Continente: «O consumidor é cada vez mais exigente»
O consumidor é cada vez mais exigente, não só com a qualidade ou o preço dos produtos, mas com a actuação das empresas como um todo. Nesse sentido, e com a ambição de contribuir para a democratização do acesso a uma cesta saudável e sustentável, o Continente tem desenvolvido um conjunto de iniciativas com fornecedores e parceiros. Em entrevista, Mariana Pereira da Silva, directora de Sustentabilidade da MC, explica como estas acções contribuem para a protecção e preservação dos ecossistemas e para uma melhor utilização dos recursos naturais.
A marca Continente já foi reconhecida várias vezes como Marca de Confiança Ambiente. O que representa esta distinção?
É com imenso orgulho que o Continente voltou a receber em 2021 a distinção de Marca de Confiança pelo 12.º ano consecutivo. Este prémio só é possível graças ao trabalho desenvolvido pelas nossas equipas em estreito alinhamento com os nossos fornecedores e parceiros que, diariamente, colaboram para democratizar o acesso a uma cesta saudável e sustentável, e, claro, a todos os clientes pelo voto de confiança. Como retalhista líder em Portugal defendemos que o nosso impacto na economia e sociedade portuguesa vai além das lojas e operações de retalho alimentar e especializado, é muito gratificante sermos reconhecidos pelos nossos clientes.
A sustentabilidade está no ADN da marca Continente. Como exercem a vossa actividade numa lógica de ecoeficiência, que consolida a eficiência ambiental com a económica?
Ao longo dos anos, temos investido de forma contínua e consistente na melhoria da gestão ambiental das nossas operações, num uso mais eficiente dos recursos, optimizando os consumos de água e energia, e minimizando as emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE), sem descurar a gestão adequada dos resíduos. O programa de implementação dos Sistemas de Gestão Ambiental (SGA) nas nossas lojas e entrepostos tem contribuído de forma significativa para o efeito.
De forma mais específica, no último ano, mantivemos os esforços de promoção da eficiência e flexibilidade do consumo energético, investindo na instalação de equipamentos e sistemas com melhor desempenho, criando condições para uma monitorização e gestão dos consumos mais efectiva, com a implementação de contadores com telemetria ou a realização de auditorias, e desenvolvendo procedimentos que possibilitaram potenciar os investimentos realizados.
Com o propósito de minimizar o impacto da actividade logística, desenvolvemos um conjunto de projectos que visam a optimização das rotas através da redução das distâncias percorridas, aumento da capacidade da carga e do número de entregas por km percorrido. Trabalhamos de forma consistente com os fornecedores para melhorar a ecoeficiência dos veículos utilizados. Ainda, a nossa logística disponibiliza aos fornecedores um serviço de transporte a partir das rotas que seriam feitas em vazio pelos seus camiões, após procederem à última entrega em loja. Desta forma, consegue-se uma redução significativa das rotas em vazio, dos veículos de abastecimento de lojas (no regresso após última entrega) e dos nossos fornecedores após a entrega no nosso entreposto.
Qual o compromisso do Continente no sentido de se destacar enquanto líder na construção e adaptação das suas lojas com uma orientação que procura maximizar a ecoeficiência das mesmas, contribuindo para a redução da pegada ecológica?
Alinhados com a ambição do Acordo de Paris temos um objectivo de redução das emissões próprias de GEE em 55% até 2030 e, até 2040, atingir a neutralidade carbónica das operações. Para o efeito temos um plano de acção que assenta em quatro grandes áreas de actuação: implementação de medidas de ecoeficiência com o objectivo de reduzir ao máximo os consumos de energia, de acordo com o referido anteriormente; electrificação dos consumos, com particular foco no nosso last mile e nas viaturas de serviço e função; programa de alteração das centrais de frio; e investimento na produção e aquisição de energia efectivamente produzida a partir de fontes renováveis. No último ano, aumentámos a nossa capacidade de produção de energia eléctrica a partir de fontes renováveis (através das nossas centrais fotovoltaicas) em 67%. Estabelecemos, através da Elergone Energia, um acordo de compra (PPA offsite) a longo-prazo, de cerca de 100 gigawatts-hora (GWh) anuais de energia renovável com a Shell Energy Europe Limited. Trata-se de um marco muito relevante que, por si só, permitirá assegurar que cerca de 20% do nosso consumo de electricidade será de origem renovável.
