XX Conferência Executive Digest: a Responsabilidade das empresas em destaque

Decorreu esta quinta-feira na Culturgest, em Lisboa, a XX Conferência Executive Digest, desta vez com o tema “Os Imperativos da Responsabilidade Social nas Empresas – Sociais, Ambientais, Corporate, Empresariais”.

Paulo Macedo, CEO da Caixa Geral de Depósitos, foi o primeiro keynote speaker da manhã e abriu o tema dizendo que a questão da responsabilidade das empresas é um tema «que está na moda», e o desafio dos gestores é «passar da moda à materialização». Para o gestor, existem diversos drivers para esta mudança relativa ao ESG (Environmental, social and corporate governance), e alguns deles são bastante recentes, como a transição demográfica e energética, as alterações climáticas ou mesmo a procura de novos estilos de vida.

Paulo Macedo citou um survey do World Economic Forum realizado durante a pandemia que mostra que as preocupações das pessoas são questões sanitárias, desemprego e outros. No entanto, isto não corresponde aos maiores riscos da Humanidade, que dizem respeito ao meio ambiente, estando até acima dos relacionados com cibersegurança. Isto faz com que muitas vezes o ESG seja associado apenas ao ambiente. O gestor da CGD faz questão de afirmar que as três componentes interessam ao banco público.

Na banca, tem especial relevância o critério da sustentabilidade aplicado ao financiamento e ao investimento. São estas as duas grandes áreas em que a banca pode dar uma resposta.

O segundo keynote speaker desta XX Conferência Executive Digest foi Peter Lacy, Chief Responsability Officer and Global Sustainability Services Lead da Accenture. O responsável identifica três fatores desta década, relativos ao ESG: a redefinição da Globalização e do Capitalismo; a quarta revolução industrial; e o desenvolvimento sustentável.

Do mesmo modo, Peter Lacy apresenta algumas das razões pelas quais a sustentabilidade é importante para as empresas, sendo que essas razões se prendem, muitas vezes, com pressões. Em primeiro lugar, a pressão dos investidores, que fará com que já este ano perto de 50% dos assets globais venham a incorporar fatores de ESG; em segundo, a pressão dos consumidores (segundo a Accenture, 62% dos clientes querem que as empresas tenham uma posição em questões como a sustentabilidade); existem ainda as pressões regulatórias, já que os pacotes de estímulo estão cada vez mais associados a condições de ESG: 25% do plano europeu está alocado a iniciativas “verdes”; por fim, Peter Lacy fala da pressão dos colaboradores, sendo que as organizações com propósito têm um aumento de 30% da produtividade.

Peter Lacy destaca ainda que a sustentabilidade cria valor para o negócio por diversas vias: o aumento das receitas, proveniente da subida das vendas motivada pela confiança e preferência dos clientes, do portfólio de produtos e serviços sustentáveis e ainda do acesso aos mercados; o aumento de intangíveis, devido à maior fidelização dos clientes, ao diálogo com as autoridades regulatórias e a atração e retenção de talento; a redução de custos através da poupança de energia e materiais; e ainda a redução dos riscos reputacionais, regulatórios e sociais.

 

Planos, políticas e práticas

A primeira mesa-redonda da conferência foi dedicada ao tema “Planos, Políticas ou Práticas?” e contou com a presença de João Sousa, Administrador Executivo dos CTT, Nélson Pires, Director-Geral da JABA Recordati e Pedro Galhardas, Managing-Director da Accenture. A moderação ficou a cargo de Ricardo Florêncio, CEO da Multipublicações Media Group.

João Sousa diz que nos CTT existe uma grande preocupação com a sustentabilidade, sendo que muitas vezes esta está «casada» com o tema do ambiente, onde entram as operações, a logística e os transportes, entre outros fatores. O responsável lembra que esta preocupação existe desde antes da sustentabilidade ser uma «moda» e refere que o serviço Correio Verde é um exemplo disso mesmo, estando no mercado há mais de 10 anos. Destaque ainda para a maior frota elétrica do sector de transportes e logísticas, sendo esta uma preocupação não só dos CTT mas de muitos dos seus clientes institucionais. Assim, a sustentabilidade nos CTT é um fator presente de forma integrada e com uma agenda muito própria.

Do lado da JABA Recordati, Nélson Pires destaca o papel do sector farmacêutico na sociedade e afirma que aquilo que é uma «moda» para muitas empresas hoje, já existe neste sector há décadas. «Se hoje vivemos até aos 80 anos em Portugal, isso é porque os medicamentos que produzimos o permitem. Obviamente que temos bons técnicos de saúde, mais os meios de diagnóstico que produzimos melhoraram de tal forma que as pessoas que morriam aos 50 anos em Portugal na década de 60, agora vivem até aos 80». Esse é o propósito da área farmacêutica.

Nélson Pires destaca a autorregulação do sector como uma fonte de sustentabilidade e lembra que todas as fábricas da JABA Recordati são certificadas e auditadas, todas estão localizadas na Europa, onde a legislação é clara e 60% do que é vendido em Portugal é produzido no nosso país, contribuindo para uma economia circular e redonda.

