O bilionário nova-iorquino John Catsimatidis intensificou o envolvimento político no último ano, duplicando as contribuições que tinha feito em 2016 e canalizando 2,4 milhões de dólares para apoiar Donald Trump e os republicanos no Congresso. O empresário justificou o aumento dos donativos com a crescente divisão entre os dois partidos e com a convicção de que o rumo político do país exige maior intervenção dos mais ricos, admitindo ao ‘Washington Post’ que pretende proteger não apenas a própria fortuna, avaliada em 4,5 mil milhões de dólares, mas o “estilo de vida” americano.
A influência política dos ultrarricos cresceu de forma exponencial ao longo das últimas décadas. De acordo com a publicação americana, as contribuições dos 100 americanos mais ricos para eleições federais aumentaram quase 140 vezes desde 2000, muito acima do crescimento dos próprios custos de campanha. Em 2024, cerca de 7,5% do total gasto nas eleições teve origem neste pequeno grupo, significando que 1 em cada 13 dólares investidos no ciclo eleitoral partiu dos mais ricos.
As decisões judiciais de 2010, que permitiram gastos ilimitados de empresas e sindicatos e criaram os super PAC, aceleraram esta tendência. Em pouco mais de uma década, o montante acumulado pelos 100 maiores doadores ultrapassou mil milhões de dólares, tornando-os essenciais para qualquer ambição eleitoral de grande escala.
Poder concentrado no topo da pirâmide económica
Economistas e especialistas em financiamento político alertam para a crescente dependência dos partidos em relação aos bilionários, numa altura em que a riqueza se encontra mais concentrada do que em qualquer outro momento desde a Era Dourada. Avanços tecnológicos, políticas fiscais favoráveis e alterações nos modelos de remuneração executiva contribuíram para fortunas de dimensão sem precedentes, agora acompanhadas por uma influência política ampliada.
O impacto é visível em corridas eleitorais recentes, como a disputa para o Senado do Arizona em 2022, em que investimentos milionários de figuras como Peter Thiel moldaram o equilíbrio entre candidatos republicanos. Apesar de o apoio dos ultrarricos não garantir vitórias, os consultores políticos admitem que se tornou determinante para competir em eleições cada vez mais dispendiosas.
Da influência financeira ao poder político direto
O número de multimilionários a ocupar cargos públicos também aumentou significativamente. Pelo menos 44 bilionários ou respetivos cônjuges integraram cargos estaduais ou federais nos últimos 10 anos, desde posições no Gabinete presidencial a papéis consultivos de menor visibilidade. Entre os nomes mais influentes estão Howard Lutnick, secretário do Comércio de Trump, JB Pritzker, governador do Illinois, e Paul Atkins, atual presidente da SEC.
A fortuna combinada dos 902 multimilionários americanos ultrapassa hoje os 6,7 biliões de dólares, mais do dobro do registado há pouco mais de uma década. Esta concentração de riqueza reflete-se nas prioridades políticas, com mais de 80% das contribuições federais dos 100 mais ricos em 2024 a serem direcionadas para candidatos republicanos. Trump recebeu, só nesse ano, 15 vezes mais donativos deste grupo do que em 2016.
Tecnologia e finanças reforçam alinhamento com o Partido Republicano
O afastamento entre Silicon Valley e o Partido Democrata tornou-se evidente nos últimos anos. A oposição dos magnatas da tecnologia à regulação proposta pela administração Biden aproximou muitos deles do Partido Republicano, que prometeram avançar com cortes fiscais, limitar a intervenção federal e favorecer setores como criptomoedas e inteligência artificial.
Elon Musk é o caso mais emblemático desta inflexão, tendo destinado 294 milhões de dólares para apoiar Trump e os republicanos em 2024. Vários outros dirigentes tecnológicos e financeiros seguiram o mesmo caminho, contribuindo com mais de 500 milhões de dólares adicionais para a direita americana.
Críticas à influência dos super-ricos e receios de uma “oligarquia” americana
O crescente peso político dos multimilionários alimenta debates sobre a sustentabilidade da democracia americana. Figuras como Bernie Sanders falam numa deriva oligárquica, salientando que a vida quotidiana da maioria dos americanos contrasta com o enriquecimento contínuo dos mais ricos. Sondagens recentes mostram que a maioria da população vê com preocupação o aumento do peso dos grandes doadores nas eleições.
A segunda tomada de posse de Trump ilustrou simbolicamente esta concentração de poder: pelo menos 17 multimilionários — incluindo Musk, Jeff Bezos e Mark Zuckerberg — ocuparam lugares centrais na Rotunda do Capitólio, num sinal claro da proximidade entre o novo Presidente e a elite económica.
Trump consolida apoio dos ultrarricos na administração e agenda legislativa
A política de Trump reforçou esta relação. O atual presidente nomeou cerca de uma dúzia de multimilionários para a administração, promoveu um corte profundo na estrutura regulatória através do Departamento de Eficiência Governamental liderado por Musk e apoiou legislação que reduziu impostos para empresas e permitiu heranças elevadas livres de tributação, ao mesmo tempo que diminuiu apoios sociais como o Medicaid.
A influência dos bilionários sente-se também no financiamento direto de prioridades governamentais, desde doações para projetos na Casa Branca a contribuições para mitigar impactos de paralisações federais.
Debate interno nos partidos e perspetivas futuras
Mesmo dentro do Partido Republicano surgem críticas à dependência dos magnatas da tecnologia e à perceção de que os interesses dos mais ricos se sobrepõem às necessidades da classe trabalhadora. No lado democrata, a retórica contra os bilionários tem sido adotada de forma crescente, embora alguns dirigentes alertem para o risco de afastar empresários influentes.
A ascensão política dos ultrarricos não parece, contudo, diminuir. Com fortunas em expansão, legislação permissiva e campanhas cada vez mais caras, o papel dos bilionários promete continuar a definir decisões fundamentais na política americana, num cenário que muitos analistas consideram um dos maiores desafios à democracia representativa nos Estados Unidos.