No âmbito da gestão de resíduos, assumimos a responsabilidade tanto pelos resíduos gerados pela nossa actividade, como pelos resíduos entregues pelos clientes em loja, promovendo a reciclagem e a cidadania ambiental. Registámos um aumento da taxa de valorização dos resíduos produzidos que se situou nos 84%. Destaco ainda a participação do Continente num conjunto de projectos-piloto de preparação para o futuro Sistema de Depósito e Reembolso (SDR) de embalagens de bebidas, a implementar em Portugal. Através deste sistema, é possível assegurar a reciclagem de plástico de elevada qualidade e assegurar a sua reintrodução no sistema, maximizando a “circularidade dos materiais”. As 25 máquinas instaladas nas lojas já permitiram recolher mais de 12,4 milhões de embalagens de plástico.
Nesse sentido, quais os principais desafios para o Continente? A procura constante de novas soluções que respondam às necessidades das pessoas, mas também do planeta?
O consumidor é cada vez mais exigente, não só com a qualidade ou o preço dos produtos, mas com a actuação das empresas como um todo. Nesse sentido, e com a ambição de contribuir para a democratização do acesso a uma cesta saudável e sustentável, desenvolvemos um conjunto de iniciativas com os nossos fornecedores e parceiros. Estas acções fomentam a criação de redes de abastecimento mais transparentes e responsáveis, contribuindo para a protecção e preservação dos ecossistemas e para uma melhor utilização dos recursos naturais.
Temos vindo a promover uma estratégia de certificações de práticas produtivas junto dos fornecedores, que nos permitem maior rastreabilidade desde a produção até ao momento de consumo. Em 2021, o Continente foi o primeiro retalhista do mundo a obter a certificação da sua cadeia de abastecimento de Frutas e Legumes pelo GLOBAL G.A.P. Em termos de produção animal, destacamos a obtenção da certificação internacional em Bem-Estar Animal em toda a cadeia de produção, segundo os Protocolos Internacionais do “Welfare Quality”, para as carnes de bovino das marcas Aberdeen-Angus Continente ® e Limousine Continente®.
Por outro lado, junto do consumidor, de forma consistente temos promovido padrões de consumo saudáveis e responsáveis, disponibilizamos uma oferta mais diversificada, com menor pegada e com um perfil nutricional mais equilibrado. Com o nosso programa de revisão da composição nutricional dos produtos já optimizámos mais de 350 artigos de marca própria, o que se traduziu numa redução de 1305 toneladas de açúcar, sal e gorduras consumidas pelos clientes, por ano.
Outra problemática que ocupa um espaço central na nossa agenda é o desperdício alimentar. É um desafio social e ambientalmente premente, transversal a toda a cadeia de valor. Acreditamos que uma gestão mais inteligente e equitativa do desperdício assegura um importante contributo para a conservação dos ecossistemas, potenciando a redução das necessidades de produção e garantindo destino adequado para os alimentos. As diferentes medidas que temos em curso, permitiram-nos evitar mais de 37 milhões de euros de desperdício em 2021.
Um dos compromissos do Continente é antecipar em cinco anos a ambição definida pela União Europeia para 2030, de que todas as embalagens de plástico colocadas no mercado sejam reutilizáveis ou possam ser recicláveis de forma economicamente eficiente. Acreditam que vão cumprir esta meta?
No âmbito da nossa Estratégia para o Uso Responsável dos Plásticos as equipas da MC têm vindo a trabalhar de forma consistente e alargada com os nossos parceiros na procura e desenvolvimento de soluções que assegurem o cumprimento desta ambição. Nos últimos anos, temos vindo a transformar de forma significativa as nossas embalagens, tendo como ponto de partida os princípios do eco design. A eliminação do uso desnecessário de materiais, incorporação de reciclado e concepção da embalagem de forma a assegurar a sua reciclabilidade são dimensões trabalhadas diariamente pelas equipas e que nos permitiram fechar o ano de 2021 com uma taxa de reciclabilidade das nossas embalagens de plástico em 75% e com 12% de incorporação de matéria-prima reciclada.
