FDI) foi destacada para a região fronteiriça, alimentando ainda mais as especulações sobre uma possível incursão em território libanês.

A hipótese de uma invasão terrestre

Entre as fileiras do comando militar israelita, há divisões sobre a melhor estratégia a adotar. Enquanto alguns defendem uma invasão terrestre para criar uma zona de segurança, outros preferem continuar com ataques aéreos seletivos. Dotan Razili, tenente-coronel das FDI, afirmou, durante um encontro com jornalistas na fronteira entre Israel e o Líbano, que o exército israelita “compreende agora melhor a infraestrutura do Hezbollah” e está “preparado” para agir rapidamente, se necessário.

Caso ocorra uma incursão terrestre, a estratégia não seria conquistar território libanês, mas sim criar uma “zona de amortecimento” de cerca de 10 quilómetros, afastando assim os combatentes do Hezbollah da fronteira com Israel. Esta medida permitiria, em teoria, que parte dos deslocados israelitas regressasse às suas casas. No entanto, analistas como Jesús M. Pérez Triana, especialista em segurança e defesa, alertam que tal zona de segurança não seria suficiente para neutralizar a ameaça do Hezbollah, que possui mísseis capazes de ultrapassar essa distância. “Uma zona de amortecimento eficaz teria de ter 40 quilómetros, e o Hezbollah lutaria por cada metro”, sublinha Triana.

Que custo teria uma invasão?

Uma invasão terrestre traria consigo um preço elevado, tanto em termos de vidas humanas como de destruição. Alex Plitsas, investigador do Atlantic Council, afirma que “qualquer operação terrestre implicaria o uso de unidades blindadas, artilharia e forças especiais, o que acarretaria grandes riscos para as tropas israelitas”. Embora essa opção não seja descartada, é claro que Israel preferiria evitar uma escalada total.

Uma solução alternativa seria suavizar o terreno com bombardeios aéreos intensivos antes de uma possível invasão, uma tática já utilizada na Faixa de Gaza. Por enquanto, os ataques aéreos israelitas parecem ter surpreendido o Hezbollah, que ainda não respondeu de forma significativa. Isto pode indicar que as capacidades operacionais da milícia foram temporariamente afetadas pelas perdas de líderes em ataques anteriores.

Um acordo em vista?

A questão que permanece em aberto é se o Hezbollah estará disposto a recuar face à pressão militar de Israel. A criação de uma zona de amortecimento pode ser suficiente para levar a milícia a aceitar um acordo de cessar-fogo. Ori Gordin, comandante do Comando Norte de Israel, sugeriu que “o Hezbollah pode estar aberto a negociações para provocar a retirada das forças israelitas”.

Politicamente, Israel parece ter o apoio necessário para uma ação mais agressiva no Líbano. Benny Gantz, líder do Partido de Unidade Nacional, declarou que apoiaria uma invasão terrestre caso fosse inevitável. Esta unidade política reflete-se também no aumento da popularidade do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que conseguiu, em parte, reverter o declínio provocado pelo ataque do Hamas em 7 de outubro, o maior falhanço de segurança da história de Israel.

No entanto, qualquer invasão traria um elevado custo humanitário e material, e muitos questionam se Israel está preparado para pagar esse preço. Dahlia Scheindlin, analista política, explica ao Financial Times que, apesar de os desafios continuarem a ser significativos, “a confrontação com o Hezbollah conseguiu unir o país, ao contrário da resposta ao Hamas”.

Decisões difíceis pela frente

A fronteira entre Israel e o Líbano tem sido palco de crescente tensão. Mais de 60 mil israelitas foram evacuados da região, e Sarit Zehavi, tenente-coronel da reserva israelita e presidente do think tank Alma, afirmou que uma decisão militar não pode ser adiada. “Os esforços diplomáticos falharam, e já não podemos esperar. Todas as opções são más, mas é necessário agir”, declarou Zehavi.

À medida que os bombardeios continuam e o número de vítimas aumenta, a questão sobre qual será o próximo passo de Israel torna-se cada vez mais urgente. O que está em jogo não é apenas a segurança de Israel, mas o futuro da região e a possibilidade de uma nova frente de guerra aberta entre Israel e o Hezbollah, com consequências imprevisíveis para o Líbano e o Médio Oriente.

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