«A cibersegurança é um imperativo ético»

Quais são as grandes tendências do sector em termos de inovação?

A inovação no sector financeiro, nos últimos anos, tem estado muito orientada à resposta a evoluções nas expectativas dos clientes, particularmente nos padrões de uso dos serviços financeiros. Com a pandemia veio confirmar-se a relevância desta ênfase, nomeadamente no que diz respeito ao proporcionar aos clientes oportunidades de aceder aos serviços financeiros em total segurança. Há igualmente uma tendência de utilização intensiva de inovação na redução do cost-to-serve. Em combinação, estas duas tendências têm convergido por um lado em inovações nos modelos de negócio suportadas nos novos interfaces com o cliente e na utilização extensiva de analítica e customer intelligence, como preditor de novas fontes de receita e, por outro lado, na utilização de técnicas de automação e de aceleração da captura de eficiências e da redução do time to market (RPA, adopção extensiva de cloud, algumas experiências em blockchain estarão entre alguns dos drivers de inovação).

Quais os grandes investimentos em inovação que estão a fazer neste momento?

À data, os maiores blocos de investimento em inovação são em melhorias no serviço aos clientes, com processos simplificados e melhorias nas ferramentas à disposição do cliente, onde temos várias iniciativas em curso (novas funcionalidades nas apps e novos canais, serviços remotos, etc.). Temos igualmente em curso investimentos na exploração das potencialidades de open banking. No caso deste último a app DABOX permitiu à Caixa reforçar a sua posição como Banco Digital dos Portugueses e posicionar-se como o primeiro banco português a lançar no mercado uma solução inovadora verdadeiramente de open banking. O futuro da app DABOX depende necessariamente do posicionamento escolhido e consequentemente das suas estratégias, mas à data lideramos o mercado de open banking e vamos consolidar a proposta de valor evoluindo para uma solução “everyday bank”.

Adicionalmente estão a ser criadas as bases para exploração de big data e modelos de analítica avançada.

Como se caracteriza o consumidor actual?

Os comportamentos e expectativas do consumidor estão a mudar de tal forma que estão a levar as várias indústrias (nomeadamente a Banca) a redefinir as suas prioridades e a transformar os seus modelos de distribuição.

O consumidor cada vez mais espera poder relacionar-se com o seu banco nos seus próprios termos e não em função das limitações do banco; tem uma expectativa muito elevada de simplicidade no relacionamento e de funcionamento 24/7 para resposta às suas necessidades.

De modo a garantir a manutenção da confiança dos clientes e a sustentabilidade do seu negócio, os bancos necessitam muito mais do que apenas uma “digital-first approach”; tem que redefinir a sua proposta de valor para corresponder às expectativas dos consumidores, alavancando na inovação digital e suportando os valores tradicionais que respondem às necessidades dos clientes.

De que forma a inteligência artificial (IA) e o machine learning (ML) estão a contribuir para o desenvolvimento de novos serviços para este consumidor?

A IA e o ML estão a alterar a estrutura dos serviços financeiros e a gerar novos pontos de equilíbrio no sistema, nomeadamente pelo aparecimento de novos modelos operacionais

São muitas e variadas as aplicações da IA na actividade bancária, bem como as mudanças que estão a gerar. Gestão do risco, gestão de activos, assistentes virtuais e monitorização da fraude são alguns dos muitos exemplos.

Esta dinâmica, incentivada pela necessidade de aumento da produtividade e eficiência dos serviços financeiros, tem permitido aos bancos acompanhar o crescimento exponencial da procura de produtos e serviços através dos canais digitais, reduzindo paralelamente o impacto causado por factores psicológicos ou emocionais associados a actividades realizadas por colaboradores.

Das principais mudanças destacamos o foco nos proveitos via transformação das operações de back office e áreas operacionais, que estão a levar as organizações para uma maior utilização de outsourcing especializado e paralelamente a criar pressão interna sobre outras áreas do banco para assumirem abordagens similares.

Igualmente relevante é a batalha pela relevância na medida em que o engagement de cliente, totalmente determinado pela experiência de cliente. A IA afigura-se como uma oportunidade para a construção dessa diferenciação.

Um bom exemplo é o lançamento, no início de 2020, da Assistente Digital Caixa integrada na App Caixadirecta, que permite em diálogo, em linguagem natural, dar respostas às questões dos clientes sobre saldos e movimentos das suas contas, bem com realizar operações como transferências, pagamentos, pedido de moratórias de crédito, tendo interagido até à data com cerca 500 mil clientes únicos.

Numa banca cada vez mais digital, qual o papel do balcão tradicional?

É um exercício interessante revisitar a visão para a banca retalho no final da década de 90, onde uma das palavras de ordem era “reengenharia”. Na visão de então, os objectivos para os serviços financeiros passavam pelo desenvolvimento de bancos que fossem: “Proactivos e não reactivos; baseados em relações e não transacções; baseados em soluções e não produtos; compostos por consultores financeiros e não vendedores; comprometidos com a colocação de produtos para além do crédito, suportados em trabalhos de equipa e não em iniciativas individuais.”

Porém, decorridos mais de 30 anos ainda não conseguimos responder a alguns destes desafios, mantendo-se actual esta visão.

Hoje, fruto da evolução tecnológica, estes desafios estão a encontrar resposta e assiste-se a um processo de alteração dramática da experiência de cliente. No entanto, se este tem cada vez mais experiências e procura soluções digitais (pelo que elas trazem de conveniência, disponibilidade e simplicidade), mantém a mesma exigência de personalização e necessidade de “human touch”.

Neste contexto, as agências são cada vez menos pontos de contacto transaccional e operacional e cada vez mais espaços de diálogo para aconselhamento e de continuidade em jornadas mais complexas, como a compra de habitação, gestão de investimentos, planeamento financeiro, etc . Assumem-se assim como um elemento de um todo integrado na relação com o cliente e que integram de uma forma “seamless” todos os pontos de contacto que este pode ter com o banco: redes sociais, messaging, website, homebanking, app, ATM, agência física, etc.

Quais as principais preocupações em termos de segurança e como estão a ser endereçadas?

Os riscos associados ao ciberespaço e às novas tecnologias no contexto bancário estão a aumentar, em termos de potencial impacto e de prevalência. A crescente utilização de meios digitais para realização de operações financeiras, a diversificação de canais de oferta de serviços aos clientes associada à adopção de tecnologias vocacionadas para a partilha de informação (ex: cloud, redes sociais) e a maior exposição dos serviços ao exterior criam novas oportunidades para os cibercriminosos tornando estes serviços mais vulneráveis e apetecíveis para acções maliciosas.

Por outro lado, as necessidades de time to market obrigam ao desenvolvimento ágil de código, colocando novos desafios a nível de controlos de segurança.

A CGD encara a cibersegurança como um imperativo ético, legal, regulamentar e contratual para com os seus clientes. Preservar os activos de informação é um desafio permanente e constitui uma prioridade de topo da CGD e uma responsabilidade que é exercida de forma quotidiana e transversal por toda a organização.

Nesta perspectiva é efectuado o acompanhamento contínuo do panorama global de ameaças cibernéticas, adequando as medidas de segurança com vista a uma gestão prudente dos riscos e das oportunidades associadas à transformação digital, incorporando as preocupações de cibersegurança na concepção dos serviços, e ao longo do seu ciclo de vida, em estreita articulação com o negócio, bem como incorporando requisitos de cibersegurança no âmbito da relação com os prestadores.

Constitui também uma opção estratégica a consciencialização e formação dos colaboradores como pilar fulcral e de primeira linha na segurança da informação e na comunicação e sensibilização aos clientes e da CGD.

Adicionalmente, ao nível da prevenção e combate ao cibercrime privilegia-se a articulação entre as várias entidades interessadas, nomeadamente operadores de infra-estruturas críticas e de serviços essenciais (onde se inclui a comunidade bancária), autoridades de cibersegurança, policiais e judiciais, rede nacional de CSIRT, entre outras. A cooperação possibilita a partilha de conhecimento e uma articulação de procedimentos, práticas e actuações neste âmbito, sendo essa uma das razões pelas quais a CGD integra, desde há vários anos, a rede nacional de CSIRT e o fórum interbancário de segurança online.

Que alterações todas estas mudanças provocam a nível interno nos bancos?

O digital e o processo de transformação associado é uma forma de servir a organização transformando tecnologia em resultados de negócio, inovação e valor. Consequentemente, enquanto key enabler de performance financeira e de experiência de cliente, tem necessariamente um forte impacto a nível interno.

O reforço da proposta de valor aliado à simplificação do portefólio digital-ready products, a orquestração do canal Agência e Digital de forma a proporcionar ao cliente uma experiência seamless e omnicanal obriga uma redefinição nas prioridades estratégicas.

Adicionalmente, afigura-se determinante desenvolver uma plataforma tecnológica flexível que permita instanciar as soluções digitais e a tão necessária analytics.

Não menos relevante no processo é a necessária alteração cultural e a implementação de novos modelos de trabalho colaborativo.

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