A título de exemplo, destacaria a alteração que fizemos no packaging da roupa de cama da Kasa, que permitiu eliminar o uso de plástico, à semelhança do que já tínhamos feito com as embalagens das lâmpadas da marca Continente. Na área alimentar, salientaria o papel pioneiro que o Continente teve ao ser a primeira marca portuguesa a fixar as tampas às garrafas de água, assegurando deste modo que as mesmas não são perdidas no sistema e que são recicladas.
De forma a potenciarmos a reciclagem efectiva das nossas embalagens temos vindo a sensibilizar os clientes para a temática, nomeadamente através da iconografia da reciclagem que ilustra de forma simples os procedimentos que deverão ser adoptados pelo consumidor.
Complementarmente, quisemos envolver o consumidor neste percurso que estamos a realizar. Sabemos que este é um tema de enorme importância para o consumidor e estando nós constantemente à procura de novas soluções para melhorar a sustentabilidade do packaging encontrámos no “Fora da Caixa” uma plataforma onde damos voz ao cliente, valorizamos a sua opinião e contribuímos para o desenvolvimento de uma oferta mais sustentável. No primeiro mês, o “Fora da Caixa” recebeu mais de 700 ideias, o que demonstra o entusiasmo dos nossos clientes na proposta de alternativas e vontade de fazer parte da solução.
Continuamos a trabalhar com a indústria no desenvolvimento de soluções inovadoras para as embalagens que ainda não têm uma alternativa viável e com os demais operadores para melhorar os sistemas de triagem e reciclagem. A alteração para um modelo circular implica uma alteração sistémica que só será bem-sucedida com a mobilização de todo o sector.
O que está o Continente online a fazer para minimizar o impacto da utilização de sacos plásticos?
Na zona das frutas e legumes disponibilizamos sacos de rede 100% recicláveis, laváveis e reutilizáveis para o transporte destes artigos. Na zona da padaria, há sacos de pano disponíveis e, em alternativa, o cliente tem a possibilidade de trazer os próprios sacos de casa.
Ainda em 2021, depois de um piloto realizado ao longo de 2020, os clientes passaram a poder levar as suas caixas herméticas para compras nos balcões de atendimento de charcutaria e take-away de todas as lojas, evitando as habituais embalagens descartáveis para transporte de comida pronta.
No Continente Online, com o objectivo de reduzir o impacto do uso de sacos de plástico criámos o ciclo “Devolva e Nós Reciclamos”, em que os sacos devolvidos ao motorista (na entrega seguinte) são garantidamente reencaminhados por nós para a reciclagem e posteriormente incorporados em alguns dos nossos produtos, para além da restituição do valor dos sacos (0,10 euros/saco) ao cliente que tem esse gesto de devolução.
MISSÃO CONTINENTE
Em 2021, a Missão Continente distribuiu cerca de 19 milhões de euros em excedentes a mais de 1400 instituições espalhadas pelo país: 17,4 milhões de euros foram doados a instituições de solidariedade social e 1,7 milhões de euros a associações de apoio e bem-estar animal. Os colaboradores da MC também beneficiam destes produtos que são disponibilizados nas áreas sociais das lojas e entrepostos Continente e que, no ano passado, representaram mais de dois milhões de euros.
O projecto LIFEFood Cycle, lançado em Setembro de 2020 pela MC, em consórcio com a Phenix e apoiado pelo programa LIFE da União Europeia, debruça-se sobre esta temática. A iniciativa permitirá criar uma plataforma digital da MC que permitirá às lojas Continente dar uma nova vida aos seus produtos alimentares em risco de quebra, tanto através de doações solidárias (digitalizando um processo manual já existente há largos anos), mas também através da venda B2B a novos parceiros (ex. restaurantes), que se prevê ocorrer a preços mais baixos.
Este artigo faz parte do Caderno Especial “Ecologia, Eficiência Energética e Energias Renováveis”, publicado na edição de Abril (n.º 193) da Executive Digest.