Pedro Galhardas destaca a Accenture como uma empresa global, presente em 120 países, com 500 mil colaboradores e com um grande compromisso com a sustentabilidade. A empresa está cotada na Bolsa de Nova Iorque e isso faz com que haja um escrutínio muito forte. Pedro Galhardas diz que à medida que estas preocupações foram passando para outras fontes de financiamento, todas as empresas vão ter ainda mais ambições quanto à sustentabilidade. Refere ainda que a Accenture trabalha com as Nações Unidas há 15 anos e que fez um estudo recente que indica que existe um atraso nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Isto significa que esta década será obrigatoriamente de aceleração se quisermos atingir estes objetivos. Para esta aceleração contribui a pandemia, que trouxe para cima da mesa as questões da saúde, das alterações climáticas e do respeito pelo indivíduo, por exemplo.

 

O retorno da sustentabilidade

Na segunda mesa-redonda, subordinada ao tema “Os investimentos responsáveis têm retorno?”, contou com a presença de Ana Fontoura, Diretora de Responsabilidade Social do Grupo Fidelidade, Cláudia Domingues, Country Communication Manager do IKEA Group, Luísa Pestana, administradora da Vodafone, e Nuno Moreira da Cruz, Executive Director Center for Responsible Business and Leadership da Católica Lisbon. A moderação foi de Maria João Vieira Pinto, Diretora de Redação da Executive Digest.

Nuno Moreira da Cruz recorda que há 10 ou 15 anos, ninguém falava de ESG. O assunto terá aparecido por volta de 2011, quando as empresas começaram a perceber que havia uma emergência climática e desigualdades sociais importantes, o que levava à necessidade de fazer alguma coisa. Surgiram então muitas iniciativas e plataformas, em que as empresas começaram a falar das temáticos onde sabiam que ficariam «melhor na fotografia». Numa segunda fase, que é aquela em que estamos, já existe uma tentativa de standardizar toda a linguagem dos ESG. No entanto, a questão fundamental permanece por resolver: enquanto estivermos a falar de métricas financeiras e não financeiras, nada disto resulta. É preciso colocar o ESG nas contas das empresas. Este é o passo seguinte.

Luísa Pestana afirma que os presidentes da Vodafone Portugal ao longo dos anos sempre foram muito voltados para a comunicação dos valores da empresa e para o alinhamento de todas as políticas financeiras, de marketing, de pessoas, de responsabilidade social. Por isso, a Vodafone Portugal foi uma das primeiras empresas a ter uma política de responsabilidade social e uma estratégia com programas que têm mais de 15 anos e que continuam com resultados concretos. A diversidade, por exemplo, é um dos pilares da política de responsabilidade social da Vodafone.

Ana Fontoura diz que as seguradoras têm vindo a evoluir bastante ao longo dos anos em termos de ESG e destaca a preocupação da Fidelidade com as pessoas. A responsável afirma que a prioridade da Fidelidade é, de facto, as pessoas, tanto ao nível dos clientes, como dos colaboradores. E isso reflete-se na cultura WeCare, que apoia os colaboradores em momentos de grande aflição, refere Ana Fontoura. O prémio Fidelidade Comunidade é um exemplo de iniciativa externa para contribuir para a capacitação e robustez da economia social. Ana Fontoura diz que o retorno destas iniciativas é muitas vezes medido através de surveys, que também servem para ajustar as políticas.

Cláudia Domingues refere que a estratégia da IKEA é global porque o impacto faz-se quando todos percorrem o mesmo caminho. E também quando a sustentabilidade não é uma camada adicional, mas um fator integrado na atividade da empresa. A economia circular é um dos pontos fortes das políticas do ESG, em termos de reutilização de materiais, por exemplo, na produção de produtos. Cláudia Domingues acrescenta que o impacte ambiental tem de ser pensado em toda a cadeia de valor.

António Gomes Mota, professor Catedrático do ISCTE e Presidente do IPCG – Instituto Português de Corporate Governance, encerrou a XX Conferência Executive Digest com a apresentação “A visão multi-stakeholder no centro da Governance: realidades, tendências e desafios”. O professor referiu a alteração que se foi fazendo de forma muito acelerada nos últimos anos daquilo que é o propósito das organizações com fins educativos das empresas. Se antes a matriz era a criação de valor para os acionistas das empresas, hoje existe uma visão mais ampla de olhar para a organização como parte de um ecossistema, que interage com o mundo e que por isso deve responde aos interesses dos múltiplos stakeholders: acionistas, clientes, fornecedores, colaboradores e comunidade em geral. Nessa perspetiva, emergiu o conceito de ESG para medir o impacto das empresas através dos seus três eixos: ambiental, social e de governance.

O professor referiu ainda as iniciativas europeias que vão ter impacto nas empresas: a densificação da informação não financeira relacionada com estas dimensões; a extensão legal dos deveres e responsabilidade dos administradores, agora alargada aos interesses de múltiplos stakeholders; a obrigatoriedade de assegurar que a cadeia de fornecedores cumpre critérios ambientais e de respeito pelos direitos humanos.

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