Ninho de vespas radioativo encontrado em instalação nuclear dos EUA levanta preocupações

Descoberta feita na Carolina do Sul expõe contaminação residual em antigo complexo de produção de armas nucleares. Grupo ambientalista exige explicações mais claras.

Pedro Gonçalves
Julho 31, 2025
14:30

Um ninho de vespas com níveis de radiação dez vezes superiores ao permitido por normas federais foi descoberto no início de julho numa instalação nuclear da Carolina do Sul, nos Estados Unidos. O episódio, considerado incomum e potencialmente alarmante, ocorreu no Savannah River Site, uma instalação histórica utilizada durante a Guerra Fria para a produção de materiais destinados a bombas nucleares.

De acordo com um relatório publicado pelo Departamento de Energia norte-americano, o ninho foi detetado a 3 de julho por técnicos das Operações de Controlo Radiológico. A estrutura estava instalada num poste situado junto aos tanques subterrâneos que armazenam resíduos nucleares líquidos. O local encontra-se perto da cidade de Aiken e é atualmente gerido pela empresa Savannah River Mission Completion (SRMC), responsável por supervisionar o processo de descontaminação da instalação.

A análise revelou que o ninho apresentava cerca de 100 mil dpm (decay per minute), um valor que representa um nível de radiação moderadamente elevado. Segundo a emissora WYFF, as autoridades procederam à pulverização do ninho com inseticida, eliminaram a estrutura e ensacaram-na como resíduo radiológico. Não foram encontradas vespas vivas.

Apesar da descoberta, o Departamento de Energia garantiu que “não há qualquer fuga nos tanques” e atribuiu a radiação detetada a uma “contaminação radioativa herdada”, ou seja, resíduos radioativos que permanecem no local desde a altura em que o complexo operava a pleno vapor. “O atraso no relatório deveu-se à necessidade de rever dados anteriores de contaminação em vida selvagem, garantindo a consistência dos critérios de notificação”, lê-se no documento agora divulgado.

Ambientalistas exigem mais transparência
Apesar das garantias oficiais, o grupo ambientalista Savannah River Site Watch, que supervisiona a atividade no complexo, manifestou sérias reservas quanto à explicação apresentada. Tom Clements, diretor executivo da organização, questionou a origem da contaminação e exigiu mais transparência sobre o que poderá estar a acontecer na instalação.

“Estou tão furioso como uma vespa por o SRS [Savannah River Site] não ter explicado de onde veio a contaminação radioativa ou se há alguma fuga nos tanques que deva ser do conhecimento público”, afirmou Clements, citado pela CNN Internacional.

Para o grupo, o relatório é “incompleto” e não responde a questões essenciais, como a forma exata como as vespas terão tido contacto com materiais radioativos. Saber qual o tipo de ninho encontrado poderia ajudar, já que algumas vespas constroem os seus ninhos com terra e outras com fibras vegetais mastigadas, podendo isso indicar a origem da contaminação.

Além disso, os ambientalistas alertam para a possibilidade de existirem outros ninhos contaminados, caso a origem da radiação não seja devidamente localizada.

Vespas não saíram do perímetro, dizem responsáveis
A SRMC, entidade atualmente responsável pela descontaminação e gestão do complexo, assegura que os riscos para a saúde pública são inexistentes. Em declarações ao Aiken Standard, a empresa afirmou que o campo de tanques está situado “bem dentro dos limites do complexo” e que as vespas sociais têm um raio de voo limitado, geralmente de apenas algumas centenas de metros a partir do ninho, o que significa que “não terão saído das instalações”.

Mesmo que tivessem sido detetadas vespas vivas, os níveis de radiação nos insetos seriam bastante inferiores aos registados no ninho, adiantou ainda a empresa.

Instalação histórica com legado perigoso
O Savannah River Site foi construído no início da década de 1950 como parte do esforço dos Estados Unidos para se equiparem nuclearmente durante a Guerra Fria. A instalação produzia, entre outros materiais, trítio e plutónio-239, ambos essenciais para a criação de armas nucleares. Desde então, o local tem estado envolvido em complexos trabalhos de descontaminação e reprocessamento de resíduos.

Segundo dados fornecidos pela SRMC, ao longo das últimas décadas foram produzidos mais de 625 milhões de litros de resíduos nucleares líquidos na instalação. Através de processos de evaporação e tratamento, esse volume foi reduzido para cerca de 129 milhões de litros. Atualmente, 43 tanques subterrâneos continuam em funcionamento, enquanto outros oito já foram encerrados.

A descoberta do ninho de vespas contaminado não teve impacto direto nas operações do local, mas reacendeu preocupações sobre a segurança da instalação e sobre a persistência de contaminação radioativa no solo e no ambiente circundante. O Departamento de Energia não identificou qualquer sinal de contaminação adicional nas áreas envolventes.

Questão continua em aberto
Apesar das declarações tranquilizadoras das autoridades, a descoberta do ninho levanta questões sobre os desafios contínuos colocados pela gestão de resíduos nucleares e pela vigilância de áreas com contaminação histórica. Para grupos de vigilância ambiental, este episódio é mais um sinal de que é necessário reforçar os mecanismos de monitorização e de comunicação pública.

“A origem da radiação ainda não está clara, e isso é preocupante. Pode haver mais casos semelhantes que ainda não foram detetados”, alertou Tom Clements.

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