25 Abril: Revolução democratizou o desporto mas nunca foi prioridade

A revolução do 25 de Abril de 1974 trouxe uma “democratização” ao desporto, com um “avanço muito significativo” em liberdade, mas o presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP) lamenta que o setor nunca tenha sido prioridade política.

“O 25 de Abril abriu o país ao mundo, e o desporto beneficiou também dessa circunstância, da democratização da sociedade portuguesa. Foi transversal, com ritmos de desenvolvimento distintos, mas com consequências positivas no sistema desportivo nacional”, diz José Manuel Constantino, em entrevista à Lusa.

Entre as melhorias imediatas, o dirigente elenca a “abertura da prática desportiva” a toda a população, o respeito pelo livre associativismo e o aumento de competitividade em competições internacionais, bem como “a melhoria da qualificação dos quadros técnicos que envolvem o movimento desportivo”.

“Subjacente a este movimento, esta ideia, que é uma ideia que se mantém, de que o desporto é para todos, independentemente da idade ou competências técnicas. É para todos, e é isso que, de algum modo, justifica a sua salvaguarda na Constituição”, acrescenta.

Apesar do óbvio “avanço muito significativo” que Constantino vê como fruto da revolução, “os processos de desenvolvimento não são unívocos, nem apenas com avanços”, e o que se seguiu acabou por deixar Portugal “aquém” do que podia ter sido feito.

“A circunstância de Portugal ter vivido sempre sob o risco de equilíbrio das finanças públicas, e tido intervenção externa para equilibrar essas contas, condicionou muito as políticas públicas, e as políticas públicas para o desporto. Por questões histórico-culturais, nunca foi considerado de primeira linha nas preocupações. Já nem digo prioridade”, lamenta.

Se “nem todos os problemas se resolveram”, por outro lado “um conjunto de políticas na área do desporto ficaram aquém do que as circunstâncias permitiriam, pelo foco que foi dado a outras matérias”.

“Há uma questão de natureza mais conceptual, ideológica, que tem a ver com o modelo. Os países do sul da Europa foram muito marcados pelo modelo que teve origem na antiga União Soviética, de planeamento centralizado. Passámos, na minha leitura, de uma situação em que os primeiros anos são muito marcados por esse modelo, para uma outra, a que vivemos nos últimos 20 anos, de ultraliberalismo na situação desportiva”, reflete.

Sem “economia para modelo centralizado nem condições para modelo liberal”, com o desenvolvimento nacional “atrasado em relação à generalidade dos países europeus”, Portugal fica à mercê de uma política ‘desnivelada’, ainda por cima com alguns dos mais baixos índices de atividade física e prática desportiva da Europa, comprovados no último Eurobarómetro quanto à matéria.

“Soluções que tiveram sucesso noutros contextos não são soluções para Portugal. É preciso um equilíbrio entre o papel do Estado, como regulador, incentivador e estimulador, e o das organizações desportivas, do ponto de vista de construção das dinâmicas, quer no acesso à prática, quer na especialização, designadamente no alto rendimento”, aponta o presidente do COP.

Por outro lado, refletiu o dirigente, Portugal “investiu pouco do ponto de vista da construção da doutrina, reflexão de caminhos e debate das suas singularidades”.

Ainda assim, a democratização e o muito que foi conseguido permite-lhe fazer um balanço geral “muito positivo”, reforçando o papel da abertura e qualificação do desporto nacional.

Um ponto relevante também para o presidente do Conselho Nacional de Associações de Profissionais de Educação Física e Desporto (CNAPEF), Avelino Azevedo, de resto recém-eleito presidente da Associação Europeia de Educação Física.

Azevedo lembra que o setor do desporto, e em particular a educação física, acompanhou a sociedade na abertura democrática, acabando com as aulas separadas por género e permitindo equiparar os salários, e estatuto, dos professores de educação física a qualquer outro docente.

Essa desigualdade salarial ficou para trás, lembra em entrevista à Lusa, e destaca como momento importante o estabelecimento, em 1974, da Comissão Instaladora dos Institutos Superiores de Educação Física, no Porto e Lisboa, que viriam a abrir as portas do ensino superior.

Chegando ao estatuto de licenciatura, permitiu desenvolver o estudo de motricidade, dança, educação especial e outras vertentes, integrando “a educação física nas suas áreas agregadas” e fazendo-a evoluir para o termo que hoje é mais usado, o de ciências do desporto.

De resto, o presidente do CNAPEF critica uma “falta de visão integrada entre o desporto escolar e o desporto federado”, por um lado, e que só em 2024 tenha visto o nome do Conselho que lidera num programa de Governo, para que este organismo integre o Conselho do Desporto.

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