A Netflix mudou as suas próprias regras e está a dar frutos
por: Joe Berkowitz, Fast Company
Depois, nos meses seguintes, perdeu mais um milhão de subscritores. O único aspecto positivo na altura? Não ter perdido os dois milhões previstos anteriormente. No entanto, em Abril de 2024, a Netflix inverteu o jogo, excedendo as expectativas de sucesso dos lucros do primeiro trimestre. Até agora, a maior streamer global conseguiu um número impressionante de 9,3 milhões de novos assinantes este ano, cinco vezes mais do que no mesmo período do ano passado, elevando o seu total para quase 270 milhões. Estes números confirmam que a Netflix manteve a dinâmica do seu ganho gigantesco de 13,1 milhões de novos subscritores no Outono passado, marcando uma recuperação surpreendente.
Parte do crédito pelo recente aumento vai certamente para as séries que se tornaram tema de conversa em 2024, incluindo “The Gentlemen”, “3 Body Problem” e “Avatar: The Last Airbender”. (As mais recentes, como o fabuloso “Ripley”, de Steven Zaillian, e “OJ: Made In America”, que a Netflix adquiriu habilmente na sequência da morte da figura controversa, chegaram à plataforma no segundo trimestre.) Contudo, o que realmente impulsiona o crescimento é uma série de medidas inteligentes que a streamer tomou no último ano, algumas das quais prenunciam dias ainda mais brilhantes para a empresa – e para os seus assinantes.
A limitação das palavras-passe funciona
Em tempos, a Netflix tweetou atrevidamente: “O amor é partilhar uma palavra-passe.” Mas isso foi em 2017, quando havia muito menos concorrentes. A participação da Netflix no mercado de streaming em 2019 foi de 48%; no ano passado, pairou nos 26%. À medida que o ambiente mudou, também mudou a ambivalência da Netflix sobre a partilha de palavras-passe, até que a empresa reprimiu formalmente a prática em Maio passado. Em vez disso, os subscritores passaram a ter a opção de adicionar mais um membro a um plano normal por mais 7,99 euros por mês. Embora alguns subscritores tenham rapidamente encontrado uma forma de contornar a limitação, o número de membros extra foi suficiente para a Netflix ganhar quase seis milhões de assinantes nos meses seguintes. A medida foi uma jogada astuta, mas foi um sucesso tão grande que a Max anunciou no mês passado a iminência da sua própria medida, com a Disney+ a seguir o exemplo em Junho. (Se não os consegues vencer, junta-te a eles.)
Os planos suportados por anúncios acrescentam novos espectadores
Tal como o projecto da palavra-passe marcou a inversão de uma posição anterior fortemente defendida, o mesmo aconteceu à adopção pela empresa de patamares suportados por anúncios. O co-CEO Reed Hastings declarou durante muito tempo que a Netflix nunca venderia publicidade – algo que admitiu ser um erro quando os novos planos foram lançados em Novembro de 2022. No ano e meio desde então, a sua mudança de ideias parece acertada. Os planos suportados por anúncios, que começam nos 6,99 dólares por mês (cerca de 6,50 euros), trouxeram 23 milhões de assinantes em Janeiro. São responsáveis por 40% das novas subscrições nos mercados onde estão disponíveis. (Curiosamente, a empresa anunciou no seu relatório de ganhos que deixará de apresentar os números trimestrais de subscritores a partir do primeiro trimestre de 2025, uma vez que procura dar mais ênfase a métricas como as receitas.)
Ainda assim, não esperem que os anúncios fiquem por aqui. Em Janeiro, a empresa anunciou a sua mais ousada incursão até à data – no espaço dos desportos ao vivo – com um acordo de 4,7 mil milhões de euros para os direitos exclusivos da série de luta livre da WWE, Raw, a partir de 2025. Espera-se que esta iniciativa atraia não só mais subscritores, mas também uma fortuna em receitas de publicidade.
Menos é mais
Quando o cineasta estreante Cord Jefferson aceitou o seu Óscar para melhor argumento adaptado no mês passado, usou a sua plataforma para fazer um apelo a mais filmes de orçamento médio. «Em vez de fazerem um filme de 200 milhões de dólares», pediu a todos os executivos que assistiam, «tentem fazer 20 filmes de 10 milhões de dólares». É um conceito que a Netflix parece estar a levar a sério no futuro. O novo director de cinema, Dan Lin, chegou à empresa a 1 de Abril, alegadamente com a missão de reduzir os custos e aumentar a qualidade. Diga adeus a romances zilionários insípidos como “Aviso Vermelho”, protagonizado por Ryan Reynolds e Dwayne Johnson, e diga olá ao thriller jornalístico “Scoop”, dirigido por Gillian Anderson, e à comédia romântica de Lindsay Lohan, “Um Desejo Irlandês”.
Se em tempos anteriores, a empresa podia fazer um investimento avultado pelo prestígio de tornar “Megalopolis”, de Francis Ford Coppola, num Original Netflix, isso já não acontece. A Netflix parece não estar preocupada com o direito de se gabar baseado no pedigree e está mais concentrada em alimentar todos os segmentos do seu enorme público. Porém, mesmo antes de esta nova era de “menos é mais” começar oficialmente, já estava em curso uma grande contração. A Netflix lançou 130 filmes e programas de TV a menos em 2023, uma redução de 16% relativamente ao ano anterior – e muito longe da lista de 2021 superlotada que precipitou a primeira perda de assinantes da empresa numa década.
Licença para prosperar
Apesar de a Netflix estar a reduzir o seu orçamento para filmes originais, a empresa continua a investir muito bem nos direitos de licenciamento de séries de sucesso existentes. No ano passado, transformou o êxito dos anos 2010 “Suits”, dos EUA, num verdadeiro fenómeno, tornando-se a série mais transmitida ao longo de um ano na história das classificações da Nielsen. Mas “Suits” não foi a única série amada a migrar para a streamer com muita fanfarra recentemente. No ano passado, a HBO pôs fim à sua recusa de longa data em licenciar títulos para a Netflix, emprestando séries como “Insecure”, “Sete Palmos de Terra” e “O Sexo e a Cidade”. Segundo o New York Times, várias destas séries não só foram um sucesso no top 10 da Netflix, como representam «mais uma prova de que a Netflix beneficia da difícil situação financeira que muitas das suas rivais enfrentam».
Na verdade, talvez o aspecto mais impressionante da recente recuperação da Netflix seja o facto de ocorrer num momento em que o crescimento do streaming diminuiu e a taxa de rotatividade aumentou. À medida que as streamers continuam a confrontar-se numa luta existencial por mais espectadores, os consumidores têm dificuldade em decidir quais delas vale a pena manter. Quais delas, para além da Netflix, obviamente.