Por Pedro Campos, Executive Director and Head of Management Consulting Devoteam Portugal
Medir o impacto real para lá do hype
A Inteligência Artificial captou a imaginação de líderes empresariais, investidores e da sociedade em geral. Desde afirmações ousadas em conselhos de administração a ambiciosas agendas de transformação, a IA está em todo o lado. Mas, à medida que avançamos para além dos projetos-piloto e protótipos, uma questão permanece no centro de cada discussão séria: conseguimos medir o retorno real do investimento da IA?
Se os últimos anos foram definidos pelo hype, os próximos terão de ser impulsionados pelo valor.
Transição do hype para o valor
A IA já não é uma aposta futurista; é agora uma alavanca central para a eficiência operacional, o envolvimento do cliente e a vantagem competitiva. Mas, com o aumento da adoção, surge um escrutínio mais rigoroso.
Os líderes querem mais do que demonstrações e provas de conceito. Querem resultados reais. E, num ambiente onde os orçamentos são mais apertados e as pressões de desempenho estão a aumentar, o ROI é a nova Estrela Polar.
É aqui que muitas organizações encontram um obstáculo. A IA não é uma ferramenta plug-and-play. Não é magia. Não resolve processos quebrados, dados incorretos ou objetivos pouco claros. A jornada do modelo ao valor é muitas vezes mais longa – e mais difícil – do que o esperado. É por isso que muitas empresas, apesar de grandes investimentos, ainda lutam para provar o impacto no negócio.
A transição do hype para o valor exige clareza, disciplina e alinhamento desde o primeiro dia.
ROI, métricas e equívocos
Para que a IA entregue valor, é preciso saber o que está a medir – e porquê.
Ao contrário dos projetos tradicionais de TI ou automação, o ROI da IA manifesta-se em múltiplas dimensões, criando valor a nível financeiro, operacional e estratégico. Isso pode significar gerar impacto financeiro direto ao aumentar receitas, reduzir custos e melhorar margens; aumentar a eficiência operacional através de processos mais rápidos, menos erros e maior throughput; ou ainda permitir resultados estratégicos como melhores decisões, experiências aprimoradas para o cliente e inovação escalável.
O sucesso nem sempre se traduz num único número no balanço. Por vezes, está incorporado na melhoria de KPIs em várias funções. Mas muitos caem na armadilha de medir as coisas erradas – ou nada.
Para medir verdadeiramente o ROI em IA, é preciso ir além das métricas de vaidade, como modelos em produção ou volume de dados, e concentrar-se naquelas que refletem resultados de negócio reais e impacto mensurável. Estamos a falar, por exemplo, de reduções no tempo de decisão ou no tempo de colocação no mercado; aumento nas taxas de conversão ou retenção; melhorias na precisão de previsão ou deteção; redução do esforço manual ou dos tempos de ciclo de processo; e impacto financeiro por caso de uso ou função de negócio.
Para cada projeto, define-se uma linha de base, estabelecem-se metas e cria-se um plano para monitorizar os resultados ao longo do tempo. Por outras palavras: devemos tratar a IA como um investimento de negócio, não apenas técnico.
Cuidado com falsas expectativas
A IA muitas vezes falha quando as ambições não estão assentes na realidade, levando a armadilhas comuns. Entre elas, incluem-se prazos demasiado curtos para resultados significativos, dados de má qualidade ou inacessíveis, equipas isoladas e sem envolvimento do negócio, gestão da mudança negligenciada e uma governança fraca ou inexistente.
Isto cria um ciclo de desilusão: entusiasmo → frustração → estagnação. Não porque a tecnologia não funcione – mas porque a abordagem estava errada.
O pragmatismo vence a utopia. A IA exige maturidade, não magia.
Da ideia ao impacto: tornar o ROI mensurável desde o primeiro dia
Como podem as organizações garantir que a IA entrega resultados – não apenas headlines?
Começa com a fundamentação certa: um objetivo de negócio claro (que problema estamos a resolver?), uma hipótese de valor (como será o sucesso e como o mediremos?), uma responsabilidade bem definida (quem é responsável pelos resultados, não apenas pela implementação?), o alinhamento de processos (o que mudará na forma como as pessoas trabalham?), uma estratégia de dados adequada (temos os dados para alimentar o modelo e sustentar a sua relevância?) e, por fim, uma estrutura de governança e feedback (como monitorizaremos, atualizaremos e melhoraremos ao longo do tempo?).
Nenhum modelo de IA, por mais avançado que seja, terá sucesso sem estes fundamentos. E as organizações que adotam a IA com uma mentalidade de negócio – não apenas técnica – já estão a ver resultados.
O ROI da IA é real – quando bem feito
A IA não é uma fantasia. Mas também não é um atalho.
O seu poder reside no potencial de desbloquear novas formas de trabalhar, decidir e entregar valor. Mas apenas quando combinada com clareza de negócio, disciplina de execução e expectativas realistas. A questão já não é se a IA pode criar impacto. A questão é se a organização está pronta para o medir, gerir e escalar.
A IA pode transformar negócios – mas só para quem a encarar com seriedade, medir o que importa e agir com disciplina. Do buzz ao business case – é aí que reside a verdadeira oportunidade. E a diferença entre falar sobre o futuro e, realmente, construí-lo.




