A proibição do sorriso nas fotografias de passaporte continua a causar surpresa entre viajantes, especialmente porque resulta numa imagem pouco lisonjeadora e, muitas vezes, excessivamente séria. Mas as razões para esta exigência são tecnológicas e de segurança, e enquadram-se num conjunto de normas internacionais aplicadas pela esmagadora maioria dos países, incluindo Portugal. As explicações foram reunidas pelo Huffington Post, que detalha o impacto das tecnologias biométricas nas regras em vigor.
Quando renovou o seu passaporte, a jornalista norte-americana Caroline Bologna recebeu uma instrução clara do funcionário da estação dos correios: nada de sorrisos. O resultado foi, segundo relatou, uma fotografia “sem alegria”, mas totalmente conforme as normas.
Apesar da perceção generalizada de que o sorriso está banido, o Departamento de Estado dos EUA não impõe uma proibição literal. Em vez disso, exige que a fotografia apresente “uma expressão facial neutra, com ambos os olhos abertos e a boca fechada”, com o rosto virado diretamente para a câmara. “Um requerente pode, na verdade, sorrir na fotografia do passaporte, desde que mantenha os olhos abertos e a boca fechada”, explicou um porta-voz ao Huffington Post.
O que significa, na prática, que apenas um leve “smize” (o sorriso com os olhos, à maneira de Tyra Banks) é aceitável. Dentes à mostra estão excluídos. De acordo com a perita em fotografia biométrica Karolina Turowska, da plataforma Passport-Photo.Online, “a principal razão para banir o sorriso é a introdução de software de reconhecimento facial nos aeroportos e outros postos de controlo”.
Algoritmos exigem rostos neutros e proporções inalteradas
Hoje, muitas fronteiras utilizam sistemas automáticos para verificar a correspondência entre o passageiro e a fotografia do passaporte. Enquanto os seres humanos conseguem reconhecer expressões variadas, as máquinas dependem de proporções fixas.
“Os algoritmos não funcionam como nós”, afirmou Turowska. Para comparar um rosto tridimensional com uma fotografia bidimensional, “precisam de medir distâncias entre pupilas, orelhas, nariz, boca, largura dos olhos e outros pontos faciais”. O sorriso altera essas proporções, dificultando a identificação.
A especialista Katy Nastro, porta-voz do serviço de alertas de voos Going, reforça que a regra não é um veto absoluto, mas sim uma limitação: “Isto significa que não se pode sorrir como no primeiro dia de aulas, com os dentes à mostra”. Segundo explica, um sorriso largo dificulta a verificação da cor dos olhos e da forma geral do rosto, especialmente para sistemas biométricos que dependem de pontos faciais fixos.
Regra universal e também seguida por Portugal
A exigência de uma expressão neutra não é exclusiva dos Estados Unidos. “Evitar sorrir nas fotografias do passaporte é uma regra universal na maioria dos países”, afirmou Turowska. As diferenças surgem apenas na forma como cada jurisdição define essa expressão neutra. Em França, por exemplo, é proibido até levantar ligeiramente os cantos da boca.
A explicação é simples: a Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO) estabelece normas globais para documentos de viagem, incluindo requisitos para fotografias de passaporte. O porta-voz do Departamento de Estado recorda que estas regras “estão em vigor há décadas” nos passaportes norte-americanos.
Portugal segue estas mesmas normas internacionais — a ICAO determina os requisitos técnicos que os Estados devem cumprir, e os serviços consulares portugueses adotam precisamente os mesmos critérios: rosto neutro, olhos abertos, boca fechada, ausência de sombras e sem sorrisos que alterem as proporções faciais.
Antes não era assim: fotografias antigas mostram liberdade total
A senhorialidade das fotografias atuais contrasta com os primórdios do passaporte moderno. A editora Madison Blancaflor, do portal The Points Guy, recorda que, no início do século XX, praticamente não existiam regras: “Podemos encontrar exemplos históricos de pessoas a tocar instrumentos ou a usar chapéus extravagantes”. Com o aumento das exigências de segurança, os países foram apertando gradualmente as normas.
Em 2004, com o desenvolvimento acelerado do reconhecimento facial, os Estados Unidos — e outros países — atualizaram as regras para impor expressões neutras. “O rosto sempre foi o padrão para identificação biométrica”, lembrou Nastro, mas a limitação técnica dos computadores tornou a expressão neutra “o padrão de ouro”.
O que acontece se enviar uma fotografia a sorrir
A fotografia é uma das principais causas de atrasos no processamento de passaportes. “Mesmo o melhor dos sorrisos pode ser rejeitado”, disse Nastro. Caso a fotografia não cumpra as regras, a agência de passaportes pedirá uma nova imagem, atrasando todo o processo. Se o requerente não apresentar uma foto válida dentro do prazo, a candidatura pode ficar indefinidamente em suspensão ou ser mesmo rejeitada.
As regras também proíbem óculos — exceto por motivos médicos comprovados — e não permitem chapéus ou coberturas de cabeça que não integrem trajes religiosos usados continuamente em público, exigindo declaração assinada. “Não só o sorriso está proibido: os requerentes não podem apertar os lábios, franzir o sobrolho ou enrugar a testa”, acrescentou Turowska.
A especialista lembra ainda que estas regras são mais flexíveis no caso de crianças pequenas: desde que estejam viradas para a câmara, com os olhos abertos, um leve sorriso pode ser aceite se não afetar a identificação